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sexta-feira, 1 de novembro de 2019





5.7.9 Provas voluntárias.  Verdadeiro cilício

Perguntam se é permitido abrandar suas próprias provas. Essa pergunta equivale a isto: é permitido ao que se afoga buscar salvar-se? àquele que se espetou num espinho, retirá-lo? àquele que está doente, chamar o médico? As provas têm por fim exercitar a inteligência, assim como a paciência e a resignação. Um homem pode nascer numa posição penosa e embaraçosa, precisamente para obrigá-lo a procurar os meios de vencer as dificuldades. O mérito consiste em suportar sem murmurar as consequências dos males que não se podem evitar, em perseverar na luta, em não se desesperar quando não se sai bem, e nunca em deixar as coisas correrem, que seria mais preguiça do que virtude.
Essa questão leva-nos naturalmente a outra. Desde que Jesus disse: "Bem-aventurados os aflitos", há mérito em buscar aflições, agravando as provas por meio de sofrimentos voluntários? A isso responderei muito claramente: sim, há um grande mérito, quando os sofrimentos e as privações têm por fim o bem do próximo, porque é a caridade pelo sacrifício; não, quando eles só têm por fim o bem próprio, porque é egoísmo por fanatismo.
Aqui há grande distinção a ser feita. No que lhe diz respeito, pessoalmente, contente-se com as provas que Deus lhe envia e não aumente a carga já por vezes tão pesada; aceite-as sem se queixar e com fé. É tudo o que Ele lhe pede. Não enfraqueça seu corpo com privações inúteis e macerações sem objetivo, porque você tem necessidade de todas as suas forças para cumprir sua missão de trabalho na Terra.
Torturar voluntariamente e martirizar seu corpo é infringir a Lei de Deus, que lhe dá os meios de o sustentar e fortalecer. Enfraquecê-lo sem necessidade é um verdadeiro suicídio. Use, mas não abuse: tal é a lei. O abuso das melhores coisas traz sua punição, por suas consequências inevitáveis.
É diferente dos sofrimentos que alguém se impõe para aliviar o próximo. Se você suportar o frio e a fome para agasalhar e alimentar aquele que necessita, e seu corpo sofrer com isso, eis um sacrifício que é abençoado por Deus.
Vocês que deixam seus aposentos perfumados para levar consolação à morada infecta; que sujam suas mãos delicadas curando chagas; que se privam do sono para velar à cabeceira de um doente que é apenas seu irmão em Deus; vocês, enfim, que consomem sua saúde na prática das boas obras, eis seu cilício, verdadeiro e abençoado cilício, porque as alegrias do mundo não ressecaram seus corações. Vocês não adormeceram no seio das enervantes volúpias  da fortuna, mas se transformaram nos anjos consoladores dos pobres deserdados.
Mas vocês que se retiram do mundo para evitar suas seduções e viver no isolamento, qual a sua utilidade na Terra? Onde está sua coragem nas provas, pois que fogem da luta e desertam do combate? Se quiserem um cilício, apliquem-no às suas almas e não aos seus corpos; mortifiquem seu espírito e não sua carne; fustiguem seu orgulho; recebam as humilhações sem se queixarem; magoem seu amor-próprio; fortifiquem-se para a dor da injúria e da calúnia, mais pungentes que a dor física. Eis aí o verdadeiro cilício, cujas feridas lhes serão contadas, porque atestarão sua coragem e sua submissão à vontade de Deus.
Um Anjo da Guarda
Paris, 1863.

Tradução livre do Prof. Dr. Jorge Leite de Oliveira, da terceira edição francesa.

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