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sexta-feira, 30 de junho de 2023

 


O IRMÃO LOBO
 
Na floresta de Gubbio, um lobo se fizera
 Uma espécie de monstro aterrador,
 Mais astuto e mais hábil que uma fera.
 Parecia um terrível salteador,
 Matando qualquer homem desarmado,
 Espalhando pavor e aniquilando o gado...
 Mas, Francisco de Assis foi procurá-lo, um dia,
 E, em plena solidão,
 Ao encontrá-lo, em vasta ramaria,
 Começou a chamá-lo por irmão...
 Em seguida, falou-lhe da bondade,
 Da paz, da caridade, do carinho...
 Pediu-lhe, por Jesus, alterar o caminho
 Em que o pobre animal
 Vivera até então
 E terminou, rogando ao lobo atento
 Fosse morar com ele no convento
 E a fera obedeceu,
 Sem demonstrar qualquer hesitação.
 
 Seguindo o Irmão Francisco, achou-se em novo lar,
 E, ao mudar de atitude, entregou-se, feliz,
 No trabalho do bem, nas tarefas de Assis.
 Era um guarda-noturno dos melhores
 E, carregando um cesto aos dentes,
 Buscava pães nos arredores.
 
 Mas o chefe ocupado, muitas vezes,
 Por semanas ou meses,
 Ausentava-se em serviço,
 Quase sempre reunido a frei Leão,
 Saía em sacrifício e peregrinação,
 A fim de semear o ensino do Senhor,
 Atento a inolvidável compromisso.
 
 Nessas ocasiões,
 O irmão Lobo sentia
 A carência de amor
 E a fome de alegria.
 Longe do Irmão Francisco, em todas as estradas
 Era seguido a insultos e pedradas...
 Mesmo entre os servidores do convento
 Sofria ele o impacto violento
 De varadas cruéis...
 Chamavam-no "covarde", "lobo vil",
 "Carniceiro feroz..."
 E de tanto aguentar o tratamento hostil,
 Vendo-se, um dia, a sós,
 O Irmão Lobo voltou para a vida selvagem,
 Na antiga sede de carnagem;
 Tornando à condição a que dantes se dera
 Nos instintos de fera...
 
 Voltando o Irmão Francisco
 À morada de amor que presidia,
 Depois de longa ausência,
 Teve notícia da ocorrência
 Mas, embora cansado
 E prematuramente envelhecido,
 A lastimar o acontecido,
 Ante as muitas saudades do animal,
 Embrenhou-se no verde da floresta...
 E reencontrou o Irmão Lobo, como em festa
 Na vastidão da natureza,
 Perseguindo, sem pausa, uma lebre indefesa.
 
 — "Irmão lobo, o que é isto?"
 Disse o recém-chegado.
 — "Já não te lembras mais dos ensinos de Cristo?"
 
 O lobo veio a ele, abatido e humilhado,
 E respondeu, tristonho:
 "Santo amigo, não pude suportar
 As dores que sofria em vossa ausência,
 Acreditei que o vosso sonho
 Fosse uma realidade na existência,
 Mas tenho ainda as marcas doloridas
 De profundas feridas
 Que os homens me fizeram...
 Toda vez que deixáveis nossa casa
 Tratavam-me com vara, pedra e brasa...
 Não vi qualquer pessoa a não ser vós
 Nos ensinos sagrados
 Que trazeis a nós...
 Deixai-me, santo amigo,
 Sou lobo, apenas lobo no serrado,
 Fera solta nas trilhas em que sigo."
 
 Francisco, então, enfermo e fatigado,
 Replicou-lhe, porém:
 — "Irmão lobo, recorda!... O caminho do bem
 É aquele de Jesus...
 Devemos aceitar a própria cruz...
 Recorda as instruções que estudaste comigo,
 Sentença por sentença!
 Deixe que eu te interprete:
 A lei é perdoar setenta vezes sete
 Qualquer ofensa recebida...
 A presença de Cristo é o sol de nossa vida...
 Volta, comigo, irmão,
 Eu também, já sofri calúnia, provação...
 Sinto-me fatigado,
 Mas a fé no Senhor é uma luz em meu peito,
 Continua, irmão Lobo, de meu lado,
 Resguarda-me, com Deus, na pedra
 Em que me deito...
 Necessito de ti na casa de onde venho,
 As tuas grandes cicatrizes
 Dos momentos que julgas infelizes
 São feridas irmãs das úlceras que eu tenho!..."
 O lobo cabisbaixo acompanhou o amigo,
 Fez-se-lhe guardião na aspereza do abrigo,
 Onde Francisco, dantes forte,
 Pôs-se em chaga e oração
 Para aguardar a morte...
 
 Finda aquela existência engrandecida e bela,
 O Irmão Lobo fugiu para um bosque vizinho,
 Algo desatinado,
 Como alguém que se vê desamparado
 Sem rumo e sem caminho,
 Em súbita carreira...
 Ouvido no convento
 Notou-se que ele uivava a noite inteira;
 E porque se calara, de repente,
 Quando o Sol regressou, resplandecente,
 Um irmão de Francisco foi à mata,
 Decidido a trazê-lo,
 No máximo de zelo,
 Para a vida de paz, de serviço e conforto...
 Mas, surpreso, encontrou nas pedras do serrado
 Um corpo de animal abandonado:
 O lobo de Francisco estava morto.
 
DOLORES, Maria; MEIMEI. (Espíritos). Somente amor. 1. ed. – Impressão pequenas tiragens. Brasília: FEB; São Paulo: IDEAL, 2022.


quinta-feira, 29 de junho de 2023


 
LEGENDA SUBLIME
 
Alma querida, na Terra,
Se alguma prova te alcança,
Não te percas de esperança,
— Luz da fé sempre a brilhar...
Nas crises mais dolorosas,
feitas de dores extremas,
Nunca te aflijas. Não temas,
Nem deixes de confiar.
 
Se o pessimismo aparece,
Mostrando trevas e males,
Nada comentes, nem fales
Fora da crença no Bem;
Pensa em Deus, lembrando o Sol
Que, em tudo, acalenta a vida,
Do sábio à erva escondida,
Sem menosprezo a ninguém.
 
Nas mágoas, nos desenganos,
Nos desgostos, nas doenças,
Nas horas duras ou tensas,
Em que te dás ao dever;
Na menor tribulação,
Muito mais que se imagina
A Providência Divina
É luz a te socorrer.
 
Se sofres, não esmoreças,
Trabalha e serve, alma boa,
Seja onde for, abençoa
Ao lutas em derredor;
Na alegria ou no infortúnio,
Guarda na fé que te anime
Esta legenda sublime:
— Deus nos dá sempre o melhor.
 
DOLORES, Maria (Espírito). Coração e vida. Psicog. Chico Xavier. Brasília: FEB: São Paulo, SP: IDEAL, 2022
.

 


quarta-feira, 28 de junho de 2023

 


 DEPRESSÃO
 
 Dizes que sofres angústias
 Até mesmo quando em casa,
 Que a tua dor extravasa
 Nas cinzas da depressão.
 Que não suportas a vida,
 Nem te desgarras do tédio,
 O fantasma, em cujo assédio
 Afirma que tudo é vão.
 
 Perto da rua em que moras
 Há uma viúva esquecida,
 Guarda a avó quase sem vida
 E três filhinhos no lar;
 Doente, serve em hotel,
 Trabalha na rouparia,
 Busca o pão de cada dia,
 Sem tempo para chorar.
 
 Não longe, triste mulher,
 Num cubículo apertado,
 Chora o esposo assassinado
 Que era guarda de armazém...
 Tem dois filhinhos de colo,
 Por enquanto, ainda não sabe
 O que deve fazer da existência.
 Espera pela assistência
 Dos que trabalham no bem.
 
 Um paralítico cego,
 Numa esteira de barbante,
 Implora mais adiante
 Quem lhe dê água a beber...
 Ninguém atende... Ele grita,
 Na penúria que o consome,
 Tem sede e febre, tem fome,
 Sobretudo quer morrer.
 
 Depressão? Alma querida,
 Se tens apenas tristeza,
 Se te sentes indefesa,
 Contra mágoa e dissabor,
 Sai de ti mesma e auxilia
 Aos que mais sofrem na estrada
 A depressão é curada
 Pelo trabalho do amor.
 
                        ***
 
“Em toda a parte estão os agentes da Luz,
 Acrescentando paz às  Bênçãos de Jesus”.
DOLORES, Maria (Espírito). Dádivas de amor. Psicog. Chico Xavier. 1. ed. Brasília: FEB: São Paulo, SP: IDEAL, 2022.


terça-feira, 27 de junho de 2023

 


VISITA FRATERNA

 
 “Reunião beneficente realizada no salão de festas do Clube Pinheiros, em São Paulo, SP, 26 de agosto de 1984.”
 
Hoje cedo, deixei o meu retiro
E como sempre ocorre, dei-me ao giro
Onde a sombra se espalha e a penúria golpeia...
Descobri, para logo, a caravana
Dos que sofrem no corpo a garra desumana
Da rude provação que os encadeia.
 
Vi tristes mães chorando desprezadas,
Crianças esmolando nas estradas
Um cobertor usado ou a dádiva de um pão,
Velhinhos a tremer na jornada sombria,
Gemendo entre a garoa e a ventania
E os doentes cansados de aflição.
 
Vi mais longe, conquanto em outros lados,
Pobres irmãos erguendo os punhos revoltados
E a brandirem na terra estranho açoite...
Era a equipe da incompreensão que ainda não dorme
Alimentando, a desespero enorme,
Pensamentos da guerra, dia e noite!...
 
Então gritei na longa senda escura:
“— O que fazer, Jesus, entre a sombra e a loucura?”
Celeste benfeitor guardou a minha mão...
E, através de viagem curta e leve,
Penetrei na cidade, em tempo breve,
E abracei-vos, feliz, neste nobre salão.
 
O vosso grupo de beneficência
É o socorro à penúria e vacina à violência,
Traduzindo a resposta do Senhor!...
Cooperando no bem, de parcela em parcela,
Anunciais a paz que assim se nos revela
Na bênção de servir pela união no amor.
 
E em prece de louvor, notando-vos o exemplo,
Neste recinto em flor transfigurado em templo,
Ao clarão imortal da fé que nos conduz,
Clamo, perante os Céus, alegre e enternecida!
“— Amados irmãos meus, Deus vos sustente a vida,
Guardando-vos, em paz, nos festivais da luz!...”
 
DOLORES, Maria (Espírito). In: ESPÍRITOS DIVERSOS. Fé e vida. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 1. ed. 1. imp. Brasília: FEB; São Paulo: CEU, 2014.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

 


 

REDENÇÃO E AMOR
 
A polícia chamara a velhinha presente.
Na sala de chefia, estava pouca gente,
Mas, no centro do quadro, uma jovem brilhante,
A quem a fama abrira as portas,
Levantou-se arrogante
E, apontando a senhora,
Que se vestia humildemente,
Falou ao delegado de plantão,
-Esta mulher ai de pernas tortas
Já me esgotou a paciência,
Por favor, excelência,
Exijo que ela seja repreendida,
É uma velha idiota a me arrasar a vida,
Diz ser a minha mãe, andando aqui e ali
Mas sei que minha mãe morreu quando eu nasci...
 
Creio seja a mulher de muita idade
Que mora aos fundos da mansão,
Onde encontrei a minha educação
E onde ela vive pela caridade.
Tenho um nome correto a defender,
Nos clubes, nos jornais,
Afastá-la de mim é apenas meu dever,
Quero que esta gorilha
Não me chame de filha,
Nem me incomode mais.
 
O delegado fita a acusada infeliz,
Que se mostrava pálida e sem jeito,
E indagou a respeito:
— A senhora?... O que diz?
 
A velhinha informou, em tom magoado:
— Peço consentimento,
A fim de esclarecer ao senhor delegado
Que estou viúva, há mais de vinte anos...
Vivi com meu marido poucos dias...
Era ele pintor, lidando em grande altura,
Faleceu ao cair de uma laje insegura,
Fiquei grávida e só, recalcando agonias...
Na condição de lavadeira,
Vivo sempre reclusa
No lar que me albergou a vida inteira,
Onde nasceu a jovem que me acusa;
Ela cresceu, senhor, fez-se forte e instruída,
E agora resolveu mudar a própria vida...
 
A moça aparteou, bradando revoltada:
— É mentira, excelência...Esta velha estouvada
É um caso apenas para sanatório...
 
Antes, porém, que o delegado
Emitisse apressado
Qualquer conceito vexatório,
Ouviu-se o coração materno, conformado:
— Disse toda a verdade, meu senhor,
Esta filha que eu tenho é a linda estrela
De minha estrada dolorosa,
No entanto, se é feliz sem meu amor,
Aceito a acusação de mentirosa
E prometo não mais aborrecê-la.
 
Ambas não mais se viram, frente a frente.
Aquela mãe sem forças, mais doente,
Da Terra desprendeu-se, fatigada...
Mas a filha seguiu por outra estrada.
A borboleta humana embevecida
Quis desfrutar, sem pausa, os prazeres da vida...
E viveu mais dez anos, festa em festa,
De coração afoito e desatento...
Almas lesadas, luto e desalento
Seguiram-lhe, no mundo, a insensatez funesta...
Mas a doença veio e a pobre já não era
A jovem que lembrava a primavera,
A princesa da noite e da ilusão...
Depois de angústia imensa, em longos dias,
Na mais deserta das enfermarias,
A morte situou-se noutras plagas...
 
Ei-la agora na vida diferente...
Sentia-se, em si própria, como em chagas;
Parecia guardar a memória doente
E, acima dos remorsos que trazia,
A dor da triste mãe que desprezara, um dia,
Punha-lhe o coração em fogo lento.
 
Não mais soube contar o dia, a hora,
Porque, perante o Além, na culpa de quem chora
O tempo se transforma em sofrimento...
Meses correram sobre muitos meses,
Via-se em sombra e a sós... No entanto, algumas vezes,
Ouvia vozes perto... Era a doce lembrança
Da meninice longe, entre as bênçãos do lar...
Ternos motes de amor e canções de ninar,
Como notas de paz em brisas de esperança...
 
Passados alguns anos, certo dia,
Enxergou novamente o sol, a natureza...
Pranteia de emoção, embora presa
À luz, à imensa luz que lhe sorria...
 
Eis que alguém lhe aparece...Um anjo de visita
Ou luminoso ser de beleza infinita?
 
Ela chora, a sentir-se envergonhada,
Mas esse alguém lhe fala com ternura:
— Vida de minha vida, filha amada,
A dor é a grande estrada para a Altura,
Quero ver-te, de novo, nos meus braços,
Regressarás à Terra, em minha companhia,
Minha filha de alegria,
Renascerás comigo no futuro...
Filha querida, estrela de meus passos,
Buscaremos, na Terra, as fontes do amor puro...
Como sempre, serás meu sonho e meu encanto,
Filha do coração, tesouro que amo tanto!...
 
Mas a pobre exclamou:— Quem sois vós que falais?
Filha? Fui sempre má, não mereço este nome...
Reneguei minha mãe, o fel que me consome
É o remorso cruel que não se acaba mais...
Quem sois vós que não vedes minha dor
E nem reconheceis a angústia que me leva
A recear a luz e esconder-me na treva?...
Por quem sois, anjo ou luz, uma santa ou uma estrela,
Levai-me à mãe que eu tive, quero vê-la...
Onde está minha mãe, meu refúgio e meu guia?
Somente minha mãe me perdoaria...
 
Mas a nobre entidade apenas respondeu:
— Ouve, filha querida!... A tua mãe sou eu!...
 
DOLORES, Maria (Espírito). Alma e vida. Psicografado por: Francisco Cândido Xavier. São Paulo: Cultura Espírita União, 1984.

sábado, 24 de junho de 2023

 

EM DIA COM O MACHADO 581:

TROPEÇOS LINGUÍSTICOS PARA LAMENTAR SEM JUÍZO (Jó)

 


            — Que Deus nos ajuda a resolver os graves problemas morais desta nação! Assim começa o breve discurso daquele parlamentar, o que é para lamentar. Se ainda fosse “nos acuda”...

            Mas Ele acudiu-o. Enviou-me a esclarecer-lhe que todos os verbos terminados em “ar”, na terceira pessoa do singular do presente do subjuntivo, devem ser flexionados com terminação em “-e”. Exemplos: ajudar, comprar e pensar: Que Deus (ele) nos ajude; que ela compre; que ele pense...

            Já os verbos com terminações –er, -ir: comer, fazer, sair, fugir, acudir, entre outros, da segunda e terceira conjugações, devem ser flexionados, na terceira pessoa do singular do presente do subjuntivo, assim: Que ela coma... Que ele faça... Que ela saia... Que o D. não fuja e que o Senhor nos acuda...

            É nessas horas que Deus nos ajuda... Muito bem, Jó, aqui você está usando o presente do indicativo, e não o presente do subjuntivo citado acima.

            Continuando sua peroração, o deputado diz: — vinte anos atrás, eu estive em Cuba... E eu monologo baixinho:

            — Mas se foi “há” vinte anos, por que o “atrás”, se os gramáticos nos ensinam que o verbo haver, no sentido de tempo passado, dispensa o advérbio atrás? Bastar-lhe-ia dizer: — vinte anos, estive em Cuba... Também a própria flexão do verbo em primeira pessoa já indica quem esteve em Cuba: “eu estive”... Nesse caso, o “eu” é opcional.

            Mais adiante, o membro do legislativo sai-se com esta: — Neste país, houveram muitos avanços na área da medicina...

            E eu digo para o meu umbigo:

            — Coitado, não aprendeu na escola que o verbo “haver” com o significado de “existir”, “ocorrer”, não se flexiona no plural; caso contrário, ele diria que houve muitos avanços... Por outro lado, se ele não está no país a que se refere, deve dizer “Naquele país”, “Nesse país”, e não “Neste país” (Cuba).

            Corrigindo o congressista: Nesse país (Cuba, onde ele esteve vinte anos atrás), houve muitos avanços na medicina... Percebeu, leitor, que, na frase entre parênteses, dispensei o e apenas mantive o atrás? Quando o está presente na referência a tempo passado, não precisa do atrás; e o contrário também é certo: havendo atrás não é necessário na indicação de tempo passado. A objetividade é outra qualidade importante da comunicação, por isso, cortei o “há” na frase corrigida acima.

            Outro problema de muita gente boa é com a pronúncia de certas palavras. Um juiz disse à sua secretária num tribunal:

            — Dona Tempesta, peça ao Dr. Epílogo para apor sua rúbrica na petição.

            Como é que pode? O homem chegou a juiz, está sempre falando uma palavra usual no fórum equivocadamente e jamais o chamaram à parte para lhe dizer:

            — Excelência, a pronúncia desta palavra não é “brica” e, sim, “rubrica”.

             Com economia de palavras, o juiz poderia dizer: “[...] peça ao Dr. Epílogo para rubricar a petição”.

            O promotor, para não ficar atrás do magistrado, acusou o réu com a seguinte catilinária:

            — Esse cabra é um delinguente que assassinou sua vítima com “ineksorável” crueldade.

            Delinquente, doutor, corrigiu-o o defensor público em particular. E outra coisa, a pronúncia de “inexorável” não é com “ks”, mas sim com “z”. Escreve-se com “x”, mas pronuncia-se com “z”. Assim, ó: “inezorável”. Volte lá e peça desculpas pelo “açaçinato” do “indioma”.  

            Amigo leitor, na dúvida da pronúncia ou grafia dum vocábulo, consulte o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras, o quase desconhecido VOLP, ou um bom dicionário atualizado do idioma pátrio. Eles trazem, entre barras, a letra indicadora da pronúncia do x, que ora pode ser /ks/, como em anexo, ora /ch/, como em xícara, ou /z/ como é o caso de inexorável.

            Até aqui, tudo bem, o problema foi quando o defensor pediu ao juiz:

            — Excelência, “desiguína” outra testemunha para depor...

            E o promotor deu-lhe o troco:

            — Também o nobre colega errou na pronúncia de “designa”; então, estamos quites, pois esta palavra se pronuncia /dezígna/.

            Ansioso pelo fim do caso, o juiz ordenou à secretária:

            Hajam vistas os graves gravames idiomáticos dessa seção, decido suspendê-la para que, somente após esclarecidos todas as dúvidas linguísticas, eu a possa concluir.  Destarte, determino à dona Tempesta que faça a revisão de nossos textos e nos encaminhe, tempestivamente, uma cópia da sentença dessa audiência.

            Antes de ser demitida, a secretária entregou ao seu chefe o seguinte texto:

            Haja vista a nossa ignorância, somente haverá o epílogo desta sessão quando um bom professor de língua portuguesa nos facultar que sejam esclarecidas todas as dúvidas linguísticas desta audiência.

            Coitada, foi punida por ser a única que sabia escrever corretamente e com estilo.

          Agora, tenta inutilmente ser contratada como professora de português naquele fórum. Porém, desde então, quem, diariamente, passa por aquela vara lê o seguinte aviso: “Audiência ‘só mente’ amanhã”.

sexta-feira, 23 de junho de 2023

 


ONDE ESTIVER JESUS
 
Onde estiver Jesus, alma querida e boa,
Ilusão, erros, falhas apareçam embora,
Ainda mesmo que o mal em torno desarvora,
Esclarece, ilumina, ampara, aperfeiçoa.
 
Onde estiver Jesus, nada se diz à toa,
O engano pede luz onde a verdade mora,
A caridade reina, a esperança, hora a hora,
Alteia-se mais bela; o trabalho abençoa.
 
Onde estiver Jesus, humilhado ou sozinho,
Nas desfigurações ou nos aleives do caminho,
Inflama-te de amor – sol ardente e fecundo!...
 
Onde estiver Jesus... Eis que Jesus te espera
A bondade, o perdão, a decisão, a paz, a fé sincera.
Para a glória da vida e a redenção do mundo.

DOLORES, Maria (Espírito). Antologia da espiritualidade. Psicografado por: Francisco Cândido Xavier. 6. ed. 2. imp. Brasília: FEB, 2014.

quinta-feira, 22 de junho de 2023

 


ROGATIVA DE PAZ
 
Onde estiveres no mundo,
Não te queixes, nem te irrites,
Não há sombra sem limites,
Nem sofrimentos em vão;
Suporta com paciência
Qualquer toque de amargura,
A provação nos procura
Trazendo renovação.
 
Trabalha, serve, perdoa,
Se alguém te enlameia o nome,
Que a tolerância te tome
Por mestra de amor e luz;
Ninguém passa pela Terra,
Caminhando indiferente,
Esse luta, outro é doente,
Cada qual na própria cruz.
 
Às vezes, quem te deprime
Quem te ofende ou desprimora
Carrega chagas, embora
O lindo porte que traz;
Muita gente que parece
Felicidade e barulho,
Vício, pompa, inveja e orgulho,
É pranto pedindo paz.
 
Compadece-te e caminha
Na fé com que Deus te alcança,
Não apagues a esperança
No coração de ninguém.
Recorda que o Céu te busca
Não para ver pedra e espinho
Mas para ser no caminho
O apoio vivo do bem.
 
DOLORES, Maria (Espírito). Maria Dolores. Psicografado por Chico Xavier. 1. ed. Imp. pequenas tiragens. Brasília: FEB; São Paulo: IDEAL, 2022.

terça-feira, 20 de junho de 2023

 







 

LUZ NO CAMINHO
 
Eleva-te na fé, alma querida e boa...
Do caminho em que estás, observa, porém:
Tudo o que se faz luz, ante o Reino do Bem,
É doação de amor que nos serve e abençoa.
 
Contempla a labareda, entregue à disciplina,
Nos turbilhões de força que a consomem:
É a matéria, ao morrer, escravizada ao homem,
A fazer-se clarão na chama que origina.
 
A candeia a luzir, nas conquistas que levas,
— Gênio do mundo antigo em mágico produto -
é óleo reprimido em vaso diminuto,
na renúncia total, ao dissipar as trevas.
 
A vela a desfazer-se, humilde e acesa,
— Pingo de sol marcando a estrada escura —
É o pavio a esvair-se na clausura
Por agente de auxílio à Natureza.
 
Toda a eletricidade, em sentido profundo,
Que vibra presa ao fio e se agiganta e brilha,
É poder que se dá, lâmpada e maravilha,
Conquistando o progresso e iluminando o mundo.
 
Procurando servir nos sonhos teus e meus,
Sejamos nós também, alma boa e querida,
Um caminho de amor no coração da vida
Ligando a vida humana ao coração de Deus.
 
DOLORES, Maria (Espírito). In: Marcas do caminho. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. 1. ed. – 1.ª impr. por demanda (P.O.D.). Brasília: FEB, São Paulo: IDEAL, 2021.


segunda-feira, 19 de junho de 2023

 



CANTIGA DA GRATIDÃO 

Já não quero senão entendimento.
 Graças te dou, Jesus, porque me ensinas
 Que o teu amor, em tudo, é sempre grande,
 Ainda mesmo quando se te expande
 Na beleza das cousas pequeninas.
 
 Sei que vivo distante do heroísmo
 Que vejo fulgurar, entre as almas de escol,
 Mas posso ser o apoio em que se tente
 Socorro e proteção a uma planta doente
 Para que não lhe falte a carícia do Sol.
 
 Não consigo extinguir a penúria na Terra,
 Entretanto, Senhor,
 No espinheiral de luta em que ainda me embrenho,
 Posso partir, sem mágoa, o pão que tenho
 Para um gesto de amor.
 
 Quantas lições me mostras no silêncio!...
 A da semente enriquecendo o chão,
 A das provas cruéis numa prece a vencê-las,
 A da vela na noite sem estrelas,
 Expulsando a tristeza e a escuridão...
 
 Lembro a história de antigo fio d'água
 Que criou no deserto amorável jardim...
 Lembro a lagarta e a seda, nobre e rara,
 A perola e a concha que a formara
 Por lágrima de luz crescida em dor sem fim...
 
 Penso na areia resguardando o rio,
 Na pedra que se oculta, assegurando o lar,
 Na raiz da roseira, às vezes, sob estrume,
 Para que a rosa em vagas de perfume
 Possa elevar-se à vida, existir e bilhar.
 
 Observo e registro os meus empeços
 Que o passado de débitos me traz,
 Mas posso ser na fé que hoje me alcança
 Uma simples tarefa, um toque de esperança,
 Uma palavra boa e um sorriso de paz!...

 Estou feliz, Senhor, porque me ergueste,
 Serva que por teus servos se conduz,
 E porque rogo luz sem que a treva me tome,
 Por trazer em minh’alma a bênção de teu nome,
 Agradeço, Jesus!...
 
DOLORES, Maria; MEIMEI. (Espíritos). Somente amor. 1. ed. – Impressão pequenas tiragens. Brasília: FEB; São Paulo: IDEAL, 2022.


sábado, 17 de junho de 2023

 
EM DIA COM O MACHADO 580:
À LUZ DA FÉ (Irmão Jó)



 
            Alma amiga, hoje retomamos um tema que sempre me atraiu: Fé e vida, o mesmo de obra inédita de Chico Xavier, publicado recentemente pela Federação Espírita Brasileira.
            O que é a fé? Na visão das religiões, é a crença em dogmas e “artigos de fé”. Ela pode ser cega ou raciocinada, segundo o entendimento espírita.
            A fé cega, diz Allan Kardec, “produz o fanatismo”. Mas “não basta ver”, explica ele, “é preciso, sobretudo, compreender”. Por fim, o codificador da Doutrina Espírita afirma que “Fé inabalável é somente a que pode enfrentar a razão face a face, em todas as épocas da humanidade”.
            Segundo um espírito protetor, no capítulo 19 d’O Evangelho segundo o Espiritismo, a fé é humana e é divina. Somos movidos pela vontade. O que faz a diferença, em nossa vida, é o querer. Por isso diz o provérbio: “querer é poder”, ou seja, precisamos nos manter sempre motivados, pois quando se perde a motivação, pouco a pouco vamos perdendo tudo, até mesmo a vontade de viver. Nesse tempo, a fé já não está conosco.
            Negar a vida, porém, é simples perda de tempo, pois viveremos eternamente, e a evolução é nosso destino. A vida é dom divino que não exclui nenhum filho de Deus, que todos nós o somos, creiamos ou não nisso.
            Esta é a fé humana: a confiança em si mesmo... Como disse o espírito supracitado: “O Cristo, que operou milagres materiais, mostrou, por esses milagres mesmos, o que pode o homem, quando tem fé, isto é, a vontade de querer e a certeza de que essa vontade pode obter satisfação”.
            Se o homem se esforça na conquista de um objetivo, e sente em si mesmo que possui as forças necessárias para alcançá-lo, isso o torna confiante na vitória. Assim também ocorre com quem possui fé na vida post mortem e resolve dedicar sua existência corporal ao bem. Essa fé divina permite a quem a possui realizar prodígios de devotamento e de abnegação ao próximo, o que caracteriza o verdadeiro entendimento do que seja a caridade, ou amor em ação.
         O espírito Emmanuel demonstra o poder da fé e do amor humanos quando diz: “Compreendendo-se que a Justiça divina ignora privilégios, todos aqueles que se decidem a servir são escolhidos por efeito da própria escolha” (in: Fé e vida, cap. 3).
            Como acabas de ler, alma amiga, Deus não privilegia quem diz ter a fé religiosa e, sim, aquele em quem a fé se expressa em obras. A diferença está apenas na vontade. Se esta é a de César, permanecerá com ele, na Terra; se é a de Deus, realizará prodígios não só na Terra como também no Céu, onde as “almas eleitas” se encontram e usufruem da felicidade dos justos.      
            Eis o que diz o espírito Maria Dolores sobre a fé, na obra cujo título é seu nome, psicografada por Chico Xavier: Palavras da fé
 
Nunca te dês por inútil,
Mesmo em ação de alto nível,
Não afirmes: “impossível”,
Nem te digas sem valor,
Deus em ti é a própria vida,
Mantendo-te, instante a instante,
Em doação incessante,
Por fonte viva de amor.
 
Não és um astro, no entanto,
Tens a força estranha e bela
De acender a luz da vela,
Dissipando a escuridão.
Não inventaste a semente,
Nem a romã cetinosa,
Não sabes tecer a rosa,
Mas podes assar o pão.
 
Não fulguras qual brilhante
Nem tens a força do vento
Em redemoinho violento,
Quando ruge a destruir;
Mas tens o conhecimento
De quem guia a natureza,
Exterminando a tristeza,
No dom de fazer sorrir.
 
Não esmoreças no mundo,
Trabalha, ajuda, esclarece,
Tens o verbo, a voz, a prece,
São sem conta os dotes teus;
Ampara, acalma e perdoa,
Qualquer migalha do bem,
Na Terra e no Mais Além,
É benção do amor de Deus.
 
            Vem, pois, comigo à luz da fé em nossa vida imortal, alma irmã!


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