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domingo, 11 de novembro de 2012

Em dia com o Machado 23 (jlo)
           
            Amigo leitor, boa noite!
            Lembra-se dos versos que Bentinho doou ao primeiro desocupado que os quisesse, após inumeráveis tentativas de compor um soneto com eles? Estavam lá, no capítulo 55 de D. Casmurro. Hoje resolvi, como leitor ocioso, segundo a condição proposta, aceitar a oferta. Os versos agora são meus. Já lá não mais estão os seus originais, pois apropriei-me deles, Entretanto, como diria Walter Benjamin, lá ficaram apenas suas imagens, pois estamos na era da reprodutibilidade eletrônica.
            O primeiro verso é o seguinte: Oh! flor do céu! oh! flor cândida e pura! que o seminarista imaginou formar, com outros treze versos, um soneto para sua amada Capitu. Pensou, pensou, pensou e... nada. Nada mais lhe ocorria à mente.
            Deu branco total e, nem assim, o jovem se lembrou de Cruz e Sousa, provavelmente o maior vate da época, pós-Gonçalves Dias e Castro Alves.
           Como deu branco, poderia buscar no Emparedado inspiração para redigir sonetos, em especial os que utilizassem o branco e suas variações nas suas estrofes: níveo, marmóreo, nevado, alvo, pálido... Todos eles fariam justiça à “flor do céu”, naturalmente láctea.
            Pensou, então, na chave de ouro do soneto, pois todo soneto termina com uma chave de ouro. Ocorreu-lhe este verso: Perde-se a vida, ganha-se a batalha! Lembrou-se, de imediato, da justiça. Agora, sim, tinha o verso da introdução e o da conclusão. De resto, era só preencher as quatro estrofes do soneto com os doze versos faltantes.
            Mas, por mais que tentasse nada lhe ocorria à mente.
            Por instantes, vislumbrou o tema guerra. Afinal, a chave de ouro concluía com apoteótica menção à batalha e, como é sabido, literalmente, a batalha é da guerra.
            Havia um porém aí, como seminarista, candidato a padre, ao menos na intenção da mãe e do padre Cabral, seu professor de latim, não ficaria bem escrever um soneto sobre a guerra.
            Por fim, veio-lhe à mente a ideia da caridade. Chegou mesmo a tentar uma troca de posições dos trechos do último verso. Que tal: Ganha-se a vida, perde-se a batalha? Mas aí, para a vida virtuosa, viver no mundo e para o mundo é afastar-se de Deus e da caridade, então o poema deveria demonstrar o prejuízo de se viver profanamente.
            Pensou, pensou, pensou e... nada. Which way? Just go straight, reader!
            Já cansado, sugeriu ir em frente e doou os dois versos ao primeiro desocupado que desejasse compor o soneto. Então, amigo leitor, como lhe disse acima, resolvi apropriar-me dos versos do ex-seminarista Bentinho, que desprezou o grande amor de Capitu após casar-se com ela.
            Comecei do último tema, pois, de acordo com o Cristo, “os últimos serão os primeiros”. Então, vamos a ele:
CARIDADE
 
Oh! flor do céu! oh! flor cândida e pura!
Fora da caridade não há não
Jeito de se salvar qualquer cristão,
Forma de conquistar maior ventura.
 
 
Esta, bondosa irmã, é a mais segura
Garantia da paz ao coração.
É a mais correta forma de oração,
A caridade eleva-nos à altura.
 
Aquele que perder vencê-la- á
Quem desejar ganhar perdê-la-á,
Pois a vida na Terra é breve estrada.
 
 
A alma justa nunca jaz prostrada.
Ainda que se cubra com mortalha,
Perde-se a vida, ganha-se a batalha!
            Proponho-lhe, agora, infatigável e intimorato leitor, com os mesmos dois versos doados pelo Dom Casmurro, escrever outros três sonetos: um dedicado à amantíssima Capitu, outro à justiça e, por fim, o último à guerra. Caso contrário, futuramente, eu mesmo o farei.
            Aceito doações...
            Bom domingo!

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