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terça-feira, 1 de setembro de 2015


Em dia com o Machado 173 (jlo)

5 ¹ E o profeta, vendo a multidão que se manifestava pacificamente, nas grandes cidades brasileiras, subiu ao palanque em Brasília. E, sem se sentar, aproximou-se de estranho boneco com roupa de presidiário e dois números desconhecidos:13 e 171;
² E, abrindo a sua boca, dizia, em alto e bom som, de um alto-falante:
³ Mal-aventurados os que tentam enganar o povo, porque deles é o fogo do inferno;
Mal-aventurados os que riem da desgraça popular causada por eles, porque serão desgraçados;
Mal-aventurados os raivosos e enfurecidos, porque eles serão expulsos da terra que não lhes pertence;
6 Mal-aventurados os que são corruptos e roubam nossas riquezas, porque eles serão presos;
7 Mal-aventurados os ímpios, porque eles serão tratados com impiedade;
8 Mal-aventurados os sujos de coração, porque eles verão os espíritos das trevas;
9 Mal-aventurados os que incentivam a guerra, porque eles serão trucidados;
10 Mal-aventurados os que tentam torcer a justiça, porque eles ficarão tortos;
11 Mal-aventurados sois vós, quando vos desmascararem e lançarem nas celas pútridas das prisões brasileiras e, dizendo a verdade, vos responsabilizarem por todo o mal que fizestes contra a causa do bem, da justiça e da honestidade;
12 Chorai e entristecei-vos, porque é pequena a vossa alma, e nada vale a pena, quando a alma é pequena.
E nada mais disse o profeta, mas o povo passou a gritar:
— Fora, bandidos, abaixo a corrupção do 13 e o estelionato do 171! Queremos um país livre de ladrões, criminosos, estelionatários, aliciadores e exploradores do povo!
Nesse instante, uma bandeira gigante foi estendida e carregada pelos manifestantes, que diziam em voz alta:
— Nossa bandeira não possui a cor do sangue e, sim, o verde da esperança, o azul do céu, o amarelo dos nossos ricos minérios e o branco da paz.
Por fim, o povaréu gritou:
— Somos mansos e pacíficos, mas não somos covardes! Esses políticos que aí estão não nos representam. Queremos a intervenção constitucional pelo poder constituinte do povo!
Depois disso, lentamente, e em silêncio, a população voltou para suas casas...
Só sobrou o profeta, que sacou de sua viola, tocou e cantou:

E agora, José?

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?

e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?


Está sem mulher,
está sem carinho,
está sem discurso,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?


Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia, 
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope
você marcha, José!
José, para onde?

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