Em dia com o Machado 42 (jlo)
Boa-madrugada!
— A experiência da quase morte continua incomodando os neurocirurgiões
e outros neuros, inclusive os neuróticos. Pois não é que um neurocirurgião
inglês, famoso por suas convicções de décadas sobre o poder quase ilimitado do
cérebro sobre a mente, tornou-se crente? Sim, senhor, “virou” crente na, até
então, estúpida ideia de que a matéria não produz a mente, porém esta é
totalmente independente do cérebro.
— E como isso aconteceu?
— Após utilizar suas teorias
materialistas para “explicar” como sugestões cerebrais ou meras ilusões
provocadas pelos mecanismos de defesa do cérebro os inúmeros casos da chamada quase-morte, em que o paciente fica
horas, dias, semanas ou meses em estado de coma, ele mesmo ficou sete dias
nesse estado. Viu-se fora do corpo, conversou com entidades espirituais,
passeou pelo mundo extrafísico, onde a natureza era tão bela que julgou-se
estar na presença de Deus o tempo todo. Quando voltou à vida física, após ter-se reanimado, já não era mais o mesmo
cientista cético. Agora, a vida parece-lhe muito mais bonita e importante,
todos aqueles princípios ridículos
das religiões, relativos à necessidade de se amar as pessoas, de fazer o bem
para ser feliz passaram a fazer parte de seu dia a dia.
— E as teorias que ele tanto
prezava?
— Concluiu que nada disso prestava.
E mais, agora precisava divulgar ao mundo sua “descoberta” e, para tal escopo,
escreveu um livro sobre o que se passou consigo.
— Vai perder seu tempo, pois mesmo
que leiam sua obra vão dizer que a pancada na cabeça lesou seu cérebro e o fez
ter alucinações.
— Ele responderá com lucidez que
conhece cada um dos neurônios cerebrais e não perdeu nenhum deles, no acidente
sofrido.
— Pois já há colega desse neurocirurgião
com uma nova teoria para explicar sua conversão ao reino dos tolos crentes na
existência da alma.
— E o que diz esse colega?
— Explica que há neurônio tão
escondidinho, mas tão escondidinho, que só aparece no momento em que a pessoa
entra no estado da “quase morte” com a função única e exclusiva de explicar que
o cérebro humano é tão poderoso que consegue enganar todo o mundo, fazendo-nos
crer em algo que não existe. Afinal, o que acontece, nesses momentos não é uma quase inexistência? Se a pessoa morre, a
inexistência se concretizaria e,
então, vamos deixar essas explicações da vida depois da morte para os pobres de espírito e vamos aproveitar a
vida antes da morte.
— Depende do que você considera ser “aproveitar
a vida”. Se é criar mil teorias para justificar o poder quase sobrenatural do
cérebro sobre a mente e, com isso, chafurdar-se nos vícios e paixões
inconsequentes, só posso lhe desejar uma coisa: que você quase morra para poder valorizar, de fato, a
vida.
— Cruzes! Você é ou não é meu amigo?
Vamos “deixar aos mortos o cuidado de enterrar seus mortos”. Não é isso que
dizia o “Carpinteiro”?
— Não te esqueças, porém, de que, se
a imortalidade é um fato, só é vivo realmente, quem vive pelo espírito.
— Mas não é assim que eu vivo? Vivo
pelo espírito do vinho, pelo espírito das belas mulheres, pelo espírito das
leis favoráveis às minhas causas...
— E pelo espírito de porco...
— Agora você me ofendeu!
— Ora, meu amigo, se somos o
resultado mecânico das reações neurológicas do cérebro, nada mais natural do que
não nos ofendermos com nada, pois afinal, nada somos mesmo, não é?
— É, não sei... Assim você me
confunde!
— E o que mais fazem as teorias
materialistas do que nos confundir?
— Vai dormir, rapaz! Se não, quem
acaba morrendo é você.
— Tens razão, estou morto de sono.
Boa-madrugada!
— Até mais ver!
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