manifestações espíritas
Jorge
Leite de Oliveira
O
livro dos médiuns, de Allan Kardec, desenvolve o aspecto
científico do Espiritismo. O conteúdo dessa obra abrange duas partes. A
primeira intitula-se Noções Preliminares;
a segunda chama-se Manifestações Espíritas.
É sobre isto que trataremos.
Kardec
informa-nos sobre as aptidões especiais de alguns médiuns: “Ao lado da aptidão
do Espírito, existe a do médium, que é, para o primeiro, instrumento mais ou
menos cômodo [...] e no qual ele descobre qualidades particulares [...]” (KARDEC,
2009, it. 185). Há duas categorias de médiuns: a) de efeitos físicos; b) de efeitos
intelectuais (id., it. 187).
Tendo em vista que os “efeitos físicos”
foram pesquisados, observados, analisados e, por fim, confirmados, em sua
autenticidade, por diversos sábios, enfocaremos abaixo alguns desses fenômenos.
São eles: a) translações e suspensões;
b) aparições; e c) transportes.
A translação aérea e a suspensão de corpos
no espaço, neste último caso incluindo os do próprio médium, são fenômenos
mediúnicos bastante raros, informa Kardec (2009, it. 189). Ao lhe ser
perguntado se fenômenos como esses não contrariariam as leis naturais, o
Espírito São Luís responde ao Codificador que só os Espíritos superiores estão
em condições de conhecer todas as leis da Natureza (op. cit., it. 74).
Kardec explica, em seguida, que o fluido universal, agente básico das manifestações,
por conter o “princípio da vida”, responsável pelo fenômeno de suspensão de corpos
no espaço ou de translação aérea, recebe a impulsão fluídica do períspirito do
Espírito ou do médium. A emanação do “fluido animalizado” pode ser mais ou
menos farta e sua combinação, além de nem sempre ser fácil, é intermitente. Por
isso, nem sempre ocorre o fenômeno, que também não depende apenas da vontade do
médium para se realizar.
Ao ser movimentado, erguido ou atirado ao
ar um objeto, “O Espírito o satura,
por assim dizer, com o seu fluido, combinado com o fluido do médium, e o
objeto, momentaneamente vivificado desta maneira”, por não possuir “[...] vontade
própria, segue o impulso que lhe dá a vontade do Espírito” (op. cit.,
it. 77).
As propriedades do períspirito é que
permitem ao agente desencarnado, como ao encarnado, esse fenômeno. Kardec cita,
como exemplo, o “poderoso médium de efeitos físicos”, muito conhecido em sua
época, Daniel Dunglas Home, e conclui que, se o Espírito pode “[...] levantar
uma poltrona, também é capaz, se tiver força suficiente, de levantá-la com uma
pessoa sentada nela. Aí está a explicação do fenômeno que o Sr. Home produziu
inúmeras vezes consigo mesmo e com outras pessoas” (id, ibid., it. 80).
Em defesa do médium Dunglas Home, que foi,
por vezes, criticado em sua época, sem que jamais encontrassem prova concreta
de fraude provocada por ele, esclarece Kardec que Home nunca aceitou pagamento
pelos fenômenos provocados por sua mediunidade. Nunca fez de sua mediunidade
meio profissional, ciente de que “[...] Não há um só médium no mundo que possa
garantir a produção de um fenômeno espírita num dado momento, donde forçoso é
concluir que a pretensão contrária dá prova de absoluta ignorância dos mais
elementares princípios da ciência [...]” (KARDEC, 2004a, p. 55 O Sr. Home em
Roma).
Um dos estudiosos sobre a vida e
mediunidade de Home foi Arthur Conan Doyle. Diz este que em mais de uma centena
de ocasiões, com claridade boa e ante respeitáveis testemunhas, Dunglas Home
levitou. E prossegue dizendo:
Em 1857, num castelo próximo de Bordeaux,
Home foi levantado até o teto de uma sala alta, em presença de Madame Ducos,
viúva do ministro da Marinha, do conde e da condessa de Beaumont. Em 1860,
Robert Bell escreveu, no Cornhill, um
artigo intitulado Mais estranho do que a
ficção. “Ele elevou-se de sua cadeira [diz Bell] quatro a 5 pés do solo.
Vimo-lo passar de um lado a outro da janela, com os pés para frente, deitado
horizontalmente, no ar”. Dr. Gully, de Malvern, médico muito conhecido, e
Robert Chambers, autor e editor, eram as outras testemunhas (DOYLE, 2013, cap.
9, p. 168- 169 A carreira de Daniel Dunglas Home).
Home foi o médium mais completo de translações e
suspensões de corpos no espaço, durante o século XIX. Adilton Pugliese (2013)
organizou obra sobre a importância desse médium, que teve o reconhecimento, não
apenas de Kardec, mas de muitos outros pesquisadores dos fenômenos espíritas.
Em sua apresentação, Pugliese sintetiza a grandeza de Home com as seguintes
palavras do Sr. Webster: “Ele é o mais maravilhoso missionário dos tempos
modernos e da maior de todas as causas, e o bem que ele tem feito não pode ser
avaliado. Quando Mr. Home passa, derrama em seu redor a maior de todas as
bênçãos – a certeza da vida futura” (op. cit., p. 22).
A mediunidade de
aparições é a que pode “provocar aparições fluídicas ou tangíveis, visíveis
para os assistentes. Excepcionais”, diz Kardec (2009, it. 189). É quase sempre
espontânea e necessita de uma faculdade especial, para que o Espírito se
manifeste a alguém (op. cit., cap. 6, it. 100, perg. 27).
Allan Kardec esclarece que, nesse caso, quando o Espírito
deseja mostrar-se com a aparência física, em certos casos, pode tornar-se tão
real que é possível tocá-lo, apalpá-lo, senti-lo com a mesma resistência que
possui um corpo humano normal. Isso, porém, não impede seu desaparecimento com
a mesma rapidez que o seu surgimento. Desse modo, tanto a visão, como o tato
são utilizados por quem o Espírito deseja se manifestar. Ainda que se pudesse
“atribuir à ilusão ou a uma espécie de fascinação a aparição simplesmente
visual, a dúvida já não seria possível quando conseguimos segurá-la, palpá-la, e
quando ela mesma nos segura e abraça” (KARDEC, 2009, it. 104).
Alexandre Aksakof (1978) demonstra à saciedade a
inconsistência das teorias materialistas para contestar tal manifestação do
Espírito, cujo objetivo principal foi comprovar-nos sua sobrevivência após a
morte do corpo físico. A excelente obra de Aksakof refuta as teorias do
filósofo alemão, Dr. Eduardo von Hartmann, que atribuiu os fenômenos de
aparições e materializações à alucinação e criou a teoria do animismo para
explicar todas as manifestações mediúnicas.
Em defesa do caráter não alucinatório da materialização
de um Espírito, Aksakof utiliza quatro argumentos: 1º) o “testemunho visual
simultâneo de muitas pessoas”, entre as quais sábios como ele, Ernesto Bozzano,
Willian Crookes, Charles Richet etc.; 2º) o “testemunho visual e tátil,
simultâneo, de muitas pessoas”, em geral sob rigorosas condições
preestabelecidas pelos sábios presentes. Por vezes, até mesmo com sacrifícios
físicos proporcionados ao médium, para evitar sua fraude, como amarrá-lo a uma
cadeira, colocá-lo dentro de cabines rigorosamente fechadas etc., como fizeram,
no Pará, com a médium Anna Prado; 3º) a “produção de efeitos físicos”.
Refutando a teoria de Hartmann sobre ser esse um fenômeno meramente
alucinatório, Aksakof informa que “o deslocamento de objetos, verificado após a
sessão, pode servir de prova de que esse deslocamento foi real, objetivo”; 4º)
“produção de efeitos físicos duradouros”, como o dos moldes em gesso de mãos
fechadas que só poderiam ser retiradas do molde, sem lhe provocar dano algum,
se as mãos se desmaterializassem, qual ocorria. Alguns desses moldes, até os
dias atuais, se encontram intactos, como os que vimos, há alguns anos, na sede
histórica da Federação Espírita Brasileira, na Av. Passos (RJ).
Outra mediunidade excepcional é a de transporte, variedade de médiuns motores e de translações, segundo
Allan Kardec. Esses médiuns podem servir como auxiliares dos Espíritos que
desejam transportar, de locais fora do ambiente em que estão, objetos materiais
diversos.
Explica Kardec (2009, it. 96) que o Espírito que produz
tal fenômeno é de boa índole. O Espírito traz, espontaneamente ou a pedido,
objetos que não se encontram no local onde são observados, tais como “flores”,
“frutos”, “doces”, “joias” etc.
Esse tipo de mediunidade precisa ser muito bem
comprovado, para evitarem-se fraudes. Para a produção do fenômeno, é necessário
haver perfeita combinação entre o fluido fornecido pelo perispírito do médium e
o do Espírito (op. cit., it. 99). Aksakof cita o caso do transporte de uma
fotografia de Londres a Lowestoft, cidades inglesas distantes 175 km uma da
outra (AKSAKOF, 1978, p. 211).
O século XIX, especialmente a partir de
sua quarta década, foi destinado por Jesus Cristo a combater o materialismo e
trazer ao mundo as provas da imortalidade espiritual e das consequências boas
ou más do uso que fizermos do nosso livre-arbítrio. São muitas, as obras de
pesquisadores sérios, além de Allan Kardec, que relatam os fenômenos mediúnicos
de efeitos físicos, com provas baseadas na observação e experimentação, que são
os métodos científicos propostos pelo Codificador do Espiritismo para comprovar
a sobrevivência da alma e sua comunicação após a vida física.
Atualmente, algumas correntes científicas
e filosóficas materialistas tentam negar o domínio da vontade individual sobre
as manifestações físicas, baseados em desorganização cerebral provocada por
doenças. Entretanto, se lessem com atenção as respostas dos Espíritos a Allan
Kardec sobre o assunto, veriam que estão tomando o efeito pela causa.
Quando Kardec refere-se à questão da
influência dos órgãos sobre as faculdades mentais, em O livro dos espíritos, recebe este esclarecimento fundamental a que
não tenhamos dúvida alguma sobre a interdependência espírito-matéria: “Nunca
dissemos que os órgãos não têm influência. Têm-na muito grande sobre a
manifestação das faculdades, mas não são eles a origem destas [...]”. Ao que
Kardec comenta, logo abaixo:
Importa se distinga o estado normal
do estado patológico. No primeiro, o moral vence os obstáculos que a matéria
lhe opõe. Há, porém, casos em que a matéria oferece tal resistência que as
manifestações anímicas ficam obstadas ou desnaturadas, como nos de idiotismo e
de loucura. São casos patológicos e, não gozando nesse estado a alma de toda a
sua liberdade, a própria lei humana a isenta da responsabilidade de seus atos
(KARDEC, 2013, q. 372).
O Espiritismo, diz Carlos Imbassahy
(1983, p. 385), tem o objetivo de proporcionar o “aperfeiçoamento de
Humanidade”, com a demonstração cabal da sobrevivência de nossa alma, após a
existência física, pelos Espíritos. Todo esse trabalho, que vem aperfeiçoando-se,
atualmente, é presidido pelo Espírito da Verdade, representante de Jesus Cristo
entre nós.
Kardec (2004b, p. 504) prevê seis
períodos para o Espiritismo: o primeiro foi o da curiosidade, em que as manifestações físicas se propagaram em toda
parte; o segundo, com o surgimento de O
livro dos espíritos, foi o filosófico,
que deu origem ao terceiro, o de luta,
justamente com o ataque às manifestações mediúnicas. Esse período originou o
religioso, e ainda dois outros períodos foram previstos: o intermediário e o da
regeneração social.
Tais períodos, entretanto,
misturam-se, como ocorreu com o das manifestações físicas, necessário à
satisfação, não somente da curiosidade, como também da investigação e das
consequências filosóficas e morais. Ainda hoje, porém, o Espiritismo trava uma
“guerra surda”, como foi anunciada pelo Espírito Erasto, em que a tortura será
moral, com armação de ciladas,
[...] tanto mais perigosas quanto
usarão mãos amigas; agirão na sombra; recebereis golpes, sem que saibais de
onde partem, e sereis feridos em pleno peito pelas setas envenenadas da
calúnia. Nada faltará às vossas dores; suscitarão defecções em vossas fileiras
e os pretensos espíritas, perdidos pelo orgulho e pela vaidade, se prevalecerão
de sua independência, exclamando: “Somos nós que estamos no reto caminho!”, a
fim de que os vossos adversários natos possam dizer: “Vede como são unidos!”
Tentarão semear o joio entre os grupos, provocando a formação de grupos
dissidentes; cooptarão os vossos médiuns para fazê-los entrar no mau caminho ou
para os desviar dos grupos sérios; empregarão a intimidação para uns, a
captação para os outros; explorarão todas as fraquezas. Depois, não esqueçais
que alguns viram no Espiritismo um papel a desempenhar, e um papel de primazia,
que hoje experimentam mais de uma desilusão em sua ambição. Prometer-lhes-ão de
um lado o que não puderem achar no outro. Depois, enfim, com dinheiro, tão
poderoso em vosso século atrasado, não poderão encontrar comparsas para
representar indignas comédias, visando a lançar o descrédito e o ridículo sobre
a doutrina?
[...]
Coragem e perseverança, meus filhos!
pensai que Deus vos olha e vos julga; lembrai-vos também de que os vossos guias
espirituais não vos abandonarão enquanto vos acharem no caminho certo. Aliás,
toda esta guerra só terá um tempo e se voltará contra os que julgavam criar
armas contra a Doutrina. O triunfo, e não mais o holocausto sangrento,
irradiará do Gólgota espírita [...] (Erasto. In: KARDEC, 2004b, p. 508- 9 Instrução
dos Espíritos, it. A guerra surda).
Já se antecipando a esse período de lutas, que
não ocorreria somente em sua época, mas ainda nos tempos atuais, diz Kardec, na
conclusão de O livro dos espíritos:
“Falsíssima ideia formaria do Espiritismo quem julgasse que a sua força lhe vem
da prática das manifestações materiais e que, portanto, obstando-se a tais
manifestações, se lhe terá minado a base. Sua força está na sua filosofia, no
apelo que dirige à razão, ao bom senso [...]” (KARDEC, 2013, it. 6, p. 467).
Confiemos em Deus, em Jesus e façamos como nos recomenda o Espírito Erasto, na
bela mensagem transcrita acima: oremos e vigiemos, pois Jesus segue à frente, e
a vitória é do Bem.
REFERÊNCIAS
AKSAKOF,
Alexandre. Animismo e espiritismo. Trad.
Dr. C. S. 3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978, 2 v.
DOYLE,
Arthur Conan. A história do
espiritualismo. Trad. José Carlos da Silva Silveira 1. ed. 1. imp.
Brasília: FEB, 2013.
IMBASSAHY,
Carlos. O espiritismo à luz dos fatos.
3. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1983.
KARDEC,
Allan. O livro dos médiuns. Trad. Evandro
Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: FEB, 2009.
______.
O livro dos espíritos. Trad. Guillon
Ribeiro. 93. ed. hist. Brasília: FEB, 2013.
______.
Revista Espírita 1864.Trad. Evandro
Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: FEB, 2004a.
______.
Revista Espírita 1863.Trad. Evandro
Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: FEB, 2004b.
MAGALHÃES,
Samuel Nunes. Anna Prado, a mulher que
falava com os mortos. Brasília: FEB, 2012.
PUGLIESE,
Adilton. Daniel Dunglas Home, o médium voador.
Santo André, SP: EBM, 2013.
(Publicado em Reformador, periódico mensal da FEB, em abril de
2018.)
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