A senhora viúva, dia a dia, Sob os efeitos de uma
hemiplegia, Trazia a própria vida
concentrada Na cadeira de rodas,
manejada Por amiga enfermeira. Dos parentes mais
íntimos Um filho lhe restava,
um filho só, O filho que ela amava
enternecidamente... Marido, pais, irmãos,
chamados pela morte, Deixaram-lhe na vida Muita emoção
frustrada E aquele moço forte Que não lhe
confortava a existência dorida, Muito embora
abastada.
Achando-nos na
véspera do dia Que marcaria o enlace
do rapaz, A mãezinha doente Num misto de alegria, De esperança e de paz Entregou-lhe, feliz,
tudo quanto possuía: A fazenda, as ações
de grande companhia, Os créditos de banco e a linda moradia, A dizer-lhe,
contente: — Filho, tudo o que
tenho é seu... De amanhã para a
frente, Passo a morar no
estreito pavilhão Que seu pai construiu
ao fundo da mansão. Desejo ver você e a
jovem companheira Sempre felizes, sem
cuidados... Toda alegria agora
para mim Será sabê-los
sossegados, Ante a bênção de
Deus, na visão do futuro... O filho comovido Beijou-lhe as mãos
num gesto de amor puro E agradeceu a doação
materna, Prometendo-lhe em voz
macia e terna, Pela jovem com quem
se casaria Segurança, carinho,
convivência Para todas as horas
da existência Que desejava fossem Adornadas de paz e de
alegria. Depois do enlace, a enferma recebia Cartões lindos da Europa...O casal de viajores Via a lua-de-mel por um mundo de flores... Ambos davam notícias da beleza De Lisboa e Paris, de Florença e Veneza... Mas de retorno ao
lar, após a festa De comemoração do
regresso feliz A dama recebeu na
vivenda modesta O jovem par... E a
nora exigente lhe diz: — Minha sogra, ouça
bem!... Seu filho e eu Pensando em seu
descanso, Resolvemos agora
transferi-la Para um lar de
repouso, um abrigo claro e manso Onde a senhora viva
mais tranquila. Precisamos aqui viver
a sós, Não pretendemos tê-la
junto a nós.
Porque a pobre
espantada procurasse O olhar do filho
amado para ver A atitude interior
que lhe viesse à face, Ele mesmo aduziu: — É um pouso
geriátrico, mãezinha, A senhora, por lá,
não estará sozinha.
Nada disse a
velhinha, posta a um canto, Tão somente mostrou
silêncio e pranto... No dia imediato, Mudara-se-lhe o
trato... Internada num belo
casarão, Apesar da gentil
acompanhante, Eis que saudade
enorme a domina e consome... O recinto de luxo
para ela, Alma nobre e singela, Tinha apenas um nome: "Exílio e
solidão". Seis meses
transcorreram, lentamente, Não mais tornou a ver
o filho ausente E sem que a pompa, em
torno, a reconforte, A velhinha mais
triste e mais doente, De mágoa em mágoa,
vagarosamente, Entregou-se, de todo,
às mãos da morte...
Ante as indagações do
verniz social, Deu-se-lhe sobre a
Terra um lindo funeral... A pobre repousou num
sono longo e raro; Mais tarde, despertou
solicitando amparo. Junto dela, um
Emissário de Vigia, Descortinou-lhe os
Céus, comentando a alegria Que a esperava na
Altura...
A pobre mãe, porém,
perguntou com ternura: — E meu filho onde
está?
— Sem dúvidas
quaisquer – falou-lhe o mensageiro – Tanto quanto ficou,
seu filho ficará Por muito tempo ainda
em franco cativeiro, Tem muito que lutar,
nos encargos que leva, Entre as forças da
Luz e as tentações da treva... Mas você, minha irmã,
pode elevar-se agora, Pelo sacrifício e
devoção ao Bem, Mundos da Eterna
Aurora Esperam-na no Além... A senhora, porém, Expressando respeito
àquelas diretrizes, Disse, calma e
sincera: — Não aspiro a viver
entre os mundos felizes!... Voltar a ver e
acompanhar meu filho, Sem qualquer
empecilho, É todo o Céu de minha
longa espera. O Mensageiro que lhe
conhecia Os tempos de doença e
de agonia Anotou com brandura: — Irmã, descer da
Altura Imensa A fim de trabalhar
sem recompensa Em favor dessa ou
daquela criatura É conquistar maior
merecimento... Para estar com seu
filho, em constante união, Precisará viver Sob o regime da
reencarnação... E, acaso, aceitará
por mãe a própria nora? — Como não, anjo bom?
– replicou a senhora – Se Deus me consentir,
assim regressarei, Creio que a luz do
amor é o princípio da Lei; Se tenho no meu filho
a bênção que procuro, Como menosprezar a
jovem que ele adora? Amá-lo-ei melhor por
minha nora De quem devo ser
filha no futuro... Hei de amá-la também,
voltando a ser criança, Sempre encontrei no
amor divina maravilha, Minha nora no lar me
acolherá por filha, Serei nos braços dela
uma nova esperança... Envolverei meu filho
e ela em meu sorriso, Todo berço na Terra
aponta o Paraíso... Cinco anos passaram
sobre o Tempo... Hoje anotei um trio
encantador: Ante a filhinha: - luz recém-nascida – Disse o pai ao
beijá-la: "Minha vida!"... A criança sorriu no
berço cor-de-rosa E a mãezinha, a
enfeitar-lhe o corpinho de flor, Exclamou comovida e
venturosa: — "Deus te
abençoe, meu anjo, meu amor!..."
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