Em
dia com o Machado 234 (jlo)
Acompanhei meu secretário e esposa em
passeio que fizeram ao Rio de Janeiro. No centro da cidade, eles resolveram
fazer umas compras na Av. Nossa Senhora de Copacabana.
Como de praxe, viram deitados ou sentados
nas calçadas diversos mendigos. Um deles era Simão, idoso e enfermo, cujo
cajado estava encostado na porta fechada de uma loja.
Vagara, incerto, após fugir da seca no
Piauí e fora despejado do pardieiro onde se hospedara, após acabar-se o pouco
dinheiro que trouxera, resultante da venda de seu pequeno sítio a parentes que
prometeram ajudá-lo, mas o deixaram desamparado. Agora, não lhe restava outra
opção a não ser a de ser mais um dentre tantos seres humanos (ser, ser,
seres, notou, leitor?) sem lar, sem
cama, sem pão (sem, sem, sem,
leitora, você viu isso?) e maltrapilho a vagar incerto, pelas longas e, por
vezes, tumultuadas avenidas cariocas (as,
as, as... isso é coisa da carioca Cecília Malan, rs).
Os cabelos alvos, a face enrugada, as mãos
encarquilhadas de Simão muito pouco comoviam os transeuntes, que não se
importavam em saber de onde viera e por que ali se encontrava. Os que o viam,
apenas sabiam que se tratava de um mendigo. Não lhe conheciam o passado e nem
lhes interessava seu futuro.
Com o passar dos dias, sem condições de
comprar remédios para as feridas que surgiam em seu corpo encarquilhado, em
virtude da desidratação e quedas, muitos pedestres o tratavam mal. Diversas
pessoas afastavam-se enojadas. Alguns diziam que era “leproso”, outros alegavam
que se fazia de doente e necessitado, mas que era farsante explorador da bolsa
alheia.
Muitas vezes, Simão refletia em como fora
difícil sua vida na caatinga nordestina; todavia, quando moço, possuía corpo
robusto e boa saúde, a tudo superando, até chegar ali, na esperança de
encontrar ao menos um biscate, um pequeno quarto onde repousar da velhice,
alguma roupa limpa para vestir e o pão de cada dia. O tempo foi passando e
Simão foi ficando cada vez mais fraco, mais desiludido, mais enfermo e cansado.
Já não tinha forças nem mesmo para tentar localizar seus parentes no Piauí.
Muito menos coragem para tal, pois sabia que seus três “filhos homens” e suas
“cinco filhas mulheres” viviam em situação de penúria material e sua viagem
para a “Cidade Maravilhosa” fora, para todos, uma boca a menos para comer a
mandioca ralada com o pouco feijão da cuia; mais caldo do que feijão.
Um dia, porém, quando Joteli e esposa já
não mais caminhavam pela avenida Nossa Senhora de Copacabana, após uma noite de
chuva e de frio, o velho sofredor tentou levantar-se do seu canto na calçada
onde dormira e caiu. Perdeu os sentidos e... horas depois, um rabecão que por
ali passava recolheu seu corpo sem vida e o enterrou como indigente.
Assim é o destino de milhões de seres
humanos.
Esta e outras cenas, vistas por meu amigo,
o poeta português João de Deus,
inspirou-lhe o seguinte poema, que compartilho com meus trinta ou quarenta
fiéis leitores semanais:
Simão,
o mendigo
Doente,
pobre, velhinho,
O
desditoso Simão,
Arrimado
a seu bordão,
Andava
devagarinho...
Pés e
mãos em chaga aberta,
Lá ia o
velho, coitado!
Enfermo,
desamparado
E
humilde na estrada incerta.
Cabelo
todo branquinho,
Rugosa a
face morena,
O pobre
metia pena
A vagar
pelo caminho...
De onde
viera? Ora, quem
Buscava
saber ao certo?
Vinha de
longe ou de perto?
Ninguém
sabia, ninguém.
Só lhe
sabiam do nome,
E que,
em miséria, sem nada,
Ele esmolava
na estrada,
A fim de
matar a fome.
Estendendo
seu chapéu,
Pedia,
cheio de dor:
— Uma
esmola, meu senhor,
Por amor
ao Pai do Céu!...
Mas, oh!
Deus, que desalento
Neste
mundo de aflição!
Ninguém
ouvia Simão
Nas
horas do sofrimento.
— Passai
de largo! é leproso!...
Diziam
homens cruéis
— Oh!
não vos aproximeis
Deste ancião
perigoso!...
— Ah!
que graça! Põe-te à brisa! —
Exclamava
outro passante —
— Nada
de esmola ao tratante,
Que este velho não precisa!...
O
mendigo, nos seus ais,
Dizia: —
Viva a saúde!
Trabalhei
enquanto pude,
Agora,
não posso mais...
Toda a
gente lhe fugia,
Ninguém
lhe dava uma sopa,
Nem um
trapinho de roupa
Para a
noite da agonia.
Muito
tempo era passado,
E o
desditoso velhinho
Sentia-se
mais sozinho,
Mais
doente, mais cansado...
Chegou, enfim,
um momento
Em
que o velho sofredor
Caiu
de frio e de dor
Na estrada do
sofrimento.
Caiu
e sonhou, contente,
Embora
a sede e o cansaço,
Que
Jesus vinha do Espaço
Dizendo-lhe,
docemente:
—
Escuta, meu bom Simão,
Não
temas, querido amigo!
Sê
forte! Eu estou contigo.
Chegaste
à ressurreição.
Não chores. Estou aqui!...
Terminou tua aflição,
Estás
em meu coração!
Pensavas
que te esqueci?
Enquanto
o mundo enganado
Atormentava-te
ao peso
De zombaria e desprezo,
Eu sempre estive ao
teu lado.
Teus prantos e tuas dores
São,
hoje, a luz que te veste
No
campo do amor celeste,
Repleto
de eternas flores.
E
Jesus, em voz mais terna,
Concluía:
— Vem, Simão,
À
doce consolação
Do mundo de luz
eterna!...
E Simão,
chorando e rindo,
A
seguir, ditoso, o Mestre,
Esqueceu
a dor terrestre,
No céu
venturoso e lindo.
O
caminho era de estrelas
De tão
sublime matiz
Que o
pobre ria, feliz,
Sem
saber como entendê-las.
No outro
dia, ao reconforto
Do Sol
de coroa erguida,
Acharam
Simão sem vida...
O
mendigo estava morto.
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poemas na obra Antologia Mediúnica do
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O livro
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