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sábado, 25 de novembro de 2017




Em dia com o Machado 292 (jÓ)


Amigo Jó, vou contar-lhe uma história simples, que exemplifica como funciona a Lei Divina de ação e reação. Você verá que essa Lei independe de qualquer sentimento pessoal de revide a uma maldade que nos seja feita por alguém, seja esse mal decorrente de sua ação ou omissão.
Já lhe contei aqui o caso envolvendo dois amigos de juventude, quando ambos moravam no Rio de Janeiro e um deles era soldado do Exército? Se não o fiz, faço-o agora. Se já o fiz, faço-o novamente. E a culpa é de minha fraca memória.
Etiel, o militar, era um dos sete filhos órfãos de pai, de família muito humilde e, ainda assim, solidária com outras pessoas também carentes economicamente. Por esse motivo, e por não ter tido oportunidade de concluir seus estudos do antigo segundo grau, atual ensino médio, após um tempo de trabalho no comércio, nosso amigo foi recrutado...
Serviu no Exército quando os militares, como bons guardiães da pátria, suspeitavam que todo cidadão menos bitolado ou mais letrado que outros era tido por suspeito de traição ao Brasil. Mas também o amor à pátria e a honestidade no trato com as coisas públicas eram fundamentais. Tanto foi assim que um dos lemas da época era: “Brasil, ame-o ou deixe-o”.
A organização militar em que Etiel incorporou, já o dissemos aqui, era comandada por um dos mais rígidos generais da época, cujo nome não vem ao caso citar. O que lembramos era a função da polícia do Exército (PE) que, não tendo bandidos assassinos de policiais, como atualmente, para prender, ufanava-se de fiscalizar e encarcerar recrutas moradores de favelas, em sua maioria, por coisas mínimas, como as que gosto de catar e citar em meus escritos.
Desse modo, muitas vezes, sem mais nem menos, alguns dos cidadãos que não tinham muitas opções profissionais, a não ser ingressar na carreira militar, acabavam indo fazer uma “visita” ao Batalhão da Polícia do Exército (BPEx), como foi o caso de meu amigo, quando seu cinto era sujado por alguns dos soldados brincalhões desse batalhão. Ali ficava algumas horas em fila e, por vezes, em posição de sentido, até que anotassem seu nome, identidade, unidade militar e fosse liberado...
Enquanto um chora, outro ri. É a lei do mundo, meu caro Joteli. É a perfeição do universo. Tudo chorando seria monótono. Tudo rindo, seria cansativo; mas uma boa distribuição de lágrimas e valsas, soluços e danças traz à alma do povo a variedade necessária e o equilíbrio da vida está feito. Se a infração fosse considerada grave, como a de agressão a um dos soldados da PE, o infrator poderia ficar detido no batalhão e só seria liberado alguns dias depois, para se apresentar ao comandante do seu quartel e ficar mais algum tempo preso...
Andar na rua sem a farda no corpo, nem pensar. Diariamente, tinham de ir para seus quartéis com o fardamento engomado e passado, além do cinto limpo com Kaol e os sapatos engraxados, barba feita e cabelos cortados. Como era lindo o metal da fivela do cinto, brilhava tanto, quando bem limpo, que até parecia ouro. Isso demonstra quanto eram amados... Cinto limpo era a ilusão do ouro, cinto sujo era a demonstração da falta de gratidão a tão paternais superiores hierárquicos, que lhes concediam a ilusão de ser gente.
— E aonde vai a lei de ação e reação nessa história, meu caro Bruxo?
— Aqui: Etiel gostava muito de uma jaqueta verde-oliva muito elegante, que fazia parte do seu uniforme militar, com previsão de uso para dias frios. Como morava perto da Igreja da Penha e, no início da ladeira que dava acesso a sua casa, havia um parque de diversões, certo domingo, os dois amigos resolveram ir passear ali. Julgando-se livre da vigilância dos soldados da PE, Etiel resolveu, naquela noite fria, usar a jaqueta.
Após passearem pelo parque, os amigos pararam em frente a um estande de tiro ao alvo com espingarda de rolha e pressão de ar. De repente, dois soldados da PE, cada um deles com quase dois metros de altura, abordaram Etiel. Então, um deles perguntou ao meu franzino amigo, vinte centímetros mais baixo: “Quem lhe autorizou usar essa jaqueta?”
Ao ouvir isso, o amigo de Etiel saiu de fininho e desapareceu no meio dos frequentadores do parque, deixando-o à mercê dos seus algozes que, se fossem assaltantes, teriam feito o que quisessem com meu amigo.
Mas foi só um susto...
Após ser advertido, Etiel foi deixado à vontade pelos “policiais”, que lhe “recomendaram” tirar a jaqueta e não mais a usar sem a farda.
Vinte anos depois, Etiel foi visitado, em Brasília, por aquele quase irmão, acolhido em seu lar durante longos anos... Agora comerciante bem-sucedido, o amigo de Etiel foi com este ao Setor Comercial Sul (SCS), onde pretendia sacar dinheiro para umas compras que faria no Paraguai. Chegando ao SCS, foi o amigo que pediu a Etiel para aguardá-lo em frente a uma loja mais afastada, enquanto ele iria ao banco...
Cerca de meia hora depois, pálido como cera, o amigo chegou e disse-lhe que, ao sair do banco, fora abordado por dois assaltantes.  Estes encostaram-no num muro e, enfiando as mãos em seus bolsos da calça, roubaram-lhe o dinheiro que ali estava.
Penalizado, Etiel ouviu o amigo explicar-lhe que, por sorte, a outra metade do dinheiro sacado ficara no bolso traseiro da calça, e os ladrões não o viram. Somente então meu amigo lembrou-se do ocorrido vinte anos atrás, no parque da Penha, no Rio de Janeiro.
Assim, fica a lição: “Tudo que desejares que outrem te faça, faze-lhe também”.
Quem disse isso foi um carpinteiro que passou a vida fazendo o bem e, como retribuição do povo, que curara de suas enfermidades físicas e morais, foi crucificado, mas voltou do Além, dias depois, para lhe dizer: “Os meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem”.

Au revoir!

sábado, 18 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 291 (jÓ)

Nossos corpos, assim como a Terra, são compostos por cerca de 70% d’água.
Eu estava refletindo nisso e nas últimas pesquisas sobre os bons efeitos da água em nosso organismo, quando vi chegar o Bruxo do Cosme Velho. Então, iniciamos o seguinte diálogo sobre a importância da água para o corpo humano:
— Boa noite, Machado, alegria em vê-lo. Que lhe sugere a água como benefício?
— Nada...
— Sugere-lhe nadar?
— Não, Joteli, o que lhe quis dizer é que, no meu estado etéreo, a água serve para nada.
— Pois então vou dizer-lhe tudo que aprendi sobre os benefícios da água no corpo humano, enquanto escravo da matéria. A água é um santo remédio para melhorar nosso humor e memória; ajuda-nos a emagrecer e fornece-nos energia. Ademais, acelera a cura de resfriados, diminui a prisão de ventre e o aparecimento de rugas...
Desse modo, além dos chás, cafezinhos, leite, chocolate e sucos eventuais, devemos tomar, no mínimo, oito copos d’água por dia. Que você pode acrescentar a isso, Bruxo amigo?
— Anote aí, Joteli, minhas dicas para hidratação do organismo físico:
            a) ao levantar-se, cada manhã, beba dois copos d’água para hidratar-se;
            b) de hora em hora, um copo d’água tudo melhora;
            c) antes da refeição, um copo d’água ajuda a digestão;
d) se cansado de água natural, tome água com sabor ou mineral;
e) jiló, melão, cereja, abacaxi... contêm alto teor de H2O;
f) antes da malhação, refrigerantes e cafés não... isso provoca diurese e diminui sua hidratação;
g) beba água de coco antes de se exercitar;
h) leve um litro de água e beba-a aos poucos;
i) tome mais água de coco quando tudo terminar;
j) e, para concluir, tome dois copos d’água antes de dormir...
Assim que Machado concluiu suas dicas rimadas, lembrou-me Guilherme Arantes cantando seu grande sucesso intitulado Planeta Água. Então, leitor amigo, clique aqui, veja as belas imagens e ouça o som: https://www.youtube.com/watch?v=oPwnAq2xMUg.
Esse belíssimo vídeo, postado no YouTube, foi realizado pela profª Delzi para o trabalho da Expo 2008, da Escola Novo Horizonte.
Parabéns, professora! É de profissionais do ensino como a senhora que precisamos, além de muita água.









sábado, 11 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 290 (Jó)

            Ontem à noite, fui visitado por Machado de Assis, que me disse o seguinte:
            — Sabe, Joteli, meu maior tesouro é a criatividade. Com esta, colaborou meu prazer de ler. Na juventude, lia tudo que havia lá em casa, como o Almanaque Laemmertz, assinado por papai e a Bíblia. Devido a problemas financeiros e doenças familiares, não pude frequentar regularmente a escola. Desse modo, aprendi a ler e escrever até os dez anos, quando deixei o banco escolar e me tornei autodidata.
            Minha melhor professora, até 18 de janeiro de 1849, foi minha mãezinha querida, que faleceu, nessa data, aos 36 anos. Também nessa época, eu completaria dez anos em 21 de junho, e ela sempre lera para mim, até eu aprender a ler e escrever. Desde então, com o que me ensinou mamãe e os poucos anos de minha frequência à escola primária, eu já lia e escrevia razoavelmente, embora ainda trocasse os pronomes...
            Como forma de gratidão à mãe amada e em honra à sua memória, decidi que seria poeta, pois naquele tempo esse dom era tido em alto prestígio.
            Foi assim que, dali em diante, passei a exercitar a poesia e enviar meus primeiros rabiscos para os jornaizinhos da cidade. Nos anos seguintes, aprendi tipografia com Paula Brito, em sua tipografia chamada Dois de Setembro, onde passei a trabalhar.
            Brito foi outro autodidata empreendedor e ombro amigo que me permitiu, em sua modesta empresa, construir as bases intelectuais para no futuro tornar-me conhecido nas rodas sociais literárias. Ali nascia o “poeta Machadinho”...
            Os meus primeiros versos, entretanto, publicados em jornal quando eu tinha quinze anos, foram ridicularizados por meus biógrafos, como é o caso do soneto que escrevi em homenagem a uma vizinha, no qual eu “assassinava” a “última flor do Lácio”.
            — Quando foi isso e como se chamava o periódico que o incentivou com a publicação desse seu rabisco, meu caro Machado?
            — Isso ocorreu em 3 de outubro de 1854, e o jornal era o Periódico dos Pobres. Não ria, Joteli, foi assim mesmo o início de minha jornada... como prosador, pois como disse Manuel Bandeira, apenas uma dúzia de meus poemas futuros poderiam ser considerados bons, além do soneto À Carolina.
            — Creio que você esteja sendo modesto, amigo Bruxo. Escreva para nós o poema inaugurador de sua produção literária.
            — Vá lá, mesmo porque nada mais tenho a perder, além do corpo físico que já as traças consumiram... Quem sabe isso não incentive outros jovens, que ignoram seu potencial inato, a gostar de ler e escrever...
            É um soneto sem título e com a seguinte dedicatória: “À Ilma. Sra. D. P. J. A.”. Ao leitor pouco familiarizado com a gramática, destaco em itálico, para sua identificação, além do erro de concordância na primeira estrofe (virtudes que fazem [...] e faz [...]) e das trocas incorretas do pronome pela mudança brusca, na última estrofe do poema,  da segunda pessoa do plural para a segunda do singular:

Quem pode em um momento descrever
Tantas virtudes de que sois dotada
Que fazem dos viventes ser amada
Que mesmo em vida faz de amor morrer!

O gênio que vos faz enobrecer,
Virtude e graça de que sois c’oroada,
Vos fazem do esposo ser amada.
(Quanto é doce no mundo tal viver!)

A natureza nessa obra primorosa,
Obra que dentre todas as mais brilha,
Ostenta-se brilhante e majestosa!

Vós sois de vossa mãe a cara filha,
Do esposo feliz a grata esposa,
Todos os dotes tens, ó Petronilha!

            — Quá, quá, quá, quá... Esse poema  lembra-me uma frase de Thomas Édson,  Machado.
            — Qual frase, Joteli?
            — A de que o gênio é fruto de noventa e nove por cento de transpiração e apenas um por cento de inspiração.  Soube que você foi “rato de biblioteca” e leu, não somente obras dos maiores poetas e escritores brasileiros e portugueses, como também de ingleses, franceses, italianos e espanhóis. Mas, apenas para matar a minha e a curiosidade do leitor, diga-nos os títulos dos seus poemas, além do soneto À Carolina, que já transcrevemos em passada crônica, tidos por Manuel Bandeira como dos mais belos já escritos.
            — Embora o ditado popular reze que “gosto não se discute”, se o gosto é de um poeta de primeira linha como o Bandeira, creio merecer algum valor os seguintes poemas, que o leitor pode ler na internet: O Desfecho, Círculo Vicioso, Uma Criatura, A Artur de Oliveira Enfermo, Mundo Interior, O Corvo, Suave Mari Magno, A Mosca Azul, Spinoza, Soneto de Natal e No Alto.
            — Não seja modesto, Machado, esses poemas não são para “merecer algum valor”; são lindos, perfeitos. Eles provam que, se gostamos de ler, nossa mente abre-se a horizontes fantásticos.
            — Isso é verdade... Creio ter sido Einstein que disse isto: “A mente que se abre a uma nova ideia jamais volta ao seu tamanho original”. Assim sendo, Joteli, quanto mais leitura, mais mente aberta a novas ideias e menos intolerância aos que não pensam como nós.
            — Como não podia deixar de ser, Bruxo, sua frase é para nos fazer refletir...





sábado, 4 de novembro de 2017



Em dia com o Machado 289 (jÓ)


— Sim, Joteli, agora lhe contarei outra história mal justificada... É o caso do técnico que foi chamado para consertar um computador defeituoso de determinada empresa e cobrou um valor muito alto pelo seu conserto, valendo a pena comprar outra máquina em vez de consertar a defeituosa.
            A simples troca de um parafusinho fez o computador voltar a funcionar. Terminado o serviço, ante o preço escorchante cobrado, a gerência da empresa questionou o técnico desta forma:
            — Tudo isto só pela troca de um parafuso do computador?
            E foi-lhe respondido o seguinte:
            — Pela troca do parafuso, o custo é de um por cento do valor cobrado, mas pelos conhecimentos técnicos para saber qual peça precisava ser trocada, mais 99 por cento...
            — Essa história é ridícula, Machado, com todo o meu respeito à competência do profissional, o que ele fez é estelionato...
            — Também penso assim, Joteli, mas nesta época materialista, qualquer explicação serve para tentar justificar uma ação má. Nem todo o mundo conhece seus direitos...
            — O que acabo de ouvir está relacionado à hipocrisia. E a humildade, Bruxo?...
            — Nessa grande empresa, vagara o cargo de diretor-geral, em virtude da renúncia do então ocupante da função. Muitos ambicionavam esse posto, mas para tal desiderato era preciso aprovar, em eleição, alguém de alto saber, aliado à boa convivência, dedicação extrema e muita cordialidade. Também, ali, criticava-se muito o orgulho... alheio.
            Um dos postulantes ao cargo, pessoa de vastos conhecimentos, demonstrara aos funcionários da empresa sua competência, dedicação e humildade tão acentuadas, que não houve quem contestasse sua eleição para o cargo vago. Tão logo foi satisfeito seu desejo, essa pessoa passou a dedicar-se diuturnamente à elevação do conceito da empresa na cidade.
            Mas teve um porém...
            — Que porém, Machado?
            — Não mais conseguindo ocultar seu desejo íntimo de mudança na empresa, contrário ao de todos os seus diretores veteranos, tentou impor sua vontade sem qualquer justificativa plausível. Ainda mais, teve a infelicidade de dizer a um de seus funcionários, muito influente, o seguinte: “Agora vocês vão saber quem sou eu...” Caiu a máscara. A falsa virtude ruiu e, com ela, foi também ao chão o diretor-geral daquela empresa, que não foi reeleito para a gestão seguinte.
            Moral da história: humildade é algo que precisamos cultivar sempre e não por conveniência pessoal. Antes de recomendá-la a outrem, é preciso refletir se nossos próprios atos são coerentes com essa virtude.
            Por fim, não se esqueça disto, Joteli: quem é humilde é simples, mas não simplório e nem hipócrita.
            Adiós!



  Dia do Índio?  (Irmão Jó) Quando Cabral chegou neste país, quem dominava a terra eram tupis; Mas não havia autoridade aqui, predominava a ...