EM DIA COM O MACHADO
455:
revisor não é coautor
(Jó)
Encontrei-me, noite passada, com o Bruxo
do Cosme Velho, que, na juventude, exerceu o ofício de revisor. Ele saiu
duma nave fluídica, que atravessou a dimensão espacial e se materializou em meu
escritório. Feliz por revê-lo, saudei-o amigavelmente. Machado retribuiu meu
cumprimento e perguntou-me sobre o que tanto me inquieta ultimamente.
Ocupado com trabalhos revisionais,
perguntei-lhe se ele, que na juventude trabalhara como revisor de textos dos
periódicos Marmota Fluminense e Correio Mercantil, tinha algumas
dicas aos revisores de obras espíritas. Ele, então, propôs-me dez mandamentos:
I
- Respeitarás o autor do texto sobre todas as tuas ciências, com todo o teu
entendimento e de todo o teu coração;
II
– Não substituirás termos doutrem, inda que sejam sinônimos, pelos do teu agrado,
principalmente, se o escritor já estiver no Além;
III
- Não corrigirás destaques, palavras repetidas, em versos e, muito menos,
juntarás estrofes de poemas alheios;
IV
– Uma cousa é uma coisa; outra coisa é uma cousa;
se optei por cousa, não te cabe trocar por coisa; além disso, a
obra que revisas pode ir além-mar, após o acordo ortográfico entre países
lusófonos, onde cousa é a mesma coisa;
V
– Não mudarás o sentido direto pelo indireto, e vice-versa, da frase que não é
tua, ou seja, da frase que não é tua, não mudarás o sentido direto pelo
indireto;
VI – Lembra-te de que adjuntos adverbiais dispensam vírgula no fim da frase;
VII
– Honra o teu editor e a autoria do texto, mas, se discordares dalgo grave que
ambos exigem manter no trabalho sob tua revisão, pede-lhes para excluir teu
nome da citação dos créditos na obra;
VIII
– Não faças qualquer alteração de frases obscuras à revelia do autor;
IX
- Não atualizes nem mudes referências citadas pelo autor, salvo se tiveres
certeza de que estão erradas;
X
– Não ambiciones ser coautor da obra, inda que contribuas, com a anuência do
autor, na correção de datas, concordância, regência, ortografia, coerência, vírgulas,
acréscimos autorizados por ele, ponto final.
Dito isso, Machado de Assis deu-me um
abraço, desejou-me saúde, neste mundo em transição, retornou à nave e acenou-me
adeus.
Disse-lhe muito obrigado e passei a
refletir...
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