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quarta-feira, 30 de março de 2016

Anseio de amor (Maria Dolores)

Quando me vi, depois da morte,
Em sublime transporte,
E reclamei contra a fogueira
Que me havia calcinado a vida inteira
Pela sede de amor...

Quando aleguei que fora, em toda estrada,
Folha ao vento,
Andorinha esmagada
Sob o trator do sofrimento...

Quando exaltei a minha dor,
Mágoa de quem amara sempre em vão,
Farta de incompreensão...

Alguém chegou, junto de mim,
E disse assim:

— Maria Dolores,
Você que vem do mundo,
E se diz
Tão cansada e infeliz,
Que notícias me dás do vale fundo
De provação,
Onde a criatura de tanto padecer
Não consegue saber
Se sofre ou não?

Você que diz trazer o seio morto,
Que me pode falar
Dos meninos sem pão e sem conforto,
Das mulheres sem lar,
Dos enfermos sozinhos,
Que a febre e a fome esmagam nos caminhos,
Sem sequer um lençol ou a bênção de uma prece,
Dando graças a Deus, quando a morte aparece?!...

  Você, Maria Dolores,
  Que afirma haver amado tanto
  E que deve ter visto
  O sacrifício e o pranto
  De quem clama por Cristo,
  Suplicando o carinho que não tem,
  Que me pode contar daquelas outras dores,
  Daquelas outras aflições
  Dos que choram trancados em manicômios e prisões,
  Buscando amor, pedindo amor,
  Exaustos de tristeza e de amargura
  Como feras na grade,
  Morrendo de secura,
  De solidão, de angústia e de saudade?!...
.........................................................................

 Benquerer!... Benquerer!...
 Ai de mim, que nada pude responder!
 Que tortura, meu Deus, a verdade, no Além!...
 Calei-me, envergonhada...

 Eu apenas quisera ser amada,
 Não amara ninguém...


 (XAVIER, Francisco Cândido. Pelo Espírito Maria Dolores. Antologia da espiritualidade. 6. ed. Rio  de Janeiro: FEB, 2011, cap. 10.)

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