Páginas

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

 

ANÁLISE COMPARATIVA ESPÍRITA DE SONETOS DE CRUZ E SOUSA – V

 

        Diz Henriqueta Lisboa que em Últimos sonetos podemos achar a

 

[...] verdadeira via crucis do poeta e, ao mesmo tempo, a sua cabal expressão. Não apenas o homem se engrandeceu através da dor, cristalizando cada vez mais o ser moral que o integrava, como também o artista, abismado no sofrimento, pôde tocar suas mesmas raízes, capacitando-se para mais nítidas revelações" (In COUTINHO, 1979, p. 224).

 

        Estariam presentes em Últimos sonetos, segundo a crítica citada: "a dor superada", que eu retificaria para a dor suprema, dor moral, mais pungente que a dor física. Também, segundo Lisboa, podemos encontrar, na poesia do poeta, "o culto da beleza", "o sentimento do orgulho" e "a ideia da morte" (op. cit., p. 227- 236).

        "O sentimento do orgulho" expressar-se-ia, em seu livro final, no qual ocultar-se-ia a alma cristã, como podemos ler no soneto intitulado:  

 

Grandeza Oculta

 

  • Estes vão para as guerras inclementes,
  • Os absurdos heróis sanguinolentos,
  • Alvoroçados, tontos e sedentos
  • Do clamor e dos ecos estridentes;
  •  
  • Aqueles para os frívolos e ardentes
  • Prazeres de acres inebriamentos:
  • Vinhos, mulheres, arrebatamentos
  • De luxúrias carnais, impenitentes.
  •  
  • Mas Tu, que na alma a imensidade fechas,
  • Que abriste com teu gênio fundas brechas
  • No mundo vil onde a maldade exulta,
  •  
  • Ó delicado espírito de Lendas!
  • Fica nas tuas Graças estupendas,
  • No sentimento da grandeza oculta.

 

        Destaco, dos comentários de Lisboa, a seguinte frase: "A força que alimentava seu estro — sonho de ascensão — tocou-se de sublimidade" (op. cit., p. 232). Concordo com Henriqueta. O extraordinário vate é inspirado pelas Vozes do Alto, sobre a grande diferença que existe entre as pessoas que vivem para as glórias efêmeras e paixões do mundo e aquelas que se inebriam com as "Graças estupendas" reservadas a quem supera a matéria e vara "no mundo vil" as brechas que as elevam à dimensão espiritual.

            A seguir, o poema psicografado por Chico Xavier:


 Vozes

 

  • Há sobre os prantos, há sobre as humanas
  • Vozes que se lamentam nas torturas,
  • Outras vozes mais doces e mais puras,
  • Como um coro dulcíssimo de hosanas.
  •  
  • As primeiras são feitas de amarguras,
  • As segundas, de bênçãos soberanas,
  • Sobre as dores sagradas ou profanas
  • Que pululam nas sendas mais escuras.
  •  
  • Sobe da Terra a queixa soluçando,
  • Silenciosa, muda, suplicando,
  • Remontando aos Espaços constelados;
  •  
  • Desce dos Céus a voz amiga e mansa,
  • Fortificando a vida da Esperança
  • — Patrimônio dos seres desgraçados.

 

          Este soneto parece confirmar o outro. É a resposta da Dimensão Espiritual, agora acessada pelo Espírito Cruz e Sousa, que confirma suas esperanças externadas em seus poemas enquanto estagiou na Terra com o corpo físico.

        Quando o poeta diz "Há sobre os prantos, há sobre as humanas/ Vozes que se lamentam nas torturas,/ Outras vozes mais doces e mais puras" refere-se à atuação dos nossos anjos da guarda e espíritos protetores que nos acompanham por toda a existência. Entristecem-se com nosso pessimismo, nossas faltas, mas alegram-se com nossas superações do mal. São essas as vozes que descem dos Céus e nos dão esperança sobre uma existência melhor que aguarda a todos aqueles que suportam e superam suas "dores sagradas ou profanas". Muito mais do que crer nisso, estar certo disso é o que faz das almas elevadas um modelo de vida para todos nós. E não foi outra coisa o que o Cristo veio nos dizer e confirmar, quando nos provou que apenas a matéria é perecível, mas o espírito é imortal.

 

Referências

 

COUTINHO, Afrânio. Cruz e Sousa: coletânea. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1979 (Col. Fortuna Crítica, v. 4).

XAVIER, Francisco Cândido. Parnaso de além-túmulo. 19. ed. 6. imp. Brasília: FEB, 2019.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

  O Sol (Irmão Jó) Num universo de bilhões de estrelas, Uma delas, anã para os astrônomos, Gigante para os mundos perto dela, É o ...