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segunda-feira, 25 de março de 2013


Em dia com o Machado 42 (jlo)

            Boa-madrugada!

            — A experiência da quase morte continua incomodando os neurocirurgiões e outros neuros, inclusive os neuróticos. Pois não é que um neurocirurgião inglês, famoso por suas convicções de décadas sobre o poder quase ilimitado do cérebro sobre a mente, tornou-se crente? Sim, senhor, “virou” crente na, até então, estúpida ideia de que a matéria não produz a mente, porém esta é totalmente independente do cérebro.

            — E como isso aconteceu?

            — Após utilizar suas teorias materialistas para “explicar” como sugestões cerebrais ou meras ilusões provocadas pelos mecanismos de defesa do cérebro os inúmeros casos da chamada quase-morte, em que o paciente fica horas, dias, semanas ou meses em estado de coma, ele mesmo ficou sete dias nesse estado. Viu-se fora do corpo, conversou com entidades espirituais, passeou pelo mundo extrafísico, onde a natureza era tão bela que julgou-se estar na presença de Deus o tempo todo. Quando voltou à vida física, após ter-se reanimado, já não era mais o mesmo cientista cético. Agora, a vida parece-lhe muito mais bonita e importante, todos aqueles princípios ridículos das religiões, relativos à necessidade de se amar as pessoas, de fazer o bem para ser feliz passaram a fazer parte de seu dia a dia.

            — E as teorias que ele tanto prezava?

            — Concluiu que nada disso prestava. E mais, agora precisava divulgar ao mundo sua “descoberta” e, para tal escopo, escreveu um livro sobre o que se passou consigo.

            — Vai perder seu tempo, pois mesmo que leiam sua obra vão dizer que a pancada na cabeça lesou seu cérebro e o fez ter alucinações.

            — Ele responderá com lucidez que conhece cada um dos neurônios cerebrais e não perdeu nenhum deles, no acidente sofrido.

            — Pois já há colega desse neurocirurgião com uma nova teoria para explicar sua conversão ao reino dos tolos crentes na existência da alma.

            — E o que diz esse colega?

            — Explica que há neurônio tão escondidinho, mas tão escondidinho, que só aparece no momento em que a pessoa entra no estado da “quase morte” com a função única e exclusiva de explicar que o cérebro humano é tão poderoso que consegue enganar todo o mundo, fazendo-nos crer em algo que não existe. Afinal, o que acontece, nesses momentos não é uma quase inexistência? Se a pessoa morre, a inexistência se concretizaria e, então, vamos deixar essas explicações da vida depois da morte para os pobres de espírito e vamos aproveitar a vida antes da morte.

            — Depende do que você considera ser “aproveitar a vida”. Se é criar mil teorias para justificar o poder quase sobrenatural do cérebro sobre a mente e, com isso, chafurdar-se nos vícios e paixões inconsequentes, só posso lhe desejar uma coisa: que você  quase morra para poder valorizar, de fato, a vida.

            — Cruzes! Você é ou não é meu amigo? Vamos “deixar aos mortos o cuidado de enterrar seus mortos”. Não é isso que dizia o “Carpinteiro”?

            — Não te esqueças, porém, de que, se a imortalidade é um fato, só é vivo realmente, quem vive pelo espírito.

            — Mas não é assim que eu vivo? Vivo pelo espírito do vinho, pelo espírito das belas mulheres, pelo espírito das leis favoráveis às minhas causas...

            — E pelo espírito de porco...

            — Agora você me ofendeu!

            — Ora, meu amigo, se somos o resultado mecânico das reações neurológicas do cérebro, nada mais natural do que não nos ofendermos com nada, pois afinal, nada somos mesmo, não é?

            — É, não sei... Assim você me confunde!

            — E o que mais fazem as teorias materialistas do que nos confundir?

            — Vai dormir, rapaz! Se não, quem acaba morrendo é você.

            — Tens razão, estou morto de sono. Boa-madrugada!

            — Até mais ver!

 

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