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segunda-feira, 25 de dezembro de 2017



Em dia com o Machado 297 (jÓ)

Então, é Natal! e, sendo assim, tentaremos reproduzir as palavras de um excelente poeta, Bráulio Bessa, em cujo quadro, intitulado Poesia com Rapadura, tem declamado poemas de elevado teor moral. Sua apresentação é transmitida, semanalmente, no programa Encontro com Fátima Bernardes, da rede Globo de televisão.
Como o poema foi declamado ao vivo, fizemos pequenos ajustes, ligados à sua métrica, sem alteração do conteúdo, para os quais pedimos licença ao Bráulio. O poeta começa lembrando-nos que vimos a este mundo sem nada e dele vamos embora sem nada levar. E continua...

Que você, neste Natal,
Entenda o real sentido
Da data em que veio ao mundo
Um homem bom, destemido;
E que o dono desta festa
Não pode ser esquecido.

Vindo, lá do Polo Norte,
Num trenó cheio de luz,
Papai Noel é lembrado
Muito mais do que Jesus.

[...]

Sei que dar presente é bom,
Mas bom mesmo é ser presente.
Ser amigo, ser parceiro,
Ser o abraço mais quente,
Permitir que nossos olhos
Não enxerguem só a gente.

Que você, neste momento,
Faça uma reflexão
Independente de crença,
De fé e religião.

Pratique o bem sem parar,
Pois não adianta orar
Se não existir ação.

Alimente um faminto,
Ferido em meio da rua,
Agasalhe um indigente
Coberto só pela Lua.

Sua parte é ajudar
E o mundo pode mudar
Cada um fazendo a sua...

Abrace um desconhecido,
Perdoe quem lhe feriu,
Se esforce pra reerguer
Um amigo que caiu
E tente dar esperança
Para alguém que desistiu...

Convença quem está triste
Para somente sorrir.
Aconselhe quem parou,
Que inda há tempo pra seguir,
E para aquele que errou
Dá tempo de corrigir.

Faça o bem por qualquer um
Sem perguntar o porquê.
Parece fora de moda
Para a pessoa, clichê,
Mas quando se ajuda alguém
O ajudado é você.

Que você possa ser bom
Começando de janeiro
E que este sentimento
Seja firme e verdadeiro.

Que a gente viva o Natal
Todo ano, o ano inteiro.

Desse modo, amigo leitor, nada mais temos a acrescentar, a não ser lhe dizer que refletiremos, ainda mais do que temos feito, no conteúdo dessa mensagem, para que, desde agora, e no próximo ano, sejamos um pouco melhor do que fomos no ano atual.

Feliz Natal! 

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017



Em dia com o Machado 296 (JÓ)

            No meu tempo, eu fazia livremente da crítica política, econômica, filosófica e religiosa um terreno fértil para minhas obras literárias. Nessa época, éramos regidos pela monarquia, até 15 de novembro de 1889, quando ocorreu o primeiro golpe político no país, que instaurou a malfadada República. Golpe militar, que foi apoiado pela burguesia da época, inconformada com a abolição da escravidão no último país da América a extinguir o cativeiro oficialmente. Anos antes, já prevendo a catástrofe brasileira, eu dissera que pedia aos deuses que não permitissem a instauração de uma República no Brasil, pois esse seria “o dia da mais insolente aristocracia que o Sol jamais alumiou”.
            Dom Pedro II era conhecido mundialmente por seu amor às artes, à literatura e por seu espírito de tolerância à manifestação do pensamento e à proteção dos escravos. A ideia que ele defendia, junto com o barão de Mauá, era a de libertar e indenizar todos os ex-escravos. Na casa imperial, somente trabalhavam pessoas assalariadas. Ali não se admitia serviço escravo, e, nos saraus promovidos pela família imperial, era comum a presença de negros, como, por exemplo, a do renomado engenheiro André Rebouças.  
            D. Pedro II, desde 1848, tentara, no parlamento carioca, a abolição da escravatura, o que o indispôs com os poderosos cafeicultores e demais fazendeiros locais durante quatro décadas.  Os próprios filhos da princesa Isabel publicavam, em Petrópolis, um jornal abolicionista, mas os escravocratas poderosos não admitiam ficar sem sua servil mão de obra e combinaram com os burgueses e militares da época o “golpe republicano”.
            Eu dizia, no início, que nada do que escrevi foi censurado pela monarquia no século XIX. Também na atualidade, a liberdade de imprensa e de manifestação de pensamento é algo louvável. Tão digno de louvor, que hoje um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) acusou seus pares de terem cometido um erro grave ao dar crédito à delação de Joesley Batista contra o presidente da República.
            Que absurdo! - dizia Sua Exª -, Joesley acusou sem provas... Joesley, empresário riquíssimo, usou um gravador de terceira categoria para gravar as inocentes palavras do presidente, que lhe solicitava pagamento de propinas. Fez o pedido ao empresário, na residência oficial da presidência, sem saber que estava sendo gravado. Isso lá é prova?!
            Aliás, acho isso uma temeridade... gravar a fala do dignitário maior da nação. Estúpido!
            É verdade! não há provas, disse outro ministro... a não ser a da filmagem de um ex-deputado, office boy do presidente, o qual, ao ser preso pela polícia federal, transportava uma mala com R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) para pagamento de propina ao chefe do executivo federal. Que atrevimento! querer processar um presidente da República por causa de meio milhão de reais. Migalha...
            Dias depois, diversos empresários e um doleiro acusam nosso dignitário maior como chefe do bando corrupto que avassala a Nação. Absurdos! absurdos! ab... surdos! Tais energúmenos só podem estar querendo ser presos. Salafrários!
            Bem fez o presidente, quando nomeou para seu ministro-chefe da secretaria de governo um grande parlamentar, isento de toda e qualquer denúncia, a não ser a de improbidade administrativa, na administração pública, em seu estado, acrescida da fama de ser pelego dos detentores de alguns dos mais altos cargos administrativos do Executivo e do Legislativo: o ex-presidente da Câmara dos Deputados, e ex-governador de MS, ora presos, e o Excelentíssimo Senhor Presidente da República Michel Temer.
            Agora, o Ministro-Chefe da Secretaria de Governo acusa o ex-procurador-geral da República de mentiroso, por ter incriminado muitos parlamentares e o próprio chefe do Executivo. Bobagem, pura bobagem. Criminosos por quê? Teriam os nobres parlamentares e o presidente matado alguém? Não, não e não!
            Pensando bem, creio que me enganei a respeito da República. Afinal de contas, como diz um ex-presidente, réu em diversos processos, prender um governador por estar roubando dinheiro público é um crime. Provavelmente, culto como é, ele sabe que “res” significa coisa e pública, por se referir a povo, só pode ser de quem foi eleito pelo povo.
            Pena que a Justiça não entenda assim... Mas seus membros não foram eleitos democraticamente...
            Por outro lado, a imprensa brasileira só prega mentiras, a não ser quando apoia o ex-presidente. Mente, portanto, na acusação da doação de seu recebimento de um triplex, em virtude do cargo.  Calunia-o quando o acusa de ter ganho um sítio. Nada provam as delações de lhe terem sido doados milhões, cujos valores constam de suas contas bancárias.
            Pura herança. E ninguém pode ser acusado do recebimento de uma herança.
            E os grampos telefônicos comprometedores? Herança da ditadura militar...

            Que os deuses (creo aun en los dioses) me perdoem ter duvidado da República.

sábado, 16 de dezembro de 2017



Em dia com o Machado 295 (jÓ)

            — Amigo Machado, que dizem os espíritos celestes em relação à Bíblia?
            — Ah, meu caro Jó, esse é um tema da mais alta transcendência. Embora o Antigo Testamento (AT) seja considerado a palavra de Deus ao povo hebreu e, por extensão, a toda a humanidade, o Senhor jamais se comunica diretamente com os seres humanos. Isso, entretanto, não tira a importância dessa obra, desde que observado seu aspecto de legislação temporal.
            Deus é Espírito, já dissera Jesus à samaritana. E, como Inteligência Suprema que nos criou simples e ignorantes, mas fadados à perfeição, ao longo dos milênios, à medida que algum de nós atinge elevada condição espiritual e se identifica com Ele, tal entidade recebe sua incumbência de representá-lo em cada um dos inumeráveis orbes do Universo. São os chamados profetas, messias ou cristos, como é o caso de Jesus.
            Na Terra, dentre muitos profetas que nos trouxeram revelações transcendentes, temos, na Índia, Sidarta Gautama, o Buda; na China, Confúcio e Lao-Tsé; na Pérsia, Zoroastro; na Grécia, Sócrates e Platão... Entretanto, num período bastante obscuro, há cerca de 1.600 anos a.C., Moisés recebeu mediunicamente os X Mandamentos, cuja síntese maravilhosa foi proposta pelo fundador, governador e protetor desde planeta azul: Jesus Cristo, a serviço de quem estão todos os chamados profetas.
            — Então, a Bíblia não é o único livro sagrado, Machado?
            — Não, Jó, pois embora esses profetas, em sua época, tenham trazido ao mundo mensagens de cunho elevado, todos eles foram intérpretes humanos que, ao lado de grandes verdades, impuseram suas ideias pessoais. Daí terem surgido as leis genéricas que contradizem a Lei única de Deus: a Lei do Amor. Esta, ninguém, como o Cristo, pregou e exemplificou de modo mais perfeito.
            Estas palavras de Jesus confirmam sua identificação apenas com a Lei de Deus: “Não vim modificar a Lei e os profetas” (Mateus, 5: 17); mas também disse: “Ouvistes o que foi dito: olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao mal; mas, se alguém vos bater na face direita, oferecei-lhe também a outra” (id., 5: 38- 39).
            Mesmo nessas últimas palavras, devemos entender o sentido simbólico. Caso contrário, seríamos massacrados pelas criaturas ainda embrutecidas da Terra. E o esclarecimento do sentido do oferecimento da outra face, proposto por Ele, nós tivemos na passagem evangélica em que um dos criados do sumo sacerdote o esbofeteia e, ruborizado de vergonha, ouve do Cristo esta repreensão: “Se falei mal, testemunha sobre o mal; mas, se falei bem, por que me bates?” (João, 18: 23).
            O Antigo Testamento é o clamor humano aos céus; e o Novo Testamento é a resposta de Deus, por seu Filho e nosso irmão maior: Nosso Senhor Jesus Cristo! No primeiro caso, a lei estava enfocada na justiça; no segundo, no amor. E, sendo Deus Amor, não são d’Ele decisões e palavras como estas:
Então, arrependeu-se o Senhor de haver feito o homem sobre a Terra, e pesou-lhe em seu coração. E disse Deus: Destruirei, de sobre a face da Terra, o homem que criei e, com ele, o animal, até o réptil e até a ave do céu; porque me arrependo de os haver feito (Gênesis, 6: 6- 7).

            Falando sobre a perfeição de Deus, nosso Pai, esclarece Jesus que Aquele “[...] faz que o seu Sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mateus, 5: 45 e 48). Por fim, recomenda: “Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai, que está nos céus” (id.). Desse modo, mais uma vez, deduzimos que somos filhos da Perfeição Suprema, e jamais nosso Pai se arrependeria de nos ter criado.
            Em suma, Jó, precisamos ler o AT, assim como outras obras sagradas, atentos ao que no AT Jesus preservou como Lei intemporal: o amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. É nisso que estão toda a Lei e os profetas.

            Quanto ao exame dos textos sagrados, atentemos para o que diz Paulo em I Tessalonicenses, 5: 21: “Examinai tudo, retende o bem”. Mas é em O Evangelho segundo o Espiritismo que você encontrará a essência da Mensagem Divina: o ensino moral, única parte incontroversa da Boa-Nova em todas as épocas da humanidade, por representar a palavra do único ser identificado plenamente com Deus: Jesus Cristo. 

sábado, 9 de dezembro de 2017




Em dia com o Machado 294 ()

— Amigo Joteli, parabenizo-o pela sua seleção de doze crônicas minhas nas quais abordo o Espiritismo. Aprovo ipsis litteris sua crítica ao texto dessas crônicas em sua tese aprovada pelo egrégio Departamento de Pós-Graduação em Literatura da UnB no ano passado.
— É, Machado, já se vai um ano do término de minha aventura maravilhosa ali. Comecei pela especialização, em seguida, cursei o mestrado e, finalmente, o doutorado. Não digo isso por vaidade, nem para me exaltar orgulhosamente, mas para incentivar quem deseja conquistar um ideal a perseverar nesse propósito. Em todos esses cursos, você esteve presente. Obrigado, Bruxo!
— Relate-me como se deu sua saga pelo conhecimento literário, Jó.
— Comecei minha luta por esse objetivo ainda jovem. Não fui aluno de graduação da UnB; mas, com perseverança, após cerca de quinze anos de estudos, somente ali, sempre com muita humildade, cheguei ao que queria, graças a Deus. Antes de ingressar na literatura, cursei todas as matérias do curso de linguística aplicada da UnB. Fui aprovado, mas não selecionado para o mestrado desse curso. Então, percebi que minha realização estaria na literatura, em especial na divulgação do riquíssimo material literário espírita, ainda tão pouco conhecido nos meios acadêmicos.
— Desconhecido e discriminado, Joteli; quando somos jovens, e mesmo na idade madura, nem sempre respeitamos a opinião alheia na defesa de nossos pontos de vista. Principalmente, se caímos no erro de apenas analisar um dos lados da questão. Desse modo, o parecer de Eugênio Gomes sobre meu uso da Bíblia, para fins literários, exclusivamente, pode ser acrescido também do Espiritismo. 
Entretanto, quando se analisam todas as crônicas de minha abordagem à nova doutrina, percebe-se a passagem de uma crítica acerba, e mesmo extremada, a outra, mais tolerante e até com o reconhecimento de que “o Espiritismo se ocupa de altos problemas” (A semana, 29 dez. 1895).
Em texto anterior, defendo a liberdade religiosa, principalmente após a extinção da religião do Estado.

Desde que a porta fica assim aberta a todos, em que me hei de fundar para meter na cadeia o Espiritismo? Responder-me-ás que é uma burla; mas onde está o critério para distinguir entre o Evangelho lido pelo presidente Abalo, e o do meu vigário é mais velho, mas uma religião não é obrigada a ter cabelos brancos. Há religiões moças e robustas. Curar com água? Mas o já citado padre Kneipp não faz outra cousa, e o Código, se ele cá vier, deixá-lo-á curar em paz (A semana, 27 out. 1895).

E, então, ainda confundia fenômenos, por ela estudados, com a doutrina... A grande certeza proporcionada pelo Espiritismo é a de que nosso retorno à vida física tem sempre o objetivo de “expiação, melhoramento progressivo da humanidade” (questão 167 d’O Livro dos Espíritos – LE). Isso explica haver no mundo tanta desigualdade social.
— Realmente, amigo Bruxo, se a existência fosse única, inúmeros problemas decorrentes da sorte de pobres e ricos, sãos e aleijados, ignorantes e sábios, bons e maus, enfim, jamais encontrariam solução.
— Depois, a reencarnação não é para sempre, não é mesmo, Joteli?

— Exatamente, Machado, na questão 168 do LE, lemos que “[...] Desde que se ache limpo de todas as impurezas, não tem mais [o espírito] necessidade das provas da vida material”. Na questão 170 dessa obra, somos esclarecidos de que, após sua última encarnação, o espírito se torna “[...] bem-aventurado; puro espírito”. É nisso que está o sentido da vida, ainda tão incompreendido e questionado por muitas pessoas.

sábado, 2 de dezembro de 2017




Em dia com o Machado 293 ()

                                                                              Sede perfeitos... – Jesus (Mateus, 5:48)


O ser humano, neste tempo materialista, queda-se perplexo com as notícias do rádio, da televisão, da Internet, do Instagram, do WhatsApp... e, pasme, leitor amigo, até do jornal e da revista, assustado com o vazio deixado por uma alma que se perde. Neste mundo de sete bilhões de hóspedes temporários, questiona-se sobre a finalidade da vida, e muitos concluem que não vale a pena viver.
É o que os meios de comunicação supracitados trazem à tona. Ainda ontem, um militar acusado de praticar crimes de guerra, ao ouvir a sentença do juiz, condenando-o à morte, abriu pequeno frasco com veneno e sorveu-o todo. Paradoxalmente, fez isso sob os protestos do magistrado. Morreu no hospital, sob os cuidados da justiça...
Viver sem ter companhia parece ser insuportável... No entanto, várias criaturas vivem solitárias, cercadas de outras solidões, todas com seus celulares ligados a notícias instantâneas de tudo que acontece no mundo. 
Atualmente, nas relações amorosas, sem mais mesuras, sem mais afagos de mãos, já se parte para “os finalmentes”, sucedidos do vazio no peito e na alma. O apelo ao erotismo está por toda parte, sem poupar os próprios infantes. Até o desespero invadir os corações sensíveis e o vazio da alma sugerir-lhes pôr fim ao corpo físico, por efeito das doenças materiais ou espirituais.
Durante nossa última pós-graduação na UnB, soubemos de casos de colegas que optaram pelo suicídio, ante o desafio psicológico de realizarem diversos estudos, pesquisas e participações em congressos, assoberbados por outros problemas, como doenças.
Também muitas pessoas matam-se, aos poucos, consumindo drogas e exaurindo-se em paixões animalizadas. 
Quando se tenta esclarecê-las sobre as consequências de seus atos, após esta vida efêmera, negam-se a acreditar na existência post mortem
Inúmeras criaturas exaurem-se nos vícios e paixões doentias. Até que, enfastiadas de tudo, resolvam também matar-se, vítimas de si mesmas, depois de terem feito outras vítimas. 
Pura ilusão, pois o fim é apenas do corpo físico. Infelizmente, talvez, cerca de noventa por cento da humanidade ignore a existência do corpo espiritual, que Kardec denomina perispírito. E o que fazemos do nosso organismo físico afeta nosso órgão espiritual inevitavelmente. 
Não é Deus, porém, que nos castiga.  Deus é Amor. Por amor e para o amor fomos criados. Somos nós próprios que, pelo mau uso do livre-arbítrio, sofremos as consequências físicas ou morais de nossos atos.
Nesta semana, fomos informados sobre o suicídio de duas jovens estudantes de medicina, com intervalo de poucos dias entre uma e outra morte. Imaginemos que ambas tenham optado por atirar-se de local alto contra o asfalto. Dependendo de como cada uma cair, seu perispírito sofrerá as consequências da lesão ao corpo físico. E o desespero do revel à Lei da Vida, ao se perceber vivo, mutilado e sofrido, é narrado de forma dramática pelos espíritos em várias obras mediúnicas.  
A misericórdia de Deus está sempre pronta a socorrer cada um de nós, segundo as circunstâncias atenuantes e agravantes de nossos atos. Mas, consoante relatos dos diversos espíritos suicidas, nada se compara aos seus horrores e desesperos, por pior que tenha sido sua vida antes do supremo ato de rebeldia e falta de fé na Providência Divina.
A médium Yvonne Pereira psicografou a narração do espírito Camilo Castelo Branco, grande romancista português, sobre os horrores sofridos por ele após seu suicídio. 
Muitos outros relatos existem em diversas obras espíritas, mas sugiro ao leitor interessado no assunto a leitura da extraordinária obra psicografada por Yvonne, cujo título é Memórias de um Suicida, publicada pela Federação Espírita Brasileira.
Esta é a grande missão do Espiritismo: comprovar-nos, pelo relato dos chamados mortos, que a morte é pura mudança de estado vibratório do espírito. E Jesus já nos alertava sobre a excelência do amor como antídoto de todo o mal; mas amor derivado das atitudes morais elevadas. 
Caso alguém não acredite na sobrevivência da alma após a morte e imagine que a morte do corpo implica o mergulho no nada, como encontrar forças para superar os apelos materialistas? Como encontrar um sentido para a vida? 
Estudando o Espiritismo e praticando os ensinos morais dos espíritos elevados, que relembram as palavras de Jesus Cristo, substituída a letra que mata pelo espírito que vivifica, acharemos o propósito maior de nossas vidas: amar e servir, pois amando e servindo estaremos realizando a finalidade de nosso eterno existir: a perfeição espiritual.

sábado, 25 de novembro de 2017




Em dia com o Machado 292 (jÓ)


Amigo Jó, vou contar-lhe uma história simples, que exemplifica como funciona a Lei Divina de ação e reação. Você verá que essa Lei independe de qualquer sentimento pessoal de revide a uma maldade que nos seja feita por alguém, seja esse mal decorrente de sua ação ou omissão.
Já lhe contei aqui o caso envolvendo dois amigos de juventude, quando ambos moravam no Rio de Janeiro e um deles era soldado do Exército? Se não o fiz, faço-o agora. Se já o fiz, faço-o novamente. E a culpa é de minha fraca memória.
Etiel, o militar, era um dos sete filhos órfãos de pai, de família muito humilde e, ainda assim, solidária com outras pessoas também carentes economicamente. Por esse motivo, e por não ter tido oportunidade de concluir seus estudos do antigo segundo grau, atual ensino médio, após um tempo de trabalho no comércio, nosso amigo foi recrutado...
Serviu no Exército quando os militares, como bons guardiães da pátria, suspeitavam que todo cidadão menos bitolado ou mais letrado que outros era tido por suspeito de traição ao Brasil. Mas também o amor à pátria e a honestidade no trato com as coisas públicas eram fundamentais. Tanto foi assim que um dos lemas da época era: “Brasil, ame-o ou deixe-o”.
A organização militar em que Etiel incorporou, já o dissemos aqui, era comandada por um dos mais rígidos generais da época, cujo nome não vem ao caso citar. O que lembramos era a função da polícia do Exército (PE) que, não tendo bandidos assassinos de policiais, como atualmente, para prender, ufanava-se de fiscalizar e encarcerar recrutas moradores de favelas, em sua maioria, por coisas mínimas, como as que gosto de catar e citar em meus escritos.
Desse modo, muitas vezes, sem mais nem menos, alguns dos cidadãos que não tinham muitas opções profissionais, a não ser ingressar na carreira militar, acabavam indo fazer uma “visita” ao Batalhão da Polícia do Exército (BPEx), como foi o caso de meu amigo, quando seu cinto era sujado por alguns dos soldados brincalhões desse batalhão. Ali ficava algumas horas em fila e, por vezes, em posição de sentido, até que anotassem seu nome, identidade, unidade militar e fosse liberado...
Enquanto um chora, outro ri. É a lei do mundo, meu caro Joteli. É a perfeição do universo. Tudo chorando seria monótono. Tudo rindo, seria cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e valsas, soluços e danças traz à alma do povo a variedade necessária e o equilíbrio da vida está feito. Se a infração fosse considerada grave, como a de agressão a um dos soldados da PE, o infrator poderia ficar detido no batalhão e só seria liberado alguns dias depois, para se apresentar ao comandante do seu quartel e ficar mais algum tempo preso...
Andar na rua sem a farda no corpo, nem pensar. Diariamente, tinham de ir para seus quartéis com o fardamento engomado e passado, além do cinto limpo com Kaol e os sapatos engraxados, barba feita e cabelos cortados. Como era lindo o metal da fivela do cinto, brilhava tanto, quando bem limpo, que até parecia ouro. Isso demonstra quanto eram amados... Cinto limpo era a ilusão do ouro, cinto sujo era a demonstração da falta de gratidão a tão paternais superiores hierárquicos, que lhes concediam a ilusão de ser gente.
— E aonde vai a lei de ação e reação nessa história, meu caro Bruxo?
— Aqui: Etiel gostava muito de uma jaqueta verde-oliva muito elegante, que fazia parte do seu uniforme militar, com previsão de uso para dias frios. Como morava perto da Igreja da Penha e, no início da ladeira que dava acesso a sua casa, havia um parque de diversões, certo domingo, os dois amigos resolveram ir passear ali. Julgando-se livre da vigilância dos soldados da PE, Etiel resolveu, naquela noite fria, usar a jaqueta.
Após passearem pelo parque, os amigos pararam em frente a um estande de tiro ao alvo com espingarda de rolha e pressão de ar. De repente, dois soldados da PE, cada um deles com quase dois metros de altura, abordaram Etiel. Então, um deles perguntou ao meu franzino amigo, vinte centímetros mais baixo: “Quem lhe autorizou usar essa jaqueta?”
Ao ouvir isso, o amigo de Etiel saiu de fininho e desapareceu no meio dos frequentadores do parque, deixando-o à mercê dos seus algozes que, se fossem assaltantes, teriam feito o que quisessem com meu amigo.
Mas foi só um susto...
Após ser advertido, Etiel foi deixado à vontade pelos “policiais”, que lhe “recomendaram” tirar a jaqueta e não mais a usar sem a farda.
Vinte anos depois, Etiel foi visitado, em Brasília, por aquele quase irmão, acolhido em seu lar durante longos anos... Agora comerciante bem-sucedido, o amigo de Etiel foi com este ao Setor Comercial Sul (SCS), onde pretendia sacar dinheiro para umas compras que faria no Paraguai. Chegando ao SCS, foi o amigo que pediu a Etiel para aguardá-lo em frente a uma loja mais afastada, enquanto ele iria ao banco...
Cerca de meia hora depois, pálido como cera, o amigo chegou e disse-lhe que, ao sair do banco, fora abordado por dois assaltantes.  Estes encostaram-no num muro e, enfiando as mãos em seus bolsos da calça, roubaram-lhe o dinheiro que ali estava.
Penalizado, Etiel ouviu o amigo explicar-lhe que, por sorte, a outra metade do dinheiro sacado ficara no bolso traseiro da calça, e os ladrões não o viram. Somente então meu amigo lembrou-se do ocorrido vinte anos atrás, no parque da Penha, no Rio de Janeiro.
Assim, fica a lição: “Tudo que desejares que outrem te faça, faze-lhe também”.
Quem disse isso foi um carpinteiro que passou a vida fazendo o bem e, como retribuição do povo, que curara de suas enfermidades físicas e morais, foi crucificado, mas voltou do Além, dias depois, para lhe dizer: “Os meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem”.

Au revoir!

sábado, 18 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 291 (jÓ)

Nossos corpos, assim como a Terra, são compostos por cerca de 70% d’água.
Eu estava refletindo nisso e nas últimas pesquisas sobre os bons efeitos da água em nosso organismo, quando vi chegar o Bruxo do Cosme Velho. Então, iniciamos o seguinte diálogo sobre a importância da água para o corpo humano:
— Boa noite, Machado, alegria em vê-lo. Que lhe sugere a água como benefício?
— Nada...
— Sugere-lhe nadar?
— Não, Joteli, o que lhe quis dizer é que, no meu estado etéreo, a água serve para nada.
— Pois então vou dizer-lhe tudo que aprendi sobre os benefícios da água no corpo humano, enquanto escravo da matéria. A água é um santo remédio para melhorar nosso humor e memória; ajuda-nos a emagrecer e fornece-nos energia. Ademais, acelera a cura de resfriados, diminui a prisão de ventre e o aparecimento de rugas...
Desse modo, além dos chás, cafezinhos, leite, chocolate e sucos eventuais, devemos tomar, no mínimo, oito copos d’água por dia. Que você pode acrescentar a isso, Bruxo amigo?
— Anote aí, Joteli, minhas dicas para hidratação do organismo físico:
            a) ao levantar-se, cada manhã, beba dois copos d’água para hidratar-se;
            b) de hora em hora, um copo d’água tudo melhora;
            c) antes da refeição, um copo d’água ajuda a digestão;
d) se cansado de água natural, tome água com sabor ou mineral;
e) jiló, melão, cereja, abacaxi... contêm alto teor de H2O;
f) antes da malhação, refrigerantes e cafés não... isso provoca diurese e diminui sua hidratação;
g) beba água de coco antes de se exercitar;
h) leve um litro de água e beba-a aos poucos;
i) tome mais água de coco quando tudo terminar;
j) e, para concluir, tome dois copos d’água antes de dormir...
Assim que Machado concluiu suas dicas rimadas, lembrou-me Guilherme Arantes cantando seu grande sucesso intitulado Planeta Água. Então, leitor amigo, clique aqui, veja as belas imagens e ouça o som: https://www.youtube.com/watch?v=oPwnAq2xMUg.
Esse belíssimo vídeo, postado no YouTube, foi realizado pela profª Delzi para o trabalho da Expo 2008, da Escola Novo Horizonte.
Parabéns, professora! É de profissionais do ensino como a senhora que precisamos, além de muita água.









sábado, 11 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 290 (Jó)

            Ontem à noite, fui visitado por Machado de Assis, que me disse o seguinte:
            — Sabe, Joteli, meu maior tesouro é a criatividade. Com esta, colaborou meu prazer de ler. Na juventude, lia tudo que havia lá em casa, como o Almanaque Laemmertz, assinado por papai e a Bíblia. Devido a problemas financeiros e doenças familiares, não pude frequentar regularmente a escola. Desse modo, aprendi a ler e escrever até os dez anos, quando deixei o banco escolar e me tornei autodidata.
            Minha melhor professora, até 18 de janeiro de 1849, foi minha mãezinha querida, que faleceu, nessa data, aos 36 anos. Também nessa época, eu completaria dez anos em 21 de junho, e ela sempre lera para mim, até eu aprender a ler e escrever. Desde então, com o que me ensinou mamãe e os poucos anos de minha frequência à escola primária, eu já lia e escrevia razoavelmente, embora ainda trocasse os pronomes...
            Como forma de gratidão à mãe amada e em honra à sua memória, decidi que seria poeta, pois naquele tempo esse dom era tido em alto prestígio.
            Foi assim que, dali em diante, passei a exercitar a poesia e enviar meus primeiros rabiscos para os jornaizinhos da cidade. Nos anos seguintes, aprendi tipografia com Paula Brito, em sua tipografia chamada Dois de Setembro, onde passei a trabalhar.
            Brito foi outro autodidata empreendedor e ombro amigo que me permitiu, em sua modesta empresa, construir as bases intelectuais para no futuro tornar-me conhecido nas rodas sociais literárias. Ali nascia o “poeta Machadinho”...
            Os meus primeiros versos, entretanto, publicados em jornal quando eu tinha quinze anos, foram ridicularizados por meus biógrafos, como é o caso do soneto que escrevi em homenagem a uma vizinha, no qual eu “assassinava” a “última flor do Lácio”.
            — Quando foi isso e como se chamava o periódico que o incentivou com a publicação desse seu rabisco, meu caro Machado?
            — Isso ocorreu em 3 de outubro de 1854, e o jornal era o Periódico dos Pobres. Não ria, Joteli, foi assim mesmo o início de minha jornada... como prosador, pois como disse Manuel Bandeira, apenas uma dúzia de meus poemas futuros poderiam ser considerados bons, além do soneto À Carolina.
            — Creio que você esteja sendo modesto, amigo Bruxo. Escreva para nós o poema inaugurador de sua produção literária.
            — Vá lá, mesmo porque nada mais tenho a perder, além do corpo físico que já as traças consumiram... Quem sabe isso não incentive outros jovens, que ignoram seu potencial inato, a gostar de ler e escrever...
            É um soneto sem título e com a seguinte dedicatória: “À Ilma. Sra. D. P. J. A.”. Ao leitor pouco familiarizado com a gramática, destaco em itálico, para sua identificação, além do erro de concordância na primeira estrofe (virtudes que fazem [...] e faz [...]) e das trocas incorretas do pronome pela mudança brusca, na última estrofe do poema,  da segunda pessoa do plural para a segunda do singular:

Quem pode em um momento descrever
Tantas virtudes de que sois dotada
Que fazem dos viventes ser amada
Que mesmo em vida faz de amor morrer!

O gênio que vos faz enobrecer,
Virtude e graça de que sois c’oroada,
Vos fazem do esposo ser amada.
(Quanto é doce no mundo tal viver!)

A natureza nessa obra primorosa,
Obra que dentre todas as mais brilha,
Ostenta-se brilhante e majestosa!

Vós sois de vossa mãe a cara filha,
Do esposo feliz a grata esposa,
Todos os dotes tens, ó Petronilha!

            — Quá, quá, quá, quá... Esse poema  lembra-me uma frase de Thomas Édson,  Machado.
            — Qual frase, Joteli?
            — A de que o gênio é fruto de noventa e nove por cento de transpiração e apenas um por cento de inspiração.  Soube que você foi “rato de biblioteca” e leu, não somente obras dos maiores poetas e escritores brasileiros e portugueses, como também de ingleses, franceses, italianos e espanhóis. Mas, apenas para matar a minha e a curiosidade do leitor, diga-nos os títulos dos seus poemas, além do soneto À Carolina, que já transcrevemos em passada crônica, tidos por Manuel Bandeira como dos mais belos já escritos.
            — Embora o ditado popular reze que “gosto não se discute”, se o gosto é de um poeta de primeira linha como o Bandeira, creio merecer algum valor os seguintes poemas, que o leitor pode ler na internet: O Desfecho, Círculo Vicioso, Uma Criatura, A Artur de Oliveira Enfermo, Mundo Interior, O Corvo, Suave Mari Magno, A Mosca Azul, Spinoza, Soneto de Natal e No Alto.
            — Não seja modesto, Machado, esses poemas não são para “merecer algum valor”; são lindos, perfeitos. Eles provam que, se gostamos de ler, nossa mente abre-se a horizontes fantásticos.
            — Isso é verdade... Creio ter sido Einstein que disse isto: “A mente que se abre a uma nova ideia jamais volta ao seu tamanho original”. Assim sendo, Joteli, quanto mais leitura, mais mente aberta a novas ideias e menos intolerância aos que não pensam como nós.
            — Como não podia deixar de ser, Bruxo, sua frase é para nos fazer refletir...





sábado, 4 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 289 (jÓ)


— Sim, Joteli, agora lhe contarei outra história mal justificada... É o caso do técnico que foi chamado para consertar um computador defeituoso de determinada empresa e cobrou um valor muito alto pelo seu conserto, valendo a pena comprar outra máquina em vez de consertar a defeituosa.
            A simples troca de um parafusinho fez o computador voltar a funcionar. Terminado o serviço, ante o preço escorchante cobrado, a gerência da empresa questionou o técnico desta forma:
            — Tudo isto só pela troca de um parafuso do computador?
            E foi-lhe respondido o seguinte:
            — Pela troca do parafuso, o custo é de um por cento do valor cobrado, mas pelos conhecimentos técnicos para saber qual peça precisava ser trocada, mais 99 por cento...
            — Essa história é ridícula, Machado, com todo o meu respeito à competência do profissional, o que ele fez é estelionato...
            — Também penso assim, Joteli, mas nesta época materialista, qualquer explicação serve para tentar justificar uma ação má. Nem todo o mundo conhece seus direitos...
            — O que acabo de ouvir está relacionado à hipocrisia. E a humildade, Bruxo?...
            — Nessa grande empresa, vagara o cargo de diretor-geral, em virtude da renúncia do então ocupante da função. Muitos ambicionavam esse posto, mas para tal desiderato era preciso aprovar, em eleição, alguém de alto saber, aliado à boa convivência, dedicação extrema e muita cordialidade. Também, ali, criticava-se muito o orgulho... alheio.
            Um dos postulantes ao cargo, pessoa de vastos conhecimentos, demonstrara aos funcionários da empresa sua competência, dedicação e humildade tão acentuadas, que não houve quem contestasse sua eleição para o cargo vago. Tão logo foi satisfeito seu desejo, essa pessoa passou a dedicar-se diuturnamente à elevação do conceito da empresa na cidade.
            Mas teve um porém...
            — Que porém, Machado?
            — Não mais conseguindo ocultar seu desejo íntimo de mudança na empresa, contrário ao de todos os seus diretores veteranos, tentou impor sua vontade sem qualquer justificativa plausível. Ainda mais, teve a infelicidade de dizer a um de seus funcionários, muito influente, o seguinte: “Agora vocês vão saber quem sou eu...” Caiu a máscara. A falsa virtude ruiu e, com ela, foi também ao chão o diretor-geral daquela empresa, que não foi reeleito para a gestão seguinte.
            Moral da história: humildade é algo que precisamos cultivar sempre e não por conveniência pessoal. Antes de recomendá-la a outrem, é preciso refletir se nossos próprios atos são coerentes com essa virtude.
            Por fim, não se esqueça disto, Joteli: quem é humilde é simples, mas não simplório e nem hipócrita.
            Adiós!



terça-feira, 31 de outubro de 2017


Em dia com o Machado 288 (jÓ)

Amigo Joteli, vou contar-lhe uma história, muito repetida por tolos, que não gostam ou não tiveram oportunidade de estudar, quando encontram outro tolo um pouco mais letrado que eles, como você, por exemplo. Ei-la:
            Havia um barqueiro que atravessava as pessoas de uma margem a outra de rio muito largo e fundo, o qual, certo dia, transportava um advogado metido a sabido.
 Em determinado momento, o rábula perguntou-lhe:
  — Amigo, você sabe ler e escrever?
  — Não, dotô, sou anarfabeto. Respondeu-lhe o barqueiro.
  — Que pena! você perdeu metade da sua vida.
Nisso, uma onda mais forte virou o barco, e o barqueiro perguntou ao advogado:
  — Dotô, o sinhô sabe nadar?
              Desesperado, pouco antes de se afogar, o advogado respondeu-lhe:
  — Não... glub, glub, glub...
  — Qui pena, dotô, o sinhô perdeu a vida intera. E deixou-o morrer...
            Com todo o respeito às pessoas simples que, muitas vezes, arremetem essa história contra os que têm algum conhecimento, tal aleivosia demonstra, principalmente, impiedade e sadismo. Por si só, essa história não justifica a afirmativa de que “não há saberes melhores, mas, sim, diferentes”. Ora, se por algum motivo o advogado não aprendera nadar, o dever do barqueiro era esforçar-se para não o deixar morrer afogado. Sua omissão foi criminosa!
            Nesse momento, o amigo leitor pode apoiar a conduta do barqueiro por este ter sido humilhado etc. Mas a questão aqui é outra: inda que o advogado quisesse menosprezar o barqueiro, se este houvesse manifestado desejo de aprender a ler e escrever, aquele teria plenas condições intelectuais para socorrê-lo em sua ignorância; entretanto, à vítima não foi dada oportunidade de salvação no momento de seu naufrágio.
            Pior que humilhação, isso é crueldade, vingança torpe contra a classe intelectual da sociedade, pelo tratamento econômico e elitista discrepantes que há entre os operários e os doutos. Mas pode ser também que o remador tenha optado por continuar sua vida simples, mas cômoda, e nunca haja manifestado interesse em aprender a ler e escrever.
            — Amigo Machado, o que me causa indignação, como cidadão brasileiro, é observar a absurda diferença entre os rendimentos do humilde barqueiro e os do orgulhoso advogado. Nesse sentido, nossa Carta Magna também morreu afogada pelos legisladores.
            Nela, prevê-se uma série de direitos ao cidadão que na vida prática não vêm sendo contemplados. Há imensa disparidade entre o que ganham uns em relação à maioria dos servidores públicos e particulares de profissões consideradas desprezíveis no Brasil.
            — Perfeitamente, Joteli. Na próxima semana, contarei outra história mal contada, nas rodas populares, que nos demonstra a hipocrisia de algumas pessoas que se fazem de palmatória do mundo, mas não veem o próprio umbigo.

            — É verdade, Bruxo. Deles, já dizia Jesus: “Veem um cisco no olho do vizinho, mas não retiram a trave dos seus olhos”.

  Quando o texto é escorreito (Irmão Jó)   Atento à escrita correta É o olho do revisor, Mas pôr tudo em linha certa É com o diagramador.   ...