Em dia com o Machado 268
(jorge leite)
Amiga
leitora, Humberto de Campos, em Cartas e
crônicas, sob o pseudônimo Irmão X, no capítulo 19, intitulado Em torno da paz, narra a história de
Anacleto, que acordara em dia claro, às 8h, e, antes de se levantar, pegou o
Evangelho de João e leu a mensagem contida no capítulo 14:27, na qual o Mestre
dizia: “Minha paz vos deixo, minha paz voz dou. Não vo-la dou como o mundo a
dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize”.
Encantado,
Anacleto fez a promessa de viver em paz pelo resto da vida, como o Cristo
recomendava, em todas as situações e com todas as pessoas. Mal se levantou,
procurou o terno para vestir-se e ir trabalhar, mas a calça nova do terno
estava rasgada.
Agastado,
chamou a esposa, Horacina, que, aflita com a filhinha de colo doente, lamentou
o ocorrido e exclamou:
—
Que pena! eu estou ocupada com Soninha, com pneumonia, e não vi quando os
meninos, à solta, rasgaram sua calça.
Sem
se preocupar com a gravidade da doença da filhinha de meses, Anacleto gritou:
—
É só o que você sabe dizer? Esquece-se de que paguei uma nota preta pela calça?
A
esposa, humilde, nada respondeu. Abriu o guarda-roupas, pegou outra calça
parecida com a que fora rasgada e a entregou
ao marido.
Não
vou contar-lhe toda a história, amiga leitora, para não lhe tirar o prazer de
lê-la na obra supracitada, mas outros três contratempos ocorreram, em seguida,
antes de Anacleto entrar no ônibus que o transportaria ao trabalho. Em cada um
deles, nosso herói se exasperou por demais, culminando por chamar de malditas
todas as pessoas que atravancaram seus passos. Houvera lido o Poeminho do Contra, de Mário Quintana, após refletir na leitura da frase do Cristo, e seu
dia teria sido de plena calma:
Todos esses que aí estão.
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!
Eu passarinho!
É então
que a leitora, em relação ao incidente inicial contado, dirá:
— Ah, se
fosse comigo! Eu mandava-lhe o pé na b... e dizia-lhe que o tempo da escravidão
acabou. Ele que assumisse sua condição de pai e dividisse comigo a obrigação de
educar nossos filhos.
Pois é, Anacleto, os tempos mudaram! só você ainda não percebeu isso.
Pois é, Anacleto, os tempos mudaram! só você ainda não percebeu isso.
Mas é
assim mesmo que as coisas acontecem, em nosso cotidiano. Somos testados a todo
o tempo com base no que prometemos realizar e quase nunca o fazemos.
Só não
percebemos isso porque julgamos que nos basta a teoria, a prática é problema
alheio. Só adquire a sabedoria real aquele que alia ambas as coisas, como o
Mestre recomendava:
— “Observai e fazei tudo o que escribas e os
fariseus fazem, mas não façais como eles, porque não praticam o que dizem”
(Mateus, 23:3).
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