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sábado, 15 de outubro de 2022

 



EM DIA COM O MACHADO 545:
ÀS ALMAS IRMÃS! (Jó)

                    Salve, alma querida!

            Estou lendo obra interessante, que recomendo a todos os espíritas cristãos e aos cristãos de modo geral. Trata-se do livro de Bittencourt Sampaio, publicado pela Federação Espírita Brasileira. O título dele é A Divina Epopeia, e o assunto principal de que trata é a reprodução parafraseada de todo o evangelho de João, em versos decassílabos livres.

            Agora mesmo, revendo um poema de Machado de Assis, percebi que Bittencourt e o Bruxo do Cosme Velho utilizam semelhante processo de versificação em seus poemas, no estilo canto, quando Machado, em sua obra intitulada O Almada, poema herói-cômico em oito cantos, como Bittencourt, também versifica suas estrofes em decassílabos, cujo fragmento de verso final de cada estrofe, por vezes, é completado no início da estrofe seguinte.

            Bem mais extenso do que O Almada, o evangelho de João  é relatado em 21 cantos. O objetivo aqui é não somente comparar a estrutura de cada poema, mas também mostrar a diferença do objetivo dos seus autores. Machado explica, antes dos seus oito cantos, que o tema de seu poema “é rigorosamente histórico” e, mais adiante, diz que buscou o cômico “no contraste da causa com seus efeitos”. Bittencourt, ao contrário, busca o aspecto espiritual da vida e obra de Jesus em seus cantos.

            Começo por duas estrofes do Canto IV  d’O Almada: 

                     XIII

Assim falou Almada, e toda a mesa
Lhe aprovou o discurso. O Vilalobos,
Em quem os olhos fita o grão prelado,
Algum tempo medita um bom alvitre,
E ia já começar a sua arenga
Quando o astuto Veloso a vez lhe toma:
“Minha ideia, senhor, é que esse infame
Nem alma, nem vigor, nem bizarria
Houve do céu e que abater-lhe a proa
O mesmo vale que esmagar brincando
Uma pulga, um mosquito, uma formiga.
Mas porque seja bom tapar a boca
Aos vadios da terra, e porque vale,
Em certos casos, afetar nas formas
Tal ou qual mansidão, que não existe,
Cuido que em lhe mandando uma embaixada
A exigir-lhe a devassa...”

                      XIV

                                             “Nunca!Nunca!
(Interrompe o vigário). Uma embaixada!
E tal cousa, senhor, nascer-lhe pode
Tratar de igual a igual a um bigorrilhas!
No claro entendimento: Todo o lustre,
Valor e autoridade a igreja perde
Se não falar de cima ao tal pedante,
Com desprezo, com asco. Em boa regra,
Cortesia demanda cortesia;
Mas um vilão que a processar se atreve
Os prelados da casa do prelado,
Em vez de uma embaixada, merecia
Nas costas uma dose de cacete.
[...]

 

                                             Recorto agora fragmentos de duas estrofes do Canto XIX d’A Divina Epopeia: 

Então Pilatos a Jesus tomando,
O mandou açoitar. E já de espinhos
Fazendo-lhe os soldados uma  coroa,
Sobre a sua cabeça a colocaram;
E puseram-lhe um manto cor de púrpura.
Depois vinham dizer-lhe: “Deus te salve,
Rei dos judeus!” E bofetadas davam-lhe.
[...]
 
Os príncipes dos padres e o seu povo,
Ao vê-lo assim bradaram:
                                             — “Crucifica-o!
Crucifica-o!” E disse-lhes Pilatos:
— “Tomai-o vós então, crucificai-o;
Porque crime nenhum eu nele encontro.”
 

            Crucificado e martirizado, Jesus retorna à vida dias depois, para nos provar que o bem sempre vencerá o mal. E, ao partir definitivamente para o reino divino, deixa-nos a certeza de que, ainda que nos matem o corpo, o espírito sobreviverá, pois somos imortais, e a Terra é local de expiações e provas.

       Termino com estes versos, do grande Cruz e Sousa, dedicados aos meus queridos seguidores e leitores: 

 Mas as almas irmãs, almas eleitas,
                                        Hão de trocar, nas regiões perfeitas,
                                        Largos, profundos, imortais abraços!
 

(Sousa, Cruz e. Longe de tudo. In: Cruz e Sousa: poesia. Rio de Janeiro: Agir, 1982 (Nossos clássicos; 4).

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