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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

DÚVIDAS DO PORTUGUÊS: Gramática x Redação (2) (jlo)

Continuando...
Lucília Garcez, segundo Lilian, demonstra, em sua obra, que também possuo, Técnica de redação, como fica melhor a redação do aluno do ensino médio cujo(a) professor(a) trabalha interativamente os vários níveis da produção textual. Aqui, introduzo nosso primeiro comercial: Em junho, a Ed. Vozes lançará uma obra organizada por nós, e em coautoria com Geraldo Campetti Sobrinho e Manoel Craveiro, intitulada Guia prático de leitura e escrita, com o objetivo de explorar literária e ludicamente as diversas possibilidades de produção escrita voltada para a identificação e a elaboração de tipos e gêneros textuais.
Então, surge a pergunta: a gramática ficará out? De jeito nenhum, pois ela “contribui com a formação intelectual de qualquer pessoa”. Mas o aprofundamento de seu conhecimento deve ter objetivos bem delineados: a) preparação de professores (não só de português, mas de todas as áreas do conhecimento, seja nas Ciências humanas, seja nas exatas); b) o nível do ensino (não ensinar no fundamental o que só tem cabimento no médio, e assim por diante); c) os cursos de Letras e de Tradução; e d) os cursos preparatórios para concursos. Aqui entra a observação de Lilian: “Se bem que as provas de português mais avançadas estão centradas na compreensão e interpretação de textos de tipologia diversa, e menos em questões gramaticais.”.
Em seguida, informa-nos Zamboni que Perini escreveu o artigo Sofrendo a gramática, no qual afirma que a gramática normativa é “a matéria que ninguém aprende”, pois conta com “três defeitos: objetivos mal colocados, metodologia inadequada e falta de organização lógica”. Pensando também assim, sempre priorizamos, em nossas aulas, o ensino voltado para a leitura, a compreensão, a pesquisa e a produção textual.
Precisamos deixar claro, entretanto, que mesmo os críticos do gramaticalismo escolar concordamos com a ideia de ser a gramática fundamental na formação da cultura dos estudantes e fator de “identidade nacional”. A não ser assim, cada um sentir-se-ia no direito de criar suas próprias regras e ditar seus próprios interesses linguísticos, como o daquele nosso ex-aluno do curso de História que, em plena aula de Português, com a abordagem em textos sobre as regras de acentuação, disse-nos em alto e bom tom: “Professor, eu não acentuo minhas palavras, porque sou contra as regras de acentuação gráfica”.
Num caso assim, ler, ler, ler para escrever, escrever, escrever só surtiria efeito se o leitor percebesse que, mesmo sem a obrigação de concordar com o conteúdo dos autores dos textos lidos, a anuência com os aspectos formais da língua necessita ser absoluta, exceto quando se quer enfatizar a linguagem popular, porém sob o olhar atento da norma padrão (Desculpem-me os linguistas, mas a nosso ver não há padrão na norma popular.).
A não ser, por exemplo, que se seja um gênio da filologia e se pretenda propor à Academia Brasileira de Letras a extinção total dos acentos gráficos das palavras, a manifestação daquele aluno é totalmente intempestiva. Se se concordasse com seu procedimento e opinião, nossa pronúncia e escrita teriam de ficar iguaizinhas às do padrão do idioma inglês. Caso fossem aceitos tais argumentos, nossa cultura teria ido para o espaço e já não haveria mais a língua portuguesa.
E concluindo...
Incluí a pesquisa como produtora de bons escritores, em virtude da grande deficiência do aluno, em especial dos cursos de graduação e pós-graduação, quando lhe é exigido produzir um simples resumo técnico ou artigo, uma resenha, monografia, dissertação ou tese. Nesse caso, é importante consultar obras atualizadas voltadas para a pesquisa, como a nossa, intitulada Texto acadêmico, cuja oitava edição, atualizadíssima, está sendo editada, agora em março, pela Editora Vozes (último comercial).

REFERÊNCIAS

GARCEZ, Lucília Helena do Carmo. Técnica de redação: o que é preciso saber para bem escrever. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
OLIVEIRA, Jorge Leite de. Org. Guia prático de leitura e escrita. Petrópolis: Vozes. No prelo, ed. e lançamento em jun. 2012.
______. Texto acadêmico: técnicas de redação e de pesquisa científica. 8. ed. atualizada. Petrópolis: Vozes, 2012.
PERINI, Mário A. Para uma nova gramática do português 4. ed. São Paulo: Ática, 1989. Série Princípios.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas, SP: Mercado de Letras : Associação de Leitura do Brasil, 1996 (Coleção Leituras no Brasil).
ZAMBONI, Lilian Márcia Simões. Por que (não) ensinar gramática na escola. Correio Braziliense, Cad. Opinião, p. 11, Brasília, 27 fev. 2012.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

DÚVIDAS DO PORTUGUÊS

Para quem acha que decorar gramática é saber Português, leia isto:
Li hoje no "Correio Braziliense", da profª LILIAN MÁRCIA SIMÕES ZAMBONI, um texto muito bom, que representa não somente o meu, mas o pensamento de todos os bons professores da Língua Portuguesa. O título do artigo é "Por que (não) ensinar gramática na escola", que reproduz o mesmo título da obra do prof. Sírio Possenti, publicado pelo Mercado de Letras : Associação de Leitura do Brasil. Minha edição é a de 2002 e concordo plenamente com os autores.
Vamos aos tópicos principais do trabalho de Zamboni acrescidos de nossa análise:
Primeira ideia: não é necessário ensinar toda a parafernália de regras da gramática normativa na escola. A função da Língua Portuguesa é ensinar os alunos a lerem e escreverem bem. E aí surge um primeiro questionamento: ensinar gramática vai levar a isso? A resposta, em nosso entendimento e no de linguistas como Mário Perini, Possenti e outros é NÃO.
Segunda ideia: grandes escritores, como Machado de Assis, declararam sua ignorância sobre o conteúdo gramaticalista (em especial a terminologia sintática), além disso, professores de Português reclamam que seus alunos até decoram bem a gramática sem saberem escrever uma simples redação de poucas linhas. Por isso, afirma Possenti que "uma coisa é o estudo da gramática, outra é o domínio ativo da língua" conforme repete a autora do citado artigo.
Agora, para finalizar, gostaria de fazer minhas as palavras da profª Lilian:
"Para ter o domínio ativo de uma língua é preciso escrever, escrever, escrever. Após obter algum feedback, reescrever, reescrever, reescrever. A gente aprende a escrever escrevendo, reescrevendo, tornando a escrever, usando todos os recursos que a língua nos põe à disposição. E ler, ler, ler, até morrer. É preciso dominar um repoertório de recursos comunicativos e expressivos para saber escrever de muitos modos. Ler textos de todos os tipos para não embasbacar diante de nenhum. Assim se aprende a norma padrão. Ela está ali presente nos textos que o aluno lê e vai estar também nos que ele passará a escrever. Claro que o professor é sempre um guia seguro para ajudar o aluno a ultrapassar as dificuldades da escrita e da leitura."
Vou parar por aqui, por agora, depois continuo, pois o assunto requer mais esclarecimentos.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

LEMBRANÇA DE MENINO (jlo, 25/2/2012)

Ainda ontem, à noite, enquanto estive deitado, tentei lembrar-me de uma história de um menino que morava em uma pequena casa de tijolos, construída às pressas quando seu pai morreu, deixando viúva de 40 anos com sete filhos, todos menores. O terreno tinha uns 70m² e, antes da casa, havia ali um barraco de madeira de uns 30m² que abrigava um “velho” de pouco mais de 50 anos, muito doente, cuja esposa acabara de ter gêmeos que, somados aos demais filhos, compunham uma prole de sete crianças. Três anos depois, o “velho” morreu e alguns parentes piedosos resolveram construir a pequena casa em volta do barraco, antes que este caísse sobre a família, vez que sua inclinação era bem maior do que a da Torre de Pizza e, quando chovia, o barraquinho ia para um lado e para o outro. Nestes dias, o menino lembrou-se do trabalho do pai da Jaíra e dela, esposa do patrão de seu falecido pai, o bondoso Samuel, que empregaria, em sua loja de material elétrico, o garoto e cada um de seus irmãos, assim que completassem 13, 14 anos. A Jaíra conseguira iluminar o barraco, antes clareado à luz de velas e lampião; seu pai construíra as quatro valas do esteio onde se assentariam os tijolos da casinha; o sobrinho Paulo, filho do tio Nélson, com outras almas caridosas e do próprio Sr. Moacir, pai da Jaíra, levantaram as paredes, o teto, as janelas e as portas da singela casinha do guri. O menino, agora em seu lar de 50 m², tinha 11 anos e dormia numa bicama com seu irmão mais velho, de 13, no quarto da frente, que dava para um quintal cercado por uma cerca rústica de madeira. Era a última casa do morro; à sua direita, outra casa, outro menino que morreu há pouco tempo, aos 57 ou 58 anos “Zé Merita”, gente muito boa, bom de bola. Outras casas, outros meninos que jogavam bola no campinho antes da ladeira que levava à Escola Nossa Senhora da Penha e à igreja do mesmo nome. Da casa do menino, por vezes, a qualquer hora do dia, ouviam-se gritos; outras vezes tiros, assaltos eram comuns ali; porém quem aparecia baleado, de vez em quando, era o ladrão. As drogas eram escassas; quando muito, havia um cheiro de maconha vindo de árvores próximas, exalada por ladrões de galinha conhecidos de todos. O fumacê entrava pela porta e janela da sala e “perfumava” toda a casa e as das proximidades. Mas... onde dormiriam seus demais irmãos, a mãe, a irmã mais velha em casa tão pequenina, tão singela? O banheirinho ficava no quintalzinho dos fundos, onde foi construída, do lado oposto, uma caixa d'água que recebia água vinda da rua uma vez por semana, depois que alguém entendido em ligações clandestinas se compadeceu daquela viúva e seus sete filhos pequenos, salvo a mais velha, única menina, que à época tinha 15 anos. Antes do "gato", muitas vezes debaixo de chuva, a viúva e seus filhos maiores (9, 10, 11 anos) tinham que carregar água em latas de 18 litros, na cabeça ou nas costas, uma de cada lado da balança. O irmão de 13 e a irmã de 15 iam trabalhar para ganhar um dinheirinho e ajudar na complementação da renda familiar de meio salário mínimo à época. Mas... onde dormiam naquela casa? Pensava o menino... Onde dormiam também a tia Marieta, o padrinho do irmão mais velho, o amigo mineiro que passou alguns anos morando ali? O tio Zezé, garçom de um bar, sempre chegava à noite e procurava um velho colchão que estendia na porta da sala, sempre trancada com trava de madeira, para evitar que ladrões tentassem entrar por ela, e ali dormia. Mas... e aqui fica o apelo aos irmãos do menino: descrevam para ele o que acontecia naquele barraco, até que, aos vinte anos, o então rapaz, mudou-se dali e, pouco tempo depois, viajou para Salvador para só voltar ao Rio nas férias anuais. Como se dividia a casa, em que quarto dormiam a mãe do menino e seus demais irmãos, a irmã, o “mineiro”, a tia? E como abrigava ali tanta gente? O menino quer lembrar, pois nunca mais voltou a sua antiga casa, tão saudosa, tão acolhedora, tão fraterna! Quem puder, ajude-o. Sugiro aos irmãos do menino que, nos comentários abaixo, façam a descrição o mais fiel possível da casa em que moraram com ele.
Abraços,
O menino.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Curiosidades do Português

A partir de hoje, 25 fev. 2012, haverá em meu blog um espaço para as "Curiosdades do Português" e outro para as "Dúvidas do Português". Amenidades puras, mas muito lúdicas, mormente nas "curiosidades", como a seguinte, para você ler:
“35T3 P3QU3N0 T3XT0 53RV3 4P3N45 P4R4 M05TR4R C0M0 N0554 C4B3Ç4 C0NS3GU3 F4Z3R C01545 1MPR35510N4ANT35! R3P4R3 N155O! N0 C0M3Ç0 35T4V4 M310 C0MPL1C4D0, M45 N3ST4 L1NH4 SU4 M3NT3 V41 D3C1FR4NDO 0 C0D1GO QU453 4UT0M4T1C4M3NT3, S3M PR3C1S4R P3N54R MU1T0, C3RT0? P0D3 F1C4R B3M 0RGULH050 D1550! SU4 C4P4C1D4D3 M3R3C3 P4R4B3NS!” Disponível em: http://www.letrasenumeroscoop.com.br/curiosidade. Acesso em 17 out. 2011.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Eu quero, Jesus (jlo)

Eu quero, Jesus,
servir-te infatigavelmente
na seara do bem
aqui e alhures
sem jamais pretender de ninguém
reconhecimento algum
ou qualquer pagamento...

Que em teu nome, Senhor,
eu possa servir
na seara do amor
anonimamente
recebendo por paga tão somente
a ventura de ser contado
entre os que aspiram estar contigo
no trabalho do bem, lado a lado.

Eu quero, Jesus
passar no mundo humilde, apagado,
mas acender a luz
da verdade imortal
do teu verbo sublime
sem jamais reclamar
seja na vida física
ou na vida espiritual.

Que eu faça da renúncia e devoção
os paradigmas da compreensão
e que ame também como amaste
e que viva como tu viveste
com os pés sobre a Terra
e a cabeça no céu

Eu quero, Jesus
aprender sempre mais,
mas também compreender que sem amor
a ciência do homem é teoria falaz
e que as sábias Leis Divinas
não aceitam falazes doutrinas.

Eu quero, Jesus
carregar, sem lamentos,
o peso da própria cruz,
embora pisando espinhos
vergastado por tormentos
de incompreensão, crueldade,
em busca da Verdade.


Jesus, Mestre querido que nos amas
e estás sempre atento ao nosso lado
como Pastor Divino e dedicado,
que ao ver sua ovelha caída
tristemente estirada no solo
torna a erguê-la com carinho
e a carrega no colo.

Eu quero, Jesus,
ser mais que essa ovelha perdida,
quero aprender contigo a carregá-la
quero ser mais contigo e transportá-la
ao teu redil de paz e de harmonia.

Eu quero, Jesus querido,
quero servir ao bem, dia após dia,
quero ajudar-te contra o ateísmo,
quero pregar contigo o Espiritismo
quero estar ao teu lado, meu Senhor,
caminho, verdade e vida,
sublime Amor.

23 jun. 2011.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

O não assalto (jlo)

Touchê é daqueles homens que, ainda na idade madura, continuam mantendo um espírito otimista, alegre e jovem. De tudo gosta um pouco. Aprecia esportes, em especial o futebol, e, se em seus 55 anos encontrasse outros nove apreciadores de uma boa pelada, como ele, sem dúvida os convidaria para jogar futebol de salão, ao menos uma vez por semana. Isso porque duas ou três vezes, semanalmente, adora correr no parque da cidade, cujo percurso de 10 km realiza em menos de uma hora. Desse modo, pensava, “Eu gostaria de trocar um dos dias de corrida por um bom futebol de salão. Infelizmente, para ele, a maioria dos homens com mais de 50 anos não quer praticar esportes.
O horário de suas corridas, em geral, é no final da tarde, mas nesse entardecer teve de ir ao Jardim Primavera pegar seu netinho de cinco anos e, quando iniciou o exercício, já anoitecera. O problema é que, com a mudança de governo, na Capital do Brasil, a ronda noturna que vinha sendo feita pelo carro da segurança do parque passou a não mais ocorrer. Com isso, os desocupados e marginais deram início a uma série de delitos, ali, como roubos de carros, assaltos e até estupros, sem qualquer providência da Secretaria de Segurança do Distrito Federal.
Nessa noitinha, nosso atleta já havia corrido sete quilômetros, quando passou por um trecho da estrada bastante escuro, em virtude de os postes de iluminação estarem apagados, no espaço correspondente a meio quilômetro da pista de atletismo. Repentinamente, da lateral esquerda da pista, eis que saíram três jovens de não mais de trinta anos cada, no momento em que Touchê cruzava por eles, correndo. Embora os tivesse notado, o corredor não se preocupou, pois avistou, mais à frente, novo grupo de cinco ou seis homens, vindo em direção contrária. O fato não passou despercebido dos rapazes, que, desejosos de assaltarem o corredor, combinaram caminhar rapidamente, até que se distanciassem do outro grupo, quando partiriam no encalço de Touchê para o cercarem e imobilizarem.
Entretanto, assim que ultrapassaram o novo grupo, os assaltantes perceberam que a diferença antes de vinte metros que os separavam do ágil corredor agora já ultrapassava os cem. Foi quando um deles comentou com os demais: “Caramba véi, como aquele coroa corre. É melhor nem tentarmos ir atrás dele.
E assim, sem que Touchê soubesse, nesse dia, escapou de um assalto, numa noite de quarto minguante, em Brasília. Até hoje ele não sabe o que aconteceu, pois o que seria um assalto tornou-se um não assalto.
Brasília, 29 de abril de 2011.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Dor da saudade - Jorge Leite (jlo)

Ah! esta dor que me invade
Que procura me extinguir
Estruge-se em mim ardente
Sem nunca me consumir

Esta dor de uma procura
De algo que não sei dizer
Quase me leva à loucura
Sem, porém, loucura ser

É a dor do meu desencanto
Que não se extingue falando
E nem se expressa num canto

É sofrimento da gente
Que vai nos aniquilando
Saudades que a gente sente!

Este soneto foi escrito por nós na idade de 22 anos, quando, por necessidade do serviço, fomos transferido para Salvador, onde passamos um ano e meio a serviço da Pátria e longe da família.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Nada me afasta de Cristo (jlo)

Alguns ramos da Ciência
não somente negam Deus,
como a própria consciência,
como a existência dos "eus".

No seu fundamentalismo,
vão pregando o não ser
com o mesmo fanatismo
de algumas formas de crer.

Desse modo, a teoria
faz tudo para tirar
a certeza milenar
da antiga Filosofia.

Hoje, não há mais tu e eu,
pois a nossa consciência,
para a alegria do ateu,
faz tempo que já morreu

Atente, porém, pra isto:
ante a mutação constante
da Ciência inconstante,
nada me afasta de Cristo!

O inolvidável desalento (conto sobre um imbecil) - jlo

Brasília, 14 dez. 2011.

- Vai-te, dizia-lhe ela, desaparece de vez de meu perfil. És um escarmento em minha vida.
- Perdoa-me, amor, minha ofensa a tua alma nobre foi motivada por um lapso lamentável. Uma tibieza inescusável, uma timorata atitude de minha parte para com teu inefável ser. Contudo, amo-te com todas as forças de minha alma. Dá-me, porém, nova chance de demonstrar-te a imensidão de meu afeto. Por ti, serei capaz de mover as nebulosas!
- Não posso perdoar-te, infame! Sabias muito bem que chovia muito naquela tarde e tinhas a obrigação de evitar que a tempestade desabasse sobre mim. Por que não abriste teu guarda-chuva imediatamente, ao saíres do carro, para abrigar-me da intempérie? Por que me deixaste molhar as belas roupas tão meticulosamente escolhidas por minha solícita mãe, com o fito de eu comparecer ao baile de formatura de meu irmão? E pensar que te escolhi como parceiro por te considerar um nobre cavalheiro...
- Querida, jamais olvidarei os maviosos momentos desfrutados a teu lado. Aqueles segundos de tormenta foram um lapso de minha parte, porém asseguro-te: jamais tal descuido repetir-se-á.
- Não penses mais em ver-me, asqueroso verme. Adeus!
- Oh! Minha deusa, meu querubim, minha vida. O universo é pequeno para conter a eloqüência do meu afeto por ti. Trago-te flores, restos arrancados deste amor que nos viu passar unidos e pela eternidade há de estreitar em teu seio o meu afeto incondicional. (Em pensamento: Perdoa-me, Machado de Assis, pela profanação de teu verbo luminescente!)
- O que pensas fazer para reparares tua crassa falta?
- Já fiz, amada minha, já adentrei a farmácia e adquiri duas caixas do mais potente antigripal para curar-te do cruel resfriado causado por minha displicência, quando, estacionado na garagem de teu majestoso lar, não observei que, ainda assim, poderias gripar.
- É verdade, embora a chuva estivesse fora, só de pensar na tempestade molhei-me toda e, consequentemente, resfriei-me e alcancei 40º de hipetermia que me prostrou no leito durante sete dias. Curei-me contudo, com os medicamentos enviados por um anônimo fidalgo, a quem muito agradeci. Eras tu?
- Sim, ternura de minha vida, era eu, o anônimo benfeitor de teu restabelecimento.
- Ainda assim, não resgataste completamente tu deslize moral para comigo. Perdoar-te-ei, todavia, se prometeres atender aos meus mais secretos anseios, aos meus mais esconsos devaneios.
- Oh, amada, tudo o que sonhares será para mim uma ordem. Ser-te-ei o mais submisso dos vassalos. Ordena-me e servir-te-ei incontinenti.
- Muito bem, oscula-me a mão e vai-te para tua casa. Só saia dali quando receberes minhas ordens. Adeus!
Ofereceu-lhe, então, a mão esquerda enluvada, que ele beijou com sofreguidão. Em seguida, retrucou-lhe com extrema subserviência:
- Submeto-me às tuas ordens, ó minha deusa. Adeus!
Tal evento ocorreu há cinquenta anos Nunca mais se viram, e Alcebíades jamais saiu de sua casa, desde então, na rua das Laranjeiras, Catete, Rio de Janeiro.
Dizem que, aos setenta anos, diariamente clama, enlanguescido, por Maria Concebida. Acorda, pede ao mordomo que lhe prepare um banho de sais aromáticos, ordena ao criado que faça as compras, manda a velha cozinheira preparar um banquete, veste-se com as melhores roupas e espera, espera sempre por aquela que nunca o amou. No entanto, ele ainda guarda os traços da beleza, desde jovem e, com a fortuna herdada de seus pais, poderia ter quase todas as mulheres e aventura que quisesse. É ou não é um idiota esse Alcebíades?
E ela, perguntará a leitora inteligente, o que fez de sua vida? Mudou-se de residência e domicilio, casou-se com um advogado famoso, teve dois casais de filhos e nunca mais quis saber do ex-colega de faculdade, cujo único encontro fora o que resultara em seu resfriado e tivera como única demonstração de afeto um ósculo em sua mão esquerda.
Mora com o marido, atualmente senador, numa mansão do Lago Norte, em Brasília, e é dona de uma organização não governamental renomada, que administra com rara eficiência, graças aos conhecimentos adquiridos no curso de Administração de Empresas concluído no Rio de Janeiro.
Outro dia, perguntei-lhe se ainda se recordava de Alcebíades. A resposta foi esta:
- Quem é esse? Nunca ouvi nome tão esdrúxulo! Com tal nome, só pode ser um imbecil.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Factoide (j.l.o)

Soube que seu amigo de infância ficaria mais velho no domingo e lembrou-se de que dois meses antes fora ele quem completara trinta anos. Alguns dias antes de seu aniversário, convidara o amigo para comemorarem a data festiva e agora lembrava-se do que aquele fizera. E ria sozinho pensando como retribuir a gentileza de Oto, que comparecera a sua casa acompanhado de uma linda cadelinha Basset de dois meses e, sabedor de sua afeição aos cães, ofertara-lhe o animal.
Agora com quatro meses, Lolita, nome que dera à cadela, aprontara todas, mas José, tal era seu nome, quanto mais o tempo passava, mais se apaixonava pelo animal. Não sabia como retribuir o agrado ao amigo e dava tratos à bola para levar-lhe algo que marcasse sua amizade de modo ímpar.
De repente, lembrou-se de que Oto lhe dera a cadelinha porque esse amigo tinha preferência por animais, em especial, por gatos, já tendo dois em sua casa. Não pensou duas vezes, no sábado, foi a uma loja de animais, próxima a sua residência, e adquiriu uma linda gatinha siamesa, de três meses, com a intenção de oferecê-la ao aniversariante. Ao chegar a casa com o bichano, porém, percebeu que Lolita e a gatinha rapidamente fizeram amizade. Aonde uma ia a outra ia atrás. E a festa parecia não ter fim entre os novos amigos, que rompiam com a rivalidade entre cães e gatos.
Ficou tão encantado, ao final do dia, com a afinidade dos animais que, no dia seguinte, resolveu desistir de dar a gatinha ao amigo Oto. Mas então, o que faria? Como era manhã de domingo, a loja de animais estava fechada, portanto, não tinha como comprar outro gatinho para o amigo. Pensou... pensou... pensou, até que encontrou uma solução. Faria uma surpresa inesquecível a Oto, mais tarde, às 18h, horário combinado para o início da festa, com promessa de churrasco.
Chegou o momento do encontro entre os amigos. A casa cheia, alegria contagiante, um cheiro gostoso de carne assada na brasa, quando José chegou, abraçou o amigo e entregou-lhe um pacote macio e volumoso, embrulhado com jornais. Junto ao volume, um cartão dizia: “Como sei que a carne do churrasco está pouca, mandei matar Lolita e vamos comer carne de cachorro nesta data memorável. Parabéns pelo seu aniversário”.
Oto ficou tão perplexo com o presente que cambaleou, tonto, imaginando que seu amigo ficara louco. Ainda assim, abriu o pacote, mas, para sua surpresa, ali nada mais encontrou que um lindo gatinho artificial de pelúcia, que, ao ser apertado, dizia: “Miau, eu sou mimi. De hoje em diante, pertenço a ti”.
O acontecimento, durante muito tempo, foi muito comentado naquele lugar. E toda vez que alguém desejava iniciar uma conversa sem ter assunto, lembrava o fato. Algumas pessoas, observando a futilidade do tema, passaram a criticá-lo e diziam, pejorativamente, que aquele não era um fato e sim um factóide, ou seja, apenas uma forma de chamar a atenção geral. O certo, porém, é que, a partir daquele dia, toda vez que alguém desejava “aparecer”, ao oferecer um presente de aniversário, de casamento ou de outro acontecimento social qualquer, comprava algo inusitado, como, por exemplo, uma galinha, um quilo de carne e presenteava alguém.
Essa foi a origem do termo factóide. “Esta história, entrou por uma porta e saiu pela outra; quem souber, que conte outra”.
Brasília, 14 de fevereiro de 2012.

vento vão (jlo)

o vento venta velozmente em vão
ao som do espaço do universo vasto
seduz os sóis de vã constelação
por onde passa vai deixando rastros

e vai quebrando vasos de alabastro
e vai zunindo forte em cada chão
e vai formando pó nos céus do astros
mas se dissolve nessa formação.
bsb, 14 jan. 212. jlo

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O corpo (conto de Jorge Leite de Oliveira)

José Firmino nasceu na cidade de Cantagalo, no Rio de Janeiro, bairro de Jaçanã. Em criança, filho único, sua mãe fazia tudo para não contrariá-lo. Dizia ela, adepta que era da psicologia moderna, que os pais não devem interferir, a não ser para protegê-los, nos atos de seus filhos inocentes, para não lhes provocar traumas psíquicos no futuro. Perguntado, um dia, sobre o que gostaria de ser quando crescesse, o menino não teve dúvida e respondeu: “Quero ser motorista de avião. E avuar com Luizinha.”
Assim cresceu Zezinho, como sempre fora tratado por todos os conhecidos. Morava em bela casa de seis quartos, suíte em todos eles, com quintal de 1.500 m², onde foram construídos um belo jardim, piscina e quadra de futebol soçaite. Pela manhã, ia ao colégio, a duas esquinas da sua rua. Na grande área de sua casa, desde pequeno, costumava reunir seus coleguinhas de escola, com os quais passava as tardes brincando. Ora jogavam bola, ora iam para a piscina, muitas vezes nus, sob as vistas complacentes da mãe, professora universitária que pouco ficava em casa nesse horário. Esse era o tempo das algazarras infantis e inocentes do filho com seus amiguinhos e amiguinhas.
As tendências afetivas, as atitudes da maioria desses jovens pouco incomodavam a seus pais, no que se assemelhavam à professora Ana Patrícia, mãe de Firmino que, entretanto, junto com o esposo, José Raimundo, frequentavam regularmente a igreja do bairro, a cinco esquinas da rua de seu lar.
Certo dia, o marido lhe disse, carinhosamente, como era de seu hábito tratá-la: “Patricinha, nosso filho já está com seis anos, você não acha melhor levá-lo para assistir às aulas de catequese infantil da igreja?”
“Acho que não, ele ainda é muito novinho e fez uma birra danada outro dia, quando lhe disse para ir conosco à missa. Falou que prefere brincar com a Luizinha, o Armandinho, a Claudinha e o Tiaguinho na piscina. Então, não quero impor nossa religião a nosso filho querido. Deixa ele decidir quando crescer.”
“Mas e se ele resolver não ter religião alguma?” Perguntou o marido, um tanto preocupado. “Isso não será ruim para ele? E, o que é pior, se ele resolver adotar outra crença e não a nossa, que tanto conforto espiritual, tanta paz, tanta harmonia nos traz?”
“Lá vem você com sua mania de impor suas ideias e crenças. Nossa religião, nossos gostos, nossas opiniões não devem ser impostos ao nosso filho. Ele que decida sobre o que mais lhe agrada, quando puder discernir. Não vamos tolher sua liberdade de escolha, impondo-nos a ele, desde pequeno, tão frágil e inocente. Ao crescer, ele saberá escolher o que é melhor para si.”
O marido calou-se, e a mulher ainda aduziu: “Comprei um pequeno computador e mandei instalá-lo no quarto ao lado do de Zezinho, que reservei para seus entretenimentos, afinal, ainda nos sobram dois quartos para hóspedes em nosso lar, uma vez que o outro já é nosso escritório e só eu fico lá até tarde da noite, elaborando aulas, preparando e corrigindo provas de alunos.
“Está bom”, disse o marido, que não gostava de contrariá-la. “Mas é importante instalar uma senha e bloquear mensagens e sites impróprios para crianças no computador do Zezinho.”
“Não vou fazer nada disso”, respondeu, mal-humorada. “Meu filho é um anjinho e quero sua felicidade, mas se ficar controlando sua vida, repito, ele vai crescer cheio de medos, de complexos, em tudo vai enxergar o pecado. Nosso anjo precisa ser livre, para poder voar como as andorinhas, nos céus de Cantagalo, junto com seus amiguinhos.”
Mais uma vez, o pai de José Firmino preferiu calar-se a contrariar Patricinha, mulher belíssima, de trinta anos de idade, olhos azuis, cabelos negros e compridos, seios grandes, mas sem exageros, corpo de 1,60 m, tez clara e personalidade forte.
O marido tinha 1,85 m, olhos negros, como a cor de sua pele, era calvo, esbelto, pesava 80 quilos e, à época, tinha quarenta anos.
O tempo passou, o menino e seus amigos cresceram e chegaram à puberdade. Certo dia, Zezinho, que nunca ia à igreja e já se dizia ateu, chegou a casa, sem camisa, com a tatuagem de um dragão no peito sem pelos. A mãe, ao vê-lo assim, assustou-se, mas controlando-se, emocionalmente, perguntou-lhe:
“Filho, que ideia é essa de pintar seu corpo desse jeito?”
E ele respondeu-lhe às gargalhadas: “Não é pintura, não, velha. Não vê que isso é uma tatuagem?”
“Meu filho, em primeiro lugar, não sou nenhuma ‘velha’, pois só tenho 37 anos; depois, acho que nosso corpo não é tela de quadro para expor dragão e ouros bichos... Você não acha que tenho razão?” Disse-lhe cheia de esperança em que o filho concordasse com ela.
“Não acho nada.” Respondeu-lhe o adolescente. “Mas já que você não gosta de animais, vou tatuar meu corpo com os rostos de minhas amigas e meus amigos, pois você sabe que amo todos eles. Por isso, quero homenageá-los, velhinha querida.”
“Já lhe disse que não sou nenhuma velha...”
“Desculpe-me, mãezinha, ter voltado a chamar-lhe de velha; você é a mais linda flor do nosso jardim.”
Foi o bastante para a mãe derreter-se toda em beijos e carícias e esquecer a má impressão causada pela tatuagem. Afinal, o filhão já estava com treze anos e (por que não dizer?) a tatuagem parecia-lhe, agora, verdadeira obra de arte, mandada fazer com o dinheiro da mesada paterna, que, mensalmente, depositava, na conta bancária do filho, mil reais.
O pai era engenheiro, trabalhava para o Governo do Estado e ganhava bem. Quando chegou do trabalho e viu o filho tatuado, não fez qualquer comentário. À noite, sentiu uma forte dor no peito. A mulher, preocupada, ligou para uma amiga cardiologista, que lhe pediu para levá-lo imediatamente à emergência do hospital onde dava plantão. Angustiada, Patricinha auxiliou o marido a vestir-se e, em alta velocidade, chegou ao hospital. Entretanto, quando os padioleiros da emergência foram pegá-lo, para desespero da esposa, seu marido acabava de dar o último suspiro em vida.
Foi um grande choque familiar, mas a pensão deixada pelo de cujus e o patrimônio do casal, somados ao seu razoável salário de professora de inglês na Faculdade, permitiram à mãe e filho continuarem desfrutando de uma vida sem sobressaltos financeiros.
Com o tempo, as extravagâncias do filho foram aumentando. Passava horas na internet, principalmente à noite, quando ia dormir às quatro ou cinco horas da madrugada e, nos finais de semana, ia com os amigos às baladas, onde consumia grande quantidade de bebidas alcoólicas, agora na idade de dezesseis anos, burlando os vigilantes das boates, principalmente por ser alto como o pai e aparentar ter maioridade. Não raras vezes, era levado embriagado e passando mal para sua residência.
A mãe tudo relevava, pois seu Zezinho estava ficando homem e precisava aprender muitas coisas do universo masculino. Havia noites em que o rapaz dormia com algumas de suas amigas; outras, madrugava com seus amigos. Gritos de prazer, em ambas as ocasiões, madrugada afora, eram ouvidos. Desculpava-se, no dia seguinte, dizendo à mãe que estiveram jogando, pela internet, durante toda a noite.
Chegou aos dezoito anos. As tatuagens, para desgosto materno, agora tomavam quase todo o corpo do rapaz, que as considerava obras de arte. Um dia, chegou a casa com um amigo e a namorada deste, os quais apresentavam dois enormes piercings, um no nariz, outro na língua de cada um deles. Disse, então, a sua mãe, que também desejava usar seu corpo como escultura da verdadeira obra de arte, pois, até então, a tatuagem era uma arte menor.
A mãe tentou argumentar: “Filho, você já está com o corpo tomado de tatuagens. Não acha que já chega? Pare um pouco e pense. Suas notas da escola estão muito baixas, você já reprovou no ano passado e, pelo que estou vendo, vai reprovar de novo este ano.”
“O que é isso, velha? Meta-se com sua vida. Pensa que não sei que está de caso com um professor casado de sua escola? Vai tomar #* @. E quer saber? Não vou mais estudar. A partir de hoje, vou entrar para o grupo de escultura do corpo como obra de arte.”
A mãe, horrorizada, com o tratamento brutal do filho, humilhada por se ver descoberta em seu segredo íntimo, calou-se e nunca mais teve coragem de lhe fazer qualquer reprimenda. Naquele mesmo dia, Zezinho saiu com seus amigos adeptos do piercing e voltou com duas grandes fendas nas orelhas. Passado um mês, chegou com uma imensa argola pendurada no nariz e com a língua partida em duas metades. Mais um mês e sua testa ostentava três enormes caroços em forma de chifres.
A mãe já não olhava para o filho. Deixara de frequentar a igreja, com a morte do marido, única razão do antigo hábito, mas agora, ansiosa de uma explicação para seu fracasso materno, voltara a assistir às missas e encontros catequéticos todos os fins de semana, além de encontrar outro namorado solteiro, irmão da igreja. Nunca deixava de orar pelo filho e se perguntava como o deixara tornar-se o “monstrengo” de agora.
Mas Zezinho já não se pertencia. A obsessão apoderara-se dele. Eram os amigos das baladas noturnas, com os quais participava de orgias mil e do consumo de drogas. Eram os obsidiados a fazerem de seus corpos mostruários vivos de aspectos monstruosos, imaginando, com isso, chocar a sociedade, ser diferentes e... se autodestruírem.
Um dia porém (sempre o há), uma cena o chocou. Viu Armandinho chegar, com o rosto cheio de pústulas e buracos horrendos, à sala de transformações bizarras, onde eram colocados os piercings, ou se faziam as cirurgias “artísticas”. O excesso de intervenções para colocações de metais e outros objetos provocara as horríveis infecções. Ele então chorou, abraçado ao amigo também em prantos, que quase foi agredido fisicamente pelo responsável pelas “intervenções cirúrgicas”. Ouviu o pseudo cirurgião dizer-lhes, aos gritos, que a “arte corporal cirúrgica” tem seus limites físicos, e aquelas sequelas seriam irreversíveis, tanto física quanto psicologicamente.
Nesse dia, Zezinho saiu da “clínica” amargurado. Após levar o amigo à casa dele, foi ao apartamento onde morava Luizinha, então também obcecada por trabalhos artísticos de introdução de piercings em seu corpo, que já ostentava setenta e sete deles, mesmo número de Zezinho, seu namorado preferido desde a infância. Suas aparências eram repugnantes, e isto lhes foi dito por um psiquiatra que passara a tratar a moça. Precisavam internar-se e medicar-se adequadamente, antes que o socorro médico fosse inútil. Aquilo não era vida, muito menos exemplo para ninguém seguir...
Ambos, revoltados, riram-se do facultativo e o expulsaram, aos gritos , do apartamento de Luizinha. Em seguida, abriram uma garrafa de whisky, beberam bastante, escancararam a janela do apartamento, situado no 15º andar, abraçaram-se e jogaram-se de lá, espatifando seus corpos artísticos na calçada, às seis horas da manhã.
Uma vizinha ainda ouviu quando, antes de se atirarem, os dois gritaram: “Somos duas andorinhas, vamos voar, viva a liberdade!”

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA (jlo)

O mundo pede socorro: furacões, tsunamis, terremotos, países importando água,são a imagem do desespero do planeta azul, que se cora de vergonha e mágoa e se vinga exterminando a vida sob e sobre seu solo, por isso a Ecologia faz um peripatético apelo a todos nós, quer à noite, quer ao dia:
vamos ligar, ensaboar, desligar a torneira do chuveiro e da pia;
vamos desligar as tomadas de energia que não consumimos;
vamos utilizar com parcimônia a água de nossos lares;
e, só depois disso, religar a torneira para enxaguar...
Vamos deixar praias, rios e lagos limpos.
Vamos jogar o lixo no “lixo”. E, a cada página escrita,vamos reciclar e,
simplesmente,virar a página,e o outro lado também usar!
Imagine se em apenas um ano 100.000.000 de brasileiros pouparem, cada um, ao escreverem, 100 páginas A4! Serão dez bilhões de páginas poupadas, anualmente, e mais doze milhões de árvores conservadas. Um milhão a mais por mês, de árvores floridas dando sombra e oxigênio à vida.
Quem nunca carregou água em latas de 20 litros, até debaixo de chuva, como nós, aflitos,precisa ter ideia do que é a falta d’água nos lares.
Precisa saber que não devemos poluir os rios e os mares, precisa evitar desperdício em seus lares. Precisa conscientizar-se de que seus filhos e netos precisam sobreviver num mundo sem escassez, num mundo em que a vida, sob todas as formas, em seu dia a dia, se faça presente em paz e harmonia.

Brasília, jan. 2011.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Ciência do Infinito

Jorge Leite de Oliveira (Barra do Jacuípe, BA, 3 jan. 2012.)

As Cruzadas vão à guerra no combate aos muçulmanos,
matam à espada inocentes, ateiam fogo às cidades.
Em nome do Deus de amor, praticam vis atrocidades,
em nome da paz do Cristo, quantos ato desumanos!

A religião estertorava em convulsões insanas,
a venda de indulgências já não enganava esse povo,
as mentes esclarecidas propunham-lhe algo novo,
algo que lhes justificasse as esperanças humanas.

Gutenberg inventa a imprensa, e o poder de comunicar
expande-se pelas aldeias, nações e continentes.
A humanidade caminha a passos largos e potentes,
e o homem pensa que Cristo mandou morrer ou matar.

Revolta-se Lutero com a simonia cristã,
e, ao lembrar o que o Mestre fez com os vendilhões do templo,
exorta o povo católico a seguir o seu exemplo:
criticar com veemência toda prática pagã.

Após passados dezessete séculos, a Inglaterra
inventa a indústria fabril, e a produção da agricultura
transforma o Reino Unido no novo berço da cultura,
que se empenha em colonizar os povos de toda a Terra.

Swedenborg vê o mundo espiritual e conclama
o homem a crer na realidade do Espírito eterno,
irmão do Cristo, Mestre da bondade e do amor fraterno,
mas o homem nega a verdade e permanece na lama.

Em 1789, a França deu o grito
e a monarquia sucumbiu ante o clamor popular,
que fez da guilhotina um novo modo de protestar.
De Roma, triste e temente, tremia seu Papa aflito.

Pois viera Voltaire a questionar as crenças romanas,
Thomas Hobbes, antes dele, mostrara-nos o homem-lobo
e após viria Schopenhauer com as artes ab ovo
esclarecer a mente humana ante as ideias profanas.

Enquanto Nietzsche “mata Deus”, Marx prega o Comunismo,
a teoria torpe da raça superior é pregada,
chamada ópio do povo, a religião é desprezada,
prega-se o Materialismo e faz escola o Niilismo.

Já não se sabe distinguir o maldito do bendito,
as teorias materialistas grassam por toda a parte,
mas, contrapondo-se à filosofia da arte pela arte,
surge o Espiritismo como Ciência do Infinito!

às vezes (ou poema centopeia) (j.l.o)

às vezes
pessoas
escrevem
poemas
e sem
revê-los
enviam
a todos
que leem
também
sem nem
pensar
no fato
de que
traçar
uns versos
não é
tão só
rimar...
é o mais
completo
domínio
das letras
é o mais
perfeito
controle
dos sons
é o mais
profundo
encanto
das cores
é o mais
sonoro
estalo
dos beijos
é o mais
gostoso
dos cheiros
das flores
é o mais
liberto
dos voos
das aves
é a mais
sublime
canção
de amor...

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

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Lendo Bakhtin

"A alegria só é possível para mim em Deus e no mundo, isto é, só onde me familiarizo de forma justificada com a existência através do outro e para o outro, onde sou passivo e aceito a dádiva. Minha alteridade se alegra em mim, mas não o eu para mim." (In: BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. Introdução e tradução do russo de Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 124.).
Em noso entendimento, ele fala aqui, do autor da personagem literária. Se houver melhor hermenêutica, fique à vontade para expressá-la.

A pipa

A pipa (Jorge Leite de Oliveira)

Fonte: Wikipedia. Acesso em 9 de agosto de 2011.





A igreja da Penha, no Rio de Janeiro, Brasil, foi construída há quatro séculos, ou seja, em 1635, pelo capitão Baltazar de Abreu Cardoso, proprietário da quinta onde se situava o penhasco que a sustentava. Fica próxima à entrada que leva a Petrópolis. Havia ali algumas colinas, envolvidas por grande matagal e com uma gigantesca pedra, no cimo de uma delas, onde viria a ser construído o templo católico. Na época, o bairro era muito pouco habitado, o capim e as árvores eram senhores daquele espaço. Havia nascentes, muitos animais selvagens, com predomínio para os passarinhos, lagartos e cobras. A natureza ali era exuberante. A Penha é um bairro de classe média na Zona Norte do Rio de Janeiro e sua ocupação iniciou-se em 1670.

Segundo antiga lenda, em 1635, Baltazar estava junto ao penhasco, quando enorme cobra surgiu a sua frente. Nesse momento, ajoelhou-se, invocou a proteção de Nossa Senhora e viu surgir um grande lagarto, que se atracou com a cobra e, assim, ele pode fugir do lugar em segurança. Em agradecimento, construiu um pequeno templo no alto do penhasco, onde os devotos passaram a ir agradecer à santa graças recebidas e pagar promessas.

Em 1728, foi criada, pela Igreja, a Venerável Irmandade de Nossa Senhora da Penha, que assumiu a propriedade da quinta e, muito tempo depois, passou a organizar a festa da Penha, que, até hoje, atrai multidões de romeiros, em especial entre os primeiros domingos de outubro e de novembro. Essa festa foi instituída por D. João VI em 1816. Os 382 degraus que levam à igreja, e não 365, como se acredita, foram construídos por escravos, em cumprimento de uma promessa feita por um casal que não tinha filhos e, após sua oração a Nossa Senhora alcançaram a bênção de um filho. A Igreja é considerada o berço da fé e da cultura cariocas.

Abaixo da igreja, no terreno que passou a pertencer à Igreja Católica, as famílias pobres que imigraram de seus estados para o Rio de Janeiro foram construindo suas singelas casas, dando origem a uma das favelas cariocas. Num domingo de festa da Penha, em 1958, humilde casal subia os seus degraus com seus cinco filhos. Os dois menores chamavam-se Alfredo e Marcos. O primeiro era tratado, carinhosamente, pelos familiares, como Fredinho e tinha sete anos; o segundo, com três anos, recebera o apelido de Marquinhos.

Pois bem, quando a família se encontrava no meio da escadaria da igreja, a linha de uma bela pipa roxa, com um lindo desenho de uma águia, roçou o corpo de Fredinho, que segurou-a, quase em êxtase, e, a pedido de seus pais, arriou a pipa e enrolou sua longa linha e amarrou a ponta final numa lata de óleo vazia, para não perder seu tesouro se a linha escapulisse de sua mão.

“Quando voltarmos para casa eu vou soltar pipa”, disse alegremente a seu irmãozinho. Marquinhos não deixou por menos: “Posso brincar também?” “Claro que pode, mas não arrebenta a linha, ‘tá bom?” “Tá, bom.”, respondeu o outro, sob os olhares sorridentes dos pais e das três irmãs mais velhas que os acompanhavam.

Assistiram à missa, mas o pensamento de Fredinho voava longe, como a linda pipa que iria soltar. E seu irmãozinho ali, ao seu lado, imaginando a hora de também brincar com a pipa...

Terminada a missa, todos voltaram para seu barraco, situado a trinta metros da ladeira que levava à igreja. Enquanto os demais familiares entravam, Fredinho correu para o pequeno quintal da casa, desenrolou a linha, empinou o papagaio de papel e, como o vento soprasse forte, sem dificuldade, viu a pipa subir, subir, subir... E ele soltava a linha com prazer, imaginando o momento em que, terminada esta, ficaria com a lata de óleo na mão, onde amarrara a linha, para não perder o brinquedo. Esquecera do irmão, que, às suas costas, pulava de alegria ao ver o voo do papagaio de papel. E tanto pulou que acabou partindo a linha...

O momento da partida do último fio de linha, que elevava a pipa às alturas, se congelou na retina de Fredinho. E, como a águia estampada nela, a pipa voou, na direção da igreja, até se perder de vista, sob o olhar contemplativo das crianças, e parecia dizer-lhes que voaria novamente sob as escadas da igreja, sua linha iria roçar outro corpinho e fazer seu novo dono feliz por alguns instantes...

Naquele tempo, ainda não se usava cerol, e raramente alguém se machucava com linhas de pipas. Naquele tempo, soltavam-se balões, que eram seguidos por todos os baloeiros e já caíam apagados. Naquele tempo e naquele lugar, podia-se brincar e ser feliz com tão pouca coisa, como uma bola de meia ou uma pipa amarrada a um pedaço de linha.

Brasília, 10 de agosto de 2011.


Lembrando Mário Quintana

Lembrando Mário Quintana

a uva passa,
o poeta passarinho,
todos passarão,
mas eu passareio

Bsb, 6 fev. 2012.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

vivências criadoras

as vivências dos criadores ativos
vivenciam seu objeto e no objeto
porém (que coisa) não se vivenciam
no processo de seu vivenciamento

"vivencia-se o trabalho criador"
"mas o vivenciamento não se escuta"
"mas o vivenciamento não se vê
vê tão somente e escuta o que ele cria

vê o objeto que está em sua vista
vê tudo o que se lhe  externa à visão
mas não vê sua imagem exterior
seu reflexo e foto não o conquista

  O jovem que labuta (Irmão Jó) — Aonde você vai, jovem soldado? — Vou defender a pátria e a liberdade. — E você, vai aonde, atarefado? — Vo...