Em dia com o
Machado 75 (jlo)
Havia sessenta anos
que eu estivera no Campo São João Batista, no Rio de Janeiro, para ali beijar
minha meiga Carola e abraçar os amigos e parentes queridos. Mas se também fosses
ao local, amigo leitor, só encontrarias farelos de ossos, pois, no local, apenas
trocáramos a veste física pela do espírito, bem mais formosa e higiênica...
A
quilômetros dali, do seu lar, pouco abaixo da bucólica igreja da Penha, um
adolescente, dia a dia, ouvia tocar, no rádio, um cantor excepcional. Naquela ocasião,
já havia TV em preto e branco, mas esse era um luxo desfrutado por poucas pessoas.
Estávamos, portanto, em 1968, e Joteli completara dezesseis verões (homem não faz
primavera, e, sim, verão; pois é do verão que surge o varão).
Aquele,
porém, seria um dia especial, pois o grande comunicador Sílvio Santos
apresentaria, na TV Record, um programa sobre o artista citado. E Joteli
descera o morro para assisti-lo, da janela, de uma das casas de rua abaixo.
Com a
complacência da família burguesa, o filho de proletários viu e ouviu, na TV, o
então jovem e já excelente apresentador, por longo tempo, defender o cantor das
acusações levianas a este atribuídas. Entre outras coisas, dizia Sílvio que
aquele rapaz, presente e calado, estava sendo injustamente acusado de ser perversor
da juventude, pois usava colares, roupas coloridas e era cabeludo.
E ainda
mais: acusavam-no de, por suas atitudes antissociais e afeminadas, ser mau
exemplo para a família e nefasta liderança para a juventude... Mas, segundo o expositor,
isso não era verdade.
O acusado não
passava de um jovem sem jeito para ser líder; triste no olhar, com seu modo
tímido e simples, apenas queria cantar suaves músicas românticas e estar na
moda. Não estava ali, portanto, para reivindicar nada; desejava apenas cantar e
cativar a todos, com sua bela voz.
Além disso,
sonhava casar-se e constituir uma família exemplar.
Diziam que
plagiava João Gilberto — continuou —, mas quem não imitava o João ou qualquer
outro grande cantor? O próprio Paulo Sérgio, que começara a cantar com voz
semelhante à do acusado, já assumira um estilo próprio, como ocorrera com o
inocente moço.
O
apresentador se retira, ao final de sua eloquente defesa, ante um cabisbaixo e
mudo cabeludo, apoiado por todos os presentes — jurados e plateia —, que o inocentaram
unanimemente.
No dia
seguinte, a imprensa repercutiria favoravelmente o programa. Pouco tempo
depois, o título de rei da música popular brasileira foi dado, definitivamente,
a Roberto Carlos.
É isso
mesmo, caro leitor, no Brasil já houve tempo em que usar cabelo comprido era
considerado coisa de efeminado. Essa moda, porém, viera da Inglaterra, com os Beatles
e hippies. Roberto apenas usava uma estratégia de marketing para ganhar popularidade.
O tempo e
os hippies passaram. Outras modas surgiram, como a do brinco numa das orelhas
do jovem, depois nas duas, a tatuagem e outras atitudes como a do ficar.
Na minha
época, quando um homem olhava para outro, insistentemente, na rua, era briga
certa. Casal namorando em praça pública, nem pensar. Atualmente, tornou-se
comum ver, beijando-se na boca, em qualquer lugar, dois jovens... do mesmo
sexo.
No meu
tempo, era excitante ler, nos romances, alusões a certas partes do corpo
feminino, como “uns braços”. Hoje, belas moças desfilam de minissaia sem que alguns
rapazes lhes deem a mínima...
A jovem de
antigamente corava de vergonha ao lhe ser pedido um beijo. Casamento, só com o
consentimento paterno. Com o advento da TV, as novelas atingiam seu clímax
quando o casal (homem e mulher), finalmente, se beijava.
Atualmente,
enquanto o drama se desenrola em relação à paternidade de uma criança, por
exemplo, os personagens principais e secundários já foram para a cama inúmeras
vezes. E, após o relacionamento sexual, é comum iniciar-se um bate-boca com
xingamentos e até mesmo agressões.
Acabou o
romantismo. Já não se sabe quem vai se dar bem, no fim da história, se é o
vilão ou o “bom moço”, a megera ou a mocinha que a persegue com seu ódio
implacável e desejo de vingança.
Por
enquanto, ainda não há novela em que, no final, o “casal” viva feliz para
sempre: ela com ela, ele com ele. Por enquanto...
Num
programa televisivo sobre sexo, ontem, a proposta era de um casal ir chupando,
cada um, a ponta de um macarrão, até que, ao final, suas bocas se encontrassem,
num ardente beijo. De repente, sob olhares curiosos da apresentadora,
convidados e plateia, apresentaram-se para a chupeta dois jovens... do sexo
masculino.
Virei de costas
e retirei-me.
Estou agora
com o firme propósito de continuar a escrever romances destinados,
exclusivamente, à vida no plano espiritual.
Pelo menos aqui,
cada um assume o que é... mas no corpo certo...
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