Páginas

sábado, 24 de agosto de 2013

Em dia com o Machado 64 (jlo)

            Meu amigo Roge Jeteli foi assistir ao show do Roberto Carlos, nesta sexta-feira, 23 de agosto de 2013, no Centro de Convenções, em Brasília, com sua esposa que, fã do rei, realizava seu sonho de juventude (do marido, rs) no aniversário (dela, rs).
            O repertório, disse-me ele, foi excelente. Entre outros sucessos, RC cantou “O portão”. E, enquanto este cantava, aquele refletia na semelhança entre o seu retorno à antiga residência, 14 anos atrás, e a volta cantada do cantor.
            “Eu cheguei em frente ao portão, / Meu cachorro me sorriu latindo...”, começou Roberto, enquanto Roge lembrava da chegada deste: “Eu também cheguei em frente ao portão, mas não me lembra nenhum cachorro me sorrir latindo”.
            Continuando a música, após informar que colocara as malas no chão e voltara, RC diz que tudo estava igualzinho ao que era dantanho, e acreditava que somente ele mudara em seu retorno ao lar. Retorno que agora era definitivo, reforça na estrofe seguinte, porque ali era o seu lugar.

Tudo estava igual como era antes,
Quase nada se modificou,
Acho que só eu mesmo mudei
E voltei.

            De repente, toda uma história de vida explode na mente de Roge:
            Família paupérrima, pai enfermo durante meses, até vir a falecer, aos 53 anos, deixando mulher e sete filhos menores. Jeteli, o terceiro mais velho, tinha onze anos. Após muitas peripécias malsucedidas para ganhar uns trocados e auxiliar a mãe, junto com outros irmãos maiores, no sustento da prole, Roge incorpora ao Exército e, aos 22 anos, após concluir curso de sargento, é transferido para Salvador.
            Uma senhora, em visita à casa do meu amigo, ao vê-lo fardado, sem noção alguma, vaticina: 
            — Tão novinho e já é sargento? Vai chegar a general...
            Nos  ouvidos de Roge ainda ressoam as palavras maternas, alguns dias após, quando ele, choroso, diz à mãe ter sido transferido para a Bahia, estado distante, completamente desconhecido dele e de sua família:
            — Vai, meu filho, se é para o seu bem, você deve ir...
            Lembra-se não tê-la visto derramar uma só lágrima de despedida, ao ter de viajar às pressas, para Salvador, em alta noite, uma vez que recebera, naquele mesmo dia, um telegrama ameaçador: “Compareça ao 19º BC, no Cabula, Salvador, BA, em 24h, ou você será preso”.
             Se fosse de ônibus, seria preso, pois a viagem não duraria menos de trinta horas. Nosso amigo teve que pegar um voo urgente e chegar a seu novo destino de madrugada. Sua nova residência, por ano e meio, ali, seria o quartel; outros três anos no interior baiano e o resto da vida em Brasília onde, 22 anos após, daria baixa do Exército...
            Roge estudara, formara-se, passara em concurso público e iniciara nova etapa de vida profissional por mais 22 anos, até se aposentar.
            Mas meu amigo sentia que sua mãe, na época, cuidando e sendo cuidada por seus outros seis filhos, desejava-lhe todo o bem do mundo e se fazia forte em sua frente para não deixá-lo ali, naquele humilde lar do Rio de Janeiro, com futuro incerto. Por isso, seguiu seu destino sereno. E nunca olvidou sua mãezinha tão querida...
            Os anos passaram...
            Agora, Roge ouve o trecho da música do Roberto Carlos:

Fui abrindo a porta devagar,
Mas deixei a luz entrar primeiro,
Todo meu passado iluminei
E parei.

            Voltando ao passado...
            De Salvador, Jeteli fora transferido para Barreiras, cidade do interior da Bahia, onde se casara. Um ano depois, mudara-se com a esposa para Brasília, tivera três filhos e agora, embora anualmente, nas férias, fosse visitar a mãe e irmãos no Rio de Janeiro, com a família, o tempo passara e a “velha” fizera oitenta anos.
            — Ao longo de 26 anos, pensava Roge, nesse tempo, estive afastado de meu primeiro lar. Meus dois irmãos mais novos, que são gêmeos, já estão casados; e todos têm sua família, porém, salvo outro irmão, que se mudara com a esposa e filhas para Recife e já retornaram ao Rio, eu sou o único, até o momento, que...
            Voltando ao presente, nova estrofe da música do rei ressoa nos ouvidos de Roge:
                                     
                                   Onde andei, não deu para ficar
                                   Porque aqui, aqui é meu lugar.
                                   Eu voltei pras coisas que eu deixei,
                                   Eu voltei...

— Não, reflete Jeteli, eu não voltei porque lá era meu lugar; eu voltei para fazer companhia à minha querida mãezinha, por ao menos uma semana inteirinha. Para durante ao menos sete dias, deixar o meu lugar em Brasília e ser todinho dela. Dela que não entendeu nada. Nem ela nem ninguém...
Eu não voltei para ficar, mas penso que minha mãe tenha ficado um pouco assustada:
— Afinal, o que esse homem casado quer fazer aqui agora, deixando mulher e filhos em Brasília? Terá brigado com a mulher?
— Não, mamãe, o homem casado, com mulher e três filhos, não brigou com a esposa querida; voltou para curtir um pouco essa mãe que ainda viveria mais nove anos. Seu lugar, porém, nunca deixou de ser, física e espiritualmente, desde que se casou, ao lado de sua mulher e filhos.
Voltando ao presente...
Roge sempre amou e foi fiel à esposa, que agora, ao seu lado, ao completar mais um ano de vida, ouve, com ele, a voz melodiosa do melhor cantor brasileiro de todos os tempos. E essa voz canta como nunca:

Quando vi que dois braços abertos
Me abraçaram como antigamente
Tanto quis dizer e não falei
E chorei...

De volta ao passado, todavia, um pedaço do coração de Jeteli ficara no Rio. E esse pedaço era todo de sua mãe, a quem ele devia o primeiro amor, os primeiros cuidados, as muitas noites sem dormir para lhe oferecer o melhor que lhe pudera dar: a vida, uma educação digna e seu exemplo de dedicação, de desprendimento e de honestidade.
Embora seu lugar não fosse lá, e sim aqui, quem sabe a mãe de Roge Jeteli, agora do Mundo Espiritual, não esteja cantando feliz, junto com o filho, do lado de cá, com muito amor e imensamente feliz por vê-lo junto a uma esposa maravilhosa e tendo como família duas filhas casadas, dois excelentes genros, dois belos e carinhosos netos e um não menos belo e carinhoso filhão.
— Agora, Roge Jeteli, ouça o recado que sua mãe acaba de me pedir que lhe dê:
— Sim filho, você voltou, mas um dia nos reencontraremos na verdadeira pátria e, então, cantaremos, todos juntos, com Roberto e seus milhões de amigos: “Jesus Cristo, Jesus Cristo, Jesus Cristo/ Eu estou aqui...”
— Diga-lhe, então, Machado, que eu gostaria de cantar também com ela e com os nossos amores: papai, irmãos, nossas famílias, genros, noras, tios, tias, netos, etc. etc. etc. Enfim, com sete bilhões e tantos amigos:

Nossa Senhora, me dê a mão,
Cuida do meu coração.
Da minha vida,
Do meu destino,
Do meu caminho...
“Cuida de nós!”

É isso, amigos, a vida é curta. Valorizem cada ser que Deus colocou em sua vida e... Curtam-nos! E que o portão de cada um de vocês seja tão promissor quanto o meu e o do Roberto Carlos.
— Então, parabéns à sua amada, Roge, pela data natalícia deste 23 de agosto. 
Que a vida lhes seja leve e a Terra generosa.
Boa-noite!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

  À portuguesa amada (Irmão Jó)   Como te amo, minha amiga, e choro Por vê-la maltratada, desprezada, E quantas vezes me recolho e oro Para ...