EM DIA COM O MACHADO 402
ser e não parecer (Jó)
“To be or not to be” é a famosa
frase de Hamlet, personagem do imortal dramaturgo inglês Shakespeare, do século
XVII. E é com ela que inicio esta crônica, propondo-lhe nova versão: em vez de
“ser ou não ser”, ser e não parecer.
Aliás, esse é o título de um dos
excelentes temas da obra de Vinícius, pseudônimo do escritor espírita Pedro de
Camargo, que nasceu em Piracicaba, São Paulo, no dia 7 de maio de 1878, e
desencarnou na capital paulista, em 11 de outubro de 1966, ou seja, aos 88 anos
de idade. Parece que Deus prioriza longa vida às pessoas boas, que semeiam e,
sobretudo, praticam o bem enquanto prisioneiras da carne.
Às más também... mas ao passo que estas
se remoem no remorso, enquanto não vem o arrependimento de suas ações nefastas;
aquelas estão sempre em paz com Deus, que mora em nossas consciências, além de desfrutarem
da felicidade dos justos...
Não é nosso objetivo escrever sobre a
longa trajetória de vida cristã de Pedro de Camargo, que fundou centro
espírita, presidiu a Sociedade de Cultura Artística e divulgou pelo
rádio, desde 1949, um programa evangélico-espírita. Também não vamos nos deter demasiado
sobre sua condição de orador espírita altamente apreciado e de escritor de
diversas outras obras e artigos espíritas publicados em Reformador,
periódico mensal da Federação Espírita Brasileira.
O que nos motiva a redigir este texto
são as frases que lemos, hoje, e nos fizeram refletir, mais uma vez, na
importância de nosso esforço cotidiano em ser, e não em parecer, cada vez
melhor.
Uns versos de Carlos Drummond de
Andrade que nunca nos esqueceram são estes: “Lutar com as palavras é a luta
mais vã; entanto lutamos, mal rompe a manhã”. Também poderíamos parodiar o
poeta que se intitulava gauche, por recomendação de “um anjo torto” nestas
suas palavras: “Quando nasci, um anjo torto me disse: - Vai, Carlos, ser gauche
na vida”. A paráfrase não é desta frase, e sim dos versos drummondianos
supracitados:
Lutar contra o mal
Das mentes
malvadas
São lutas mui duras;
Entanto, lutemos,
Rompendo alvoradas
E noites escuras.
Agora as três frases de Vinícius:
Se observarmos atentamente o que
se passa na sociedade, verificaremos que tudo se faz, não no sentido de ser,
mas no de parecer.
Realmente, quando se trata de
qualidades e virtudes, é muito mais fácil simulá-las que as adquirir. O
resultado, porém, é que não é o mesmo.
Daí o transformarem a religião em
acervos de dogmas abstrusos e numa série de determinadas cerimônias que se
executam maquinalmente; a eugenia, em arte dos arrebiques; o civismo, em toques
de caixa e de cornetas, executados por indivíduos trajando uniformes; o
patriotismo, em discursos ocos e plataformas pejadas de falazes promessas,
formuladas já com o propósito de não se cumprirem; a política, finalmente, em
processo de explorar o povo.[1]
Sábias palavras para todos nós.
Infelizmente, algumas pessoas farão delas um chicote para açoitar o que
consideram imperfeições alheias, sem, entretanto, se corrigirem de suas
próprias fraquezas. Outras, sedentas de poder, mas hipócritas, pregarão ao
próximo essas e outras frases, ansiosas para que creiam em sua fala;
entretanto, para elas mesmas, as advertências soarão como o bronze que soa, ou
como o vento que sopra...
Aos que nos esforçamos em seguir, como
Pedro de Camargo, “Nas pegadas do Mestre”, sua constatação é mais um incentivo
para que continuemos nos esforçando em ser
fiéis discípulos de Jesus até o fim, sem outro propósito, a não ser o de
sermos coerentes com o que pensamos, falamos e fazemos de bom, verdadeiro e
útil.
[1]
VINÍCIUS. Nas Pegadas do Mestre. 12. ed. Rio de Janeiro: Federação
Espírita Brasileira, 2009, p. 71.
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