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sábado, 1 de maio de 2021

 

A ingratidão dos filhos e os laços de família  - Agostinho (conclusão)

 

     


    Desde o berço, a criança manifesta os instintos bons ou maus que traz de sua existência anterior. É para estudá-los que devemos nos aplicar. Todos os males iniciam-se no egoísmo e no orgulho. Espreitem, pois, os menores sinais que revelam o germe desses vícios, e tratem de combatê-los, antes que eles lancem raízes profundas. Façam como o bom jardineiro, que arranca os brotos daninhos à medida que os vê apontar na árvore. Se vocês deixarem desenvolver-se o egoísmo e o orgulho, não se espantem de ser pagos mais tarde com ingratidão.

Quando os pais fizeram tudo para o adiantamento moral dos filhos, se não conseguiram êxito, não têm do que lamentar, e sua consciência pode estar tranquila. Quanto à amargura muito natural que experimentam, pelo insucesso de seus esforços, Deus reserva-lhes uma grande, imensa consolação, pela certeza de que é apenas um atraso momentâneo, e que lhes será dado acabarem noutra existência a obra então começada, e que um dia o filho ingrato os recompensará com o seu amor (Ver cap. 13, it. 19).

Deus não coloca as provas acima das forças daquele que as pede; só permite as que podem ser cumpridas; se isto não se verifica, não é por falta de possibilidades, mas de vontade, pois quantos existem que, em lugar de resistir aos maus arrastamentos, neles se comprazem. É para estes que estão reservados o choro e lamentações, em suas existências posteriores.

Admirem, porém, a bondade de Deus, que não fecha jamais a porta ao arrependido. Um dia surge em que o culpado se cansa de sofrer, e seu orgulho é por fim abatido. É então que Deus abre os braços paternais para o filho pródigo que se lança aos seus pés. Provas fortes, ouça-me bem, quase sempre são o sinal do fim do sofrimento e do aperfeiçoamento do Espírito, quando são aceitas diante de Deus. É um momento supremo em que, sobretudo, importa não falir pela murmuração, se não se quiser perder o fruto da prova e ter de recomeçar.

Em vez de reclamarem, agradeçam a Deus, que lhes oferece a ocasião de vencer, para lhes dar o prêmio da vitória. Então, quando, saídos do turbilhão do mundo terrestre, vocês entrarem no mundo dos Espíritos, serão ali aclamados, como o soldado que saiu vitorioso do meio da luta.

De todas as provas, as mais penosas são as que afetam o coração. Alguém que suporta com coragem a miséria das privações materiais, sucumbe ao peso das amarguras domésticas, machucado pela ingratidão dos seus. Oh, é uma pungente angústia isso! Mas que pode, nessas circunstâncias, reerguer a coragem moral, senão o conhecimento das causas do mal, e a certeza de que, se há longas dilacerações, não há desesperos eternos, apesar disso? Pois não é da vontade de Deus que sua criatura sofra para sempre.

Que há de mais consolador, de mais encorajador, do que esse pensamento de que depende de si, de seus próprios esforços, abreviar o sofrimento, destruindo em si as causas do mal? Mas, para isso, é necessário não reter o olhar na Terra e só ver uma existência. O olhar precisa elevar-se, pairar no infinito do passado e do futuro. Então, a grande justiça de Deus se revela a seus olhos. Esperem com paciência, porque isso lhes explica o que lhes parecia monstruosidades da Terra. Então, os ferimentos que vocês receberam não lhes parecem mais que simples arranhaduras. Nesse golpe de vista lançado sobre o conjunto, os laços de família aparecem no seu verdadeiro sentido. Com a reencarnação, já não são mais os laços frágeis da matéria que ligam seus membros, mas os laços duráveis do Espírito, que se perpetuam e se consolidam ao se depurarem, em vez de se quebrarem.

Os Espíritos que a semelhança de gostos, identidade de progresso moral e de afeição levam a reunir-se, formam famílias. Esses mesmos Espíritos, nas suas migrações terrenas, buscam-se para agrupar-se, como faziam no espaço, dando origem às famílias unidas e homogêneas. E se, nas suas peregrinações, eles são momentaneamente separados, mais tarde se reencontram, felizes pelos seus novos progressos.

Mas como não devem trabalhar somente para si mesmos, Deus permite que Espíritos menos adiantados venham encarnar-se entre eles, a fim de receberem conselhos e bons exemplos, no interesse do seu próprio progresso. Estes causam, às vezes, problemas, mas esta é a prova, esta é a tarefa. Acolham-nos, pois, como irmãos; ajudem-nos e, mais tarde, no mundo dos Espíritos, a família se felicitará por haver salvado do naufrágio os que, por sua vez, poderão salvar outros.

 

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