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segunda-feira, 28 de abril de 2014


COMUNICAR É PRECISO VIII (Jorge Leite)                     
Publicado em 28 abr. 2014.
Creia em si, mas não duvide sempre dos outros. (Machado de Assis)
 
Há poucos dias, li uma mensagem de um militar revoltado: Por quê ocorreu a revolução militar em 1964?
Em seguida, explicou que a revolução decorreu de um movimento popular, com o apoio da Igreja, pela democracia e contra os comunistas. Mas isso não vem ao caso agora, o que se discute é a frase do nobre cidadão, zeloso na defesa de nossos costumes e moral.
Uso dos porquês:
1.      Por que separado e sem acento
Em início de perguntas: Por que tanto ódio aos militares?
Significando causa ou motivo: Ainda não se sabe por que os políticos da esquerda têm tanto ódio aos militares.
 
2.      Por quê separado e com acento
Em final de perguntas: Você tem ódio dos militares por quê?
 
3.      Porque junto e sem acento:
Em resposta a pergunta: Porque os militares prenderam e torturam os terroristas. (Ah, sim, mas por que será que terroristas não fizeram o mesmo com cidadãos e militares? – item 1, pergunta irônica que traz embutida causa, razão ou motivo).
 
4.      Porquê junto e com acento:
Quando o porquê é substantivado por um determinante (artigo, pronome): Não sei o porquê de tanto ódio. Esse porquê foi a causa da revolução. (Será por que violência gera violência? Olha o caso 1 de volta, minha gente!)
 
Entendeu agora? É simples assim.
 
 
Outro equívoco, próprio dos militares, escrever nomes de meses, abrev. ou não, com inicial maiúscula: O golpe comunista foi tentado em Nov. de 1935. Correção: “[...] em nov. de 1935”.
 
Erro cometido por este articulista: “Escolhe, amigo, a que melhor lhe convier”.
Descobriste onde está o erro?
Imperativo afirmativo de escolher:
Escolhe tu
Escolha você
Escolhamos nós
Escolhei vós
Escolham vocês
 
Tu e vós, na formação imperativo afirmativo, saem do presente do indicativo sem o “s” final: escolhe(s); escolhei(s). As demais pessoas são formadas do presente do subjuntivo: escolha; escolhamos; escolham.
Agora é só montar e aplicar no texto falado ou escrito.
Mas então onde foi que eu errei?
Ora, se o verbo está na segunda pessoa, o pronome não pode ser lhe e sim te: “Escolhe, amigo, a que melhor te convenha”.
Observou a flexão do verbo? Ela deve estar, também, no presente do subjuntivo: que eu convenha, que tu convenhas, que ela convenha, que nós convenhamos, que vós convenhais, que elas convenham.
E por que o pronome oblíquo fica antes do verbo?
Porque o pronome que provoca a próclise, ou seja, traz o pronome oblíquo para antes do verbo.
 
O português é difícil?
Não creio. Basta atenção na conjugação verbal, na formação das palavras e frases, na regência verbo-nominal e, principalmente, em muita leitura, fala e escrita críticas. Mas se errar, tenha a humildade de não se melindrar, corrigir-se e seguir em frente.
 
Na próxima comunicação tem mais...
 
 
QUESTÕES VERNÁCULAS - Edição 6
 
ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)
 
Nos orações abaixo existem erros que uma maior atenção certamente ajudaria a evitar:
1.      Ela mesmo arrumou a sala.
2.      Chamei-o, mas o mesmo não atendeu.
3.      A promoção veio de encontro aos seus desejos.
4.      Comemos frango ao invés de peixe.
5.      Eis o texto onde se encontra a notícia.
6.      Maria já foi comunicada da decisão.
7.      O pai sequer foi avisado.
8.      Joana comprou uma TV a cores.
9.      O fato, embora de grandes proporções, acabou desapercebido.
10.  Espere um pouco, que irei consigo.
 
A seguir, as mesmas orações já corrigidas e uma explicação sintética caso a caso:
1.      Ela mesma arrumou a sala. (O demonstrativo mesmo em tais casos acompanha o gênero e o número do pronome. Se o pronome fosse “ele”, diríamos: Ele mesmo arrumou a sala. Se usado o pronome “nós”, diríamos: Nós mesmos arrumamos a sala.)
2.      Chamei-o, mas ele não atendeu. (O vocábulo mesmo não pode ser usado no lugar do nome ou do pronome.)
3.      A promoção veio ao encontro de seus desejos. (A expressão “de encontro” tem sentido desfavorável ou negativo. Se em vez de promoção estivesse a palavra punição, aí sim a expressão “de encontro” estaria bem aplicada. Quando o fato é favorável ou de sentido positivo, a expressão correta é “ao encontro”.)
4.      Comemos frango em vez de peixe. (Usa-se a expressão “ao invés” quando a ação referida é o oposto do fato referido inicialmente. Nos casos de mera substituição, o correto é usar a expressão “em vez”.)
5.      Eis o texto em que se encontra a notícia. (O vocábulo “onde” estará bem utilizado quando se referir a um local, a um logradouro, a uma cidade. Exemplo: No bairro do Aeroporto, onde mora meu amigo, há um centro espírita.)
6.      Maria já foi avisada da decisão. (A decisão é que foi comunicada a Maria. É erro dizer que Maria foi comunicada, mas sim avisada da decisão.)
7.      O pai nem sequer foi avisado. (O vocábulo sequer, para ter o sentido de negação de que trata a oração, exige sempre o advérbio nem.)
8.      Joana comprou um televisor em cores. (Televisão é o nome da emissora; o aparelho chama-se televisor. Em vez de “a cores”, o correto é a expressão “em cores”. Ninguém diria: transmissão a preto e branco, mas sim transmissão em preto e branco, transmissão em cores.)
9.      O fato, embora de grandes proporções, acabou despercebido. (Embora admitido em tais casos por alguns gramáticos, o vocábulo desapercebido deve ser, nesta hipótese, substituído pelo adjetivo despercebido, isto é, fato que não se percebeu.)
10.  Espere um pouco, que irei com você. (Utilizado em Portugal em construções como esta, o vocábulo consigo não é em nosso país admitido em casos assim.)

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Em dia com o Machado 101 (jlo)
 
A crônica de hoje é um palíndromo: 101.
Comentei, no dia 26 de abril, sobre o término das homenagens a Shakespeare (1564- 1616). Hoje, 23 de abril, trato sobre seu início.
A diferença é que o primeiro comentário é de 1896, e o último, de 2014. Seria um palíndromo ao contrário e vice-versa, se isso fosse possível...
O que não é possível é cair no desinteresse uma obra imortal como a do bardo inglês.
Na primeira crônica, afirmei que “Um dia, quando já não houver império britânico nem república norte-americana, haverá Shakespeare; quando se não falar inglês, falar-se-á Shakespeare”.
O que direi nesta?
O bardo nasceu em 23 de abril, mas foi batizado em 26 deste mês; por isso, oficialmente, somente no próximo sábado será comemorado seu nascimento. Coisa da Igreja...
Pois bem, tão atual é a obra shakespeariana que as autoridades governamentais decretaram a inclusão, no currículo escolar, de pelo menos duas peças inteiras do bardo.
Antes que você, amigo leitor amante da literatura, saia dando pulinhos de alegria, vejo-me constrangidamente na obrigação de prestar-lhe um esclarecimento: estamos nos referindo às escolas do Reino Unido.
Mas não se entristeça, a professora de literatura Laurie Maguire, da Universidade de Oxford, ainda prefere que os estudantes sejam levados aos teatros, para assistirem ali às mais belas peças teatrais do bardo inglês.
Embora tratasse de assuntos locais e populares, em seus dramas, tais como o amor e a morte, a ética e a política, Shakespeare transformou-os em temas sociais-universais-intemporais. Confirmando minha crônica sobre a vontade como único diferencial entre nós, dizia Shakespeare: “Where there is a will, here is a way”.
Uma de suas mais famosas peças teatrais, Hamlet, será apresentada em quatro teatros cariocas no próximo dia 26 de abril.
Que tal se também em Brasília os nossos políticos parassem um pouco para refletirem sobre a demagogia de suas vontades corrompidas e, ao lerem ou ouvirem a famosa frase de Hamlet optassem por representar, no Planalto Central, o ser e não o parecer honestos?
Não, amigo leitor, não vou repetir o bordão “To be or not to be, that is the question”. Ele é por demais conhecido. Gostaria apenas de lembrar, em nosso idioma, alguns versos do poema em que se insere a frase-verso sobre a questão de “ser ou não ser” (Ato III, Cena I):

"Empresas de alto escopo e que bem alto planam
Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
De se chamar ação".
 
Atualíssimo, não é mesmo, meu nobre amigo?
Não sei por que, lembrei-me da quase agonizante Petrobras...
— E o tal pré-sal, Machado?
— Pano de fundo, amigo, pano de fundo. Isso se encontra em todo palco teatral.
Comecei com um palíndromo numérico, não podia deixar de terminar com outro frasal. Então lá vai: ame o poema. Cessemos de uma vez esse assunto, pois acabo de ser convidado por Shakespeare a assistir sua velha peça: A comédia de erros.

domingo, 20 de abril de 2014


COMUNICAR É PRECISO VII    (Jorge Leite)  Publicado em 19 abr. 2014.
                                                                              
                                                                       Como vou saber, se ninguém me ensinar?
                                                                       Atos, 8: 31.
                                                                                                                 

Corrija gramaticalmente, as frases abaixo:
 
1. Lido no facebook: Você tem um amigo a mais de 10 anos?
2. Ouvido em um canal de TV: Agente come feijão porque gostamos muito.
3. Adaptados de postagens no google +:
3.1. Não quero ser impecilho para ninguém.
3.2. Desejo que a luz flue em sua alma.
3.3. Vou estar providenciando sua passagem.
3.4. Já fazem 12 anos que o Chico faleceu.
3.5. “Eu temo o dia em que a tecnologia ultrapassar a interatividade humana.” (Frase atribuída a Einstein.)
3.6. É para mim fazer o dever de casa?
3.7. Lá em Campo Grande houveram belas apresentações musicais.
3.8. Quando você dispor de tempo, aparece lá em casa.

Vamos às correções:

1.      Você tem um amigo há mais de dez anos? (O verbo haver, indicando tempo passado, não se flexiona. Número expresso por uma só palavra deve ser escrito por extenso. Ex.: Comi um pedaço de queijo. Faltaram dois alunos. Cem pessoas estiveram presentes. Mas: Comi 21 uvas. Faltaram 32 convidados. Estiveram presentes 102 pessoas.)

2.      A gente come feijão porque gosta muito. (A concordância do verbo com a expressão “a gente” é sempre no singular e na terceira pessoa.)

3.      Adaptações:
3.1. Não quero ser empecilho para ninguém. (“impecilho” não existe)
3.2. Desejo que a luz flua em sua alma. (O verbo está no condicional; mais precisamente, no presente do subjuntivo: que ela (a luz) flua...)
3.3. Providenciarei sua passagem. (Por que três verbos para indicar ação única?)
3.4.faz doze anos que o Chico faleceu. (O verbo fazer, exprimindo tempo passado, não se flexiona. Indicação de número expressa por palavra única pode ser escrita por extenso, exceto na indicação de item, artigos, alíneas e outras situações específicas. Ver item nº 1 acima.)
3.5. “Eu temo o dia em que a tecnologia ultrapasse a interatividade humana.” (Novamente, estamos diante de um verbo flexionado no presente do subjuntivo: que ela (a tecnologia) ultrapasse...)
3.6. É para eu fazer o dever de casa? (O sujeito antes do verbo no infinitivo será sempre representado por um pronome pessoal do caso reto: para eu fazer, para tu escreveres. Se o pronome estiver no final, será oblíquo: Ela disse isso para mim. Ele dirigiu-se a ti.)
Também após preposição só se empregam pronomes oblíquos. Ex.: Jamais houve acordo entre mim e ele.
3.7. Lá em Campo Grande, houve belas apresentações musicais. (Observe que após o adjunto adverbial inicial há uma vírgula. O verbo haver no sentido de ocorrer, existir, acontecer, não se flexiona.)
3.8. Quando você dispuser de tempo, apareça lá em casa.

LEIA, TAMBÉM, QUESTÕES VERNÁCULAS - Edição 5

ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)
Nos textos abaixo há equívocos – alguns até muito comuns – que não podemos cometer, seja na escrita, seja na fala:
1.                  O trabalho está em vias de conclusão.
2.                  O ingresso é gratuíto.
3.                  Maria irradia bons fluídos.
4.                  A jóia pesava uma grama de ouro.
5.                  Não vislumbrei ali qualquer risco.
6.                  A feira inicia amanhã.
7.                  O governo interviu imediatamente.
8.                  Maria era meia louca.
9.                  Fica mais um pouco; nós o estimamos.
10.              Fique à vontade; nós te estimamos.
11.              Na sala predominavam tons pastéis.
12.              Ela comprou duas blusas rosas.
13.              O homem sentou na mesa para comer.
14.              À medida em que a epidemia se alastrava, aumentava o número de doentes.
 
Eis os mesmos textos depois de corrigidos:
1.                  O trabalho está em via de conclusão.
2.                  O ingresso é gratuito. (Lê-se gra-tui-to.)
3.                  Maria irradia bons fluidos. (Lê-se flui-dos.)
4.                  A joia pesava um grama de ouro.
5.                  Não vislumbrei ali nenhum risco.
6.                  A feira se inicia amanhã.
7.                  O governo interveio imediatamente.
8.                  Maria era meio louca.
9.                  Fique mais um pouco; nós o estimamos.
10.              Fica à vontade; nós te estimamos.
11.              Na sala predominavam tons pastel.
12.              Ela comprou duas blusas rosa.
13.              O homem sentou-se à mesa para comer.
14.              À medida que a epidemia se alastrava, aumentava o número de doentes.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Acesse o site http://www.oconsolador.com.br/ano7/353/questoesvernaculas.html

quarta-feira, 16 de abril de 2014




Em dia com o Machado 100 (jlo)

Amigo, vou contar-lhe uma história emocionante, que presenciei tão logo retornei à morada dos pés juntos.
Recebido com certa cerimônia, encontrei aqui inumeráveis amigos que me reverenciaram pelos imerecidos méritos supostamente conquistados por minha atividade literária nas terras do Cruzeiro do Sul. Terminados os abraços de congratulação, revi Carolina, aureolada de luz e, confesso-lhe, amiga leitora, fiquei constrangido diante dela, pois meu lusco-fusco era treva ante o brilho espiritual de minha amada.
Foi quando a ouvi dizer:
— Obrigada, amor, pelo belo e imortal soneto que dedicaste a mim.
E beijou-me, carinhosamente, a mão envergonhada que tentava em vão ocultar-se-lhe dela. (Não ligue para o pleonasmo, sou assim mesmo, pleno de trocadilhos.)
Após longas horas de tête-à-tête inefável, que a mim me pareceram minutos, Carola brindou-me com uma metáfrase do meu soneto À Carolina, agora intitulada Ao Machadinho:

Querido, aqui no mundo verdadeiro
Em que o descanso é pura fantasia,
Aqui estamos, libertos da ironia
Que plantaste na Terra do Cruzeiro.
 
Pulsa-nos este afeto alvissareiro
Que, a respeito de toda a humana vida,
Fez a nossa existência engrandecida
E nos meus braços pôs meu companheiro.

Trago-te luzes, — focos conquistados
Na Terra que nos viu passar unidos
E ora vivos nos deixa e aproximados.

Que eu, se tenho nos olhos bem tecidos
Pensamentos de vida realizados,
São pensamentos lindos, renascidos.

Agradeci-lhe o imenso carinho, guardei no bolso o belo soneto-resposta e, convidado a visitar um nosso amigo recém-liberto, acompanhei-a embevecido.
Era um ex-ateu (Por incrível que pareça, aqui também ainda há ateus e pessoas de bom-senso). Seu nome, que importa? Suas obras, sim, foram de grande repercussão no mundo físico.
Era uma pessoa de bom-senso...
Fora casado com uma dama espírita altamente abnegada e profunda conhecedora das obras de Kardec, que exercia a profissão de professora e líder espírita num Estado brasileiro.
Médico clínico e cirurgião, nosso amigo nunca deixou de atender, gratuitamente, aos pacientes pobres que lhe eram encaminhados pela esposa, às instituições beneficentes, ou mesmo aos que ele percebia não terem condições financeiras para lhe pagar a consulta.
Um belo dia, observou um estranho caroço nas costas, mas não deu muita atenção. Quando a esposa soube, tempos após, não deixou de comentar:
— Bem diz o ditado: “Casa de ferreiro, espeto de pau”. Há quanto tempo você notou esse caroço nas costas?
— Para ser-lhe sincero, há seis meses, mas agora ele parece estar crescendo muito rápido.
— Procura imediatamente um dermatologista e pede-lhe para fazer uma biópsia do caroço.
Ele brincou:
— É assim mesmo. Basta estarmos casados com um profissional de qualquer área para já nos tornarmos entendidos em tudo de sua profissão... Lá vem você com biópsia. Daqui a pouco vai descrever, anatomicamente, todos os meus sinais corporais.
Ela sorriu e respondeu-lhe:
— Só esse caroço de seu corpo, talvez o mais importante, não fora notado por mim...
— É por que ele estava escondidinho atrás de minha escápula.
— Então, crápula — brincou a esposa—, trate de mandar examinar sua escápula, se não você não me escapa.
E riram-se bastante...
Ao final daquele dia, porém, o Dr. Elisário Bonfim chegou a casa menos alegre que de costume. Ao lhe ser perguntado pela esposa o que estava acontecendo com ele, respondeu-lhe, grave:
— Estou com um câncer em estado avançado de aparecimento. O prognóstico de sobrevivência é de cem por cento... Se a sua crença for verdadeira...
Ela então percebeu que, mesmo diante da morte física certa, o marido não perdia o bom humor. Convidou-o a orar e participar dos grupos de cura das instituições espíritas que presidia, mas ele foi irredutível:
— Se nunca orei antes e nunca recorri ao tratamento espiritual, não será agora que o farei.
Ela conformou-se. Reuniu todas as forças possíveis e todos os irmãos conhecidos do movimento espírita local e passaram a fazer, diariamente, preces em benefício do Dr. Bonfim, considerado um benfeitor por inúmeras pessoas.
De nada adiantou... Seis meses após a constatação do câncer, utilizando-se de todos os recursos que a medicina proporciona, realizando inumeráveis sessões de radioterapia, o câncer metastaseou-se até mesmo para o cérebro e o agora ex-médico ateu veio a ter-se conosco.
(Trocadilhinho infame, Machado.)
— Onde ele está? Perguntei à Carola.
Nesse exato momento, aproximou-se um senhor de aparência jovial e irradiando intensa luz, que me foi apresentado por minha meiga Carolina:
— Eis aqui o Dr. Elisário.
— Em que posso ajudá-lo? — perguntou-me ele.

 

 

 

terça-feira, 15 de abril de 2014

Em dia com o Machado 99 (jlo)
 
— E então, Bruxo do Cosme Velho, você continua achando que a única coisa que é nossa mesmo é a vontade?
— Adoro essa alcunha. Melhor ainda que mago ou feiticeiro... Não somente acho, como tenho certeza. Somos vontadezinhas emanadas da Grande Vontade, que é Deus. Assim como o egoísmo é a fonte de todos os vícios e males (KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, q. 913), a vontade é quem determina nossa direção no bem ou no mal.
— E o pensamento, não disse Jesus para vigiá-lo, Machado?
— Isso mesmo. O pensamento é a manifestação da vontade. Se quisermos mudá-lo, precisamos fortificar nossa vontade, assim como é preciso mudar os maus hábitos, se desejamos nos livrar do egoísmo. Se quisermos que ele seja bom, é preciso vigiá-lo e direcioná-lo ao bem. Nesse sentido, o melhor tratamento é a oração. Olhar, orar e vigiar... Ao nos recomendar isso, o Cristo, Vontade una com o Criador, dirigia-se à nossa vontade.
— Mas uma mentirinha todo mundo diz...
— É nisso que está o erro. “Quem é fiel no muito o é também no pouco”, já dizia o Cristo. Se não conseguirmos ser autênticos no mínimo, como vamos sê-lo no muito? (Lucas, 10: 16). Tal comportamento apenas demonstra o quanto descentralizada é nossa identidade.
Autenticidade ainda é para poucos...
— Essa “autenticidade” não demonstra um rompimento com a descentralização da identidade cultural, Bruxo?
— Pelo contrário, Joteli, patenteia a vitória da vontade sobre as paixões e, consequentemente, nos associa às identidades mais aperfeiçoadas.
A perfeição resulta do domínio da vontade sobre os vícios. O Absoluto possui a Vontade Suprema. Igualar-se a Ele é a nossa eterna finalidade. Por isso, o Cristo recomendou-nos: “Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai que está nos céus” (Mateus, 5: 48).
— Muito profundo... Vou refletir bastante sobre isso.
— “Em Deus existimos, em Deus nos movemos”, disse, se me não engano, Paulo de Tarso. E esse movimento, quando equilibrado, é a manifestação da Vontade Divina.
— Faz sentido, Machado, faz sentido...
Fiat lux! E a luz foi feita. Desde então, fazer a Vontade de Deus é criar a própria luz. Somos vontadezinhas que só terão luzes reais quando estivermos em perfeita sintonia com a Vontade-Luz.
— E o que acontece quando essa vontadezinha não atuar em sintonia com a Vontade Maior, meu caro Bruxo?
— Trevas, amigo, somente trevas.
— Algo mais a dizer ao leitor, Machado?
— Brindo-o com o reverso metafraseado do meu soneto Círculo vicioso:
 
Círculo virtuoso
 
Até quando estarei piscando nestas trevas?
Indagava choroso e triste o vaga-lume
A contemplar, ralado de inveja e ciúme,
A intermitente luz faiscante das estrelas.
 
Uma estrela, porém, das menores dentre elas,
Cuja forma era opaca e era pouco o seu lume,
Contemplou, nesse instante, a maior das estrelas
E a sorrir respondeu: também fui vaga-lume.
 
Transitei do minério para o vegetal
Empós fui animal e depois hominal.
Cheguei à angelitude, enfim, pela vontade
 
Que move o mundo e cresce rumo ao grande astral.
E é por isso que anseio o brilho mineral
Dessa estrela gigante, a Estrela da Verdade.

 

terça-feira, 8 de abril de 2014

Em dia com o Machado 98 (jlo)

Bom-dia, amiga leitora! Como passou a noite? Sonhou bastante? What about your dreams? Então acorde para a realidade. O que você foi ontem já não é hoje. Está em questão sua identidade cultural.
A ideia de Descartes de que minha existência está comprovada pelo ato de eu pensar acaba de ser contestada. Eu penso porque há, no espaço em que habito, inúmeros outros pensamentos com os quais me identifico em determinado contexto. Não sou original, capto a noção que mais se ajusta ao momento. Ou melhor, aproprio-me das ideias segundo minha conveniência.
— Mas nada há de você em seu pensamento, Machado?
— Há a vontade. Já nascemos com ela. O bebê, quando emite seu primeiro choro, indica a todos que tem vontade de viver.
A partir daí, o choro vai indicar muitas outras coisas mais:
chora porque quer mamar;
chora porque sente cólica;
chora porque quer o afeto materno;                   
chora porque quer dormir;
berra porque sente desconforto.
Depois, maiorzinho, surgem outras vontades:
a vontade de usar aqueles sons que transmitem outras vontades, ou seja, as falas;
a vontade de mostrar para a mamãe que já sabe se virar sozinho, no pinico ou no prato;
a vontade de andar, quando o instinto manda, primeiro, engatinhar;
a vontade de ter todos os brinquedos do mundo e com eles brincar;
a vontade de ter amiguinhos,
a vontade de ter o mundo só para si,
pois a principal vontade é a de ter:
ter mamãe;
ter papai;
ter tudo que tiver vontade de ter.
Mais tarde, adulto, continua com a vontade de ter, ter, ter...  Ter amigos, ter roupas bonitas, ter casa espaçosa, ter carros, ter uma família feliz, ter o poder...
A única coisa que não se gosta muito de ter é trabalho, mas se tiver que ter, que seja o melhor emprego, o mais alto salário; ter, enfim, quem trabalhe para ele, mas ter o sucesso só para si.
Desse modo, surge a apropriação.
Algumas pessoas se apropriam dos gestos que admiram em outras, do modo de falar e até do modo de pensar de outrem.
— Falta-lhes originalidade, Machado!
— E sobra-lhes esperteza, quando percebem que isso lhes dará uma posição de destaque na sociedade.
— Mas, e se o que imitam nos outros é negativo?
— Essa não deixa de ser uma forma de se identificar com o que desejam fazer sobressair em seu comportamento. Por trás disso está a vontade de se apropriar do modo patife de ser do outro, pois há pessoas que adoram ser canalhas.
— Esse modo de agir, entretanto, não indica uma opção central, um pensamento direcionado a um objetivo?
— Depende do objetivo e da conveniência. A mesma pessoa pode ora ser patife, ora ser boazinha. Em dado momento, manifestar perfeita identidade com seus amigos nas elucubrações malignas, visando a um fim comum; e, em outra ocasião, trair as maquinações antes apoiadas ou, descobrindo-se desmascarada, aliar-se aos donos da situação.
— Isso acontece muito na política, Bruxo do Cosme Velho...
— E como acontece. A demagogia rege as relações políticas. Mas não é apenas no Congresso que vemos isso. A política está presente em toda relação social onde haja interesses comuns.
— Exemplifique, Machado, por gentileza.
— Se desejo apropriar-me de um cargo de chefia em minha empresa, procuro ser amigo de todos os colegas de trabalho, puxo o saco do meu chefe, o qual acompanho em todas as suas decisões e andanças, muitas vezes após ouvir a maioria dos colegas, mas sempre evitando contrariar o mandachuva empresarial e, aliado a um trabalho presencial intenso procuro inteirar-me de todas as necessidades e complexidades da firma.
Depois, uma intriguinha aqui, outra ali, uma difamação lá, outra acolá, sempre disfarçadas de um zelo pela instituição, vão somando seus pontinhos.
— Mas isso não seria puro interesse pessoal?
— Evidentemente, Joteli, mas a vontade está na base de tudo: motivação, interesse, fidelidade ou infidelidade, lealdade ou deslealdade, paixão...
— A isso, acrescem-se as promessas, fruto da interação de minha vontade com as vontades alheias, o que não significa que, assumido o cargo de chefe, eu lhes atenda aos anseios. Estou certo, Bruxo amigo?
— Certíssimo! Primeiramente, satisfeita minha vontade, buscarei, na medida do possível, satisfazer a vontade de meus entes queridos: familiares e amigos. Enfim, as identidades são descentralizadas, mas a vontade é central. Primeiro eu, depois os meus...
— É por isso que algumas pessoas, mais positivistas, repetem o bordão: “Aos amigos, tudo; aos inimigos, o rigor da Lei”, não é mesmo, Machado?
— Alguns vão além e dizem: “Eu sou a lei. O que satisfizer a minha vontade é legal, o que não satisfizer, mesmo que tenha sido prometido por mim, “é ilegal, imoral ou engorda”.
— Aliada à vontade do poder está a da riqueza, não é mesmo Bruxo? Não mora aí o perigo?
— É verdade, amigo, mas a vontade-mãe é a da conquista do poder, seja ele material, seja espiritual. E isso serve tanto para os que creem na existência do espírito quanto para os que não o creem. Para estes últimos, aliada à hipocrisia e aos interesses pessoais, basta a presença de espirito na captação das vontades coletivas às quais sobrepõe a sua.
A única coisa real em nós é a vontade. Transitamos de uma identidade cultural a outra com a mesma facilidade com que trocamos de roupa. E assim, reina absoluta a vontade na luta pela realização dos nossos sonhos de poder.
— E o descentramento da identidade, Machado?
— Ora, Joteli, então você ainda não percebeu? Keep your eye on the target. Todos nós somos movidos, unicamente, pela vontade. O resto são conveniências... 

domingo, 6 de abril de 2014

COMUNICAR É PRECISO VI (Jorge Leite)
                   
Aprende — humildemente. / Ensina — praticando.
[...] Corrige — com bondade. / Perdoa — sempre.
(XAVIER, F. C. Pelo Espírito André Luiz. Agenda cristã. 32. ed.
Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1996.)                                                                   

Ouvido numa emissora de TV: “Nos dias da Copa, os servidores serão dispensados ao meio-dia e meio...” Correção: meio-dia e meia... (meio dia + meia hora).

Informado por e-mail de uma amiga a outra: “É bom está com você”.
Percebeu o equívoco? Nossa amiga esqueceu-se de que o verbo está não estar flexionado, rs. Brincadeirinha: o verbo estar não está flexionado. É o correto.
Agora, sem brincadeira, a frase correta: “É bom estar com você”.

Por vezes, se você ver algo repetido é por causa que os erros se repetem. Correto?
Nããão! O certo é: Por vezes, se você vir algo repetido é porque os erros se repetem...

Ouvido de passagem: “Nóis vai de a pé na igreja”.
Lindo, maravilhoso, principalmente se falado por uma caipirinha linda.
Correção: Nós vamos aà igreja.

No caso da expressão “de a pé” estão sendo usadas duas preposições para ligar o verbo “vamos” ao substantivo “igreja”: “de” e “a”. Basta uma; no caso o “a”: “vamos a pé”.

O caso de “na igreja” é semelhante a “no banco”, já mencionado por nós na semana passada.
Quem vai, vai a algum lugar e não em algum lugar.

E por que não é “à pé”?
Porque só existe “a” preposição antes da palavra masculina “pé”. Assim, a pé é o correto.

Se disséssemos em outra frase: “O barco navegou à matroca[1] ocorreria crase porque a palavra matroca é feminina e definida pelo artigo a ao qual se junta a preposição a. Logo: à = a prep. + a art. fem. que define a palavra feminina matroca.

Muita explicação para pouca coisa, não é mesmo, amiga leitora? Mas se você acompanhar o raciocínio desde o início entenderá que, por vezes, o “a” pode ser preposição, por vezes, artigo.
Há casos, ainda, em que ele é pronome.
Exemplo: — O que fizeste de minha sandália?
— Dei-a àquele mendigo que passou em frente à minha casa.
Primeiro “a”: pronome.
Segundo e terceiro à (a+ a)= “a” preposição e “a” artigo definido feminino.

Ainda temos, na frase acima, àquele= a prep. + aquele= pronome demonstrativo.

Frase lida em mensagem de defesa da democracia: “Caso a democracia não se defende pela educação de seus filhos, tudo está perdido”.
Onde está o erro?
Resposta: o verbo defender está sendo conjugado no modo subjuntivo ou condicional. O correto, gramaticalmente, é escrever “Caso a democracia não se defenda [...]” (pres. do subj..).
Vamos conjugar verbos, minha gente!

LEIA, TAMBÉM, QUESTÕES VERNÁCULAS (4ª edição)

ASTOLFO O. DE OLIVEIRA FILHO
aoofilho@oconsolador.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)


Comecemos a seção lembrando inicialmente alguma coisa relacionada com a grafia dos vocábulos:
      1. Adentro - Constitui uma palavra só. Ex.: Ele entrou mata adentro; o rapaz dançou noite adentro.
      2. Afora – A exemplo de adentro, também é uma única palavra. Ex.: A mulher viajou pelo país afora.
      3. Aficionado – Esta palavra é escrita assim; não existe “aficcionado”.
      4. Bochincho ou bochinche – É assim que se escrevem estes vocábulos; não existe bochicho nem buxixo.
      6. Dar à luz – Com o significado de “pôr no mundo”, é assim que se escreve esta expressão. Ex.: A mãe deu à luz um lindo menino (e não “deu a luz a um lindo menino”).
      7.  Décimo terceiro – Na grafia deste numeral não há hífen.
      8.  De vez que – Embora usada por diversos autores espíritas de renome, esta locução não existe e deve ser substituída por “uma vez que”. Ex.: Uma vez que ele obteve o que pretendia, é hoje outro homem.
      9.   Digladiar – É assim que se escreve este vocábulo; não existe degladiar.
     10. Embaixo – Trata-se de uma palavra só. Ex.: Ele pôs os sapatos embaixo da cama.







[1] à matroca: à toa, ao acaso, de qualquer maneira. Dic. Aurélio da Língua Portuguesa.

  Quando o texto é escorreito (Irmão Jó)   Atento à escrita correta É o olho do revisor, Mas pôr tudo em linha certa É com o diagramador.   ...