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quarta-feira, 23 de março de 2022

 A SUBLIME POESIA DO ESPÍRITO MARIA DOLORES

A promoção
 
Resplendia o jardim celeste em pleno Espaço.
Era o maravilhoso dia
De alto deslumbramento
Do encontro de união e de alegria
Dos que haviam servido, passo a passo,
Nas tarefas do amor sem recompensa
Na Terra, onde o egoísmo
Tanta vez se condensa.
 
Era uma nesga azul de solo rarefeito
Matizada de flores
Bordadas de arabescos multicores
Onde podia respirar apenas
quem já pudesse irradiar
As vibrações serenas
Da fé sublime alçada ao bem perfeito.
 
Não eram muitos os conquistadores
Daquela posição de excelsos resplendores;
Quarenta e dois Espíritos somente,
Todos eles modelos de bondade,
Eram ali o escol da Humanidade,
Em atitude calma e reverente
Esperando a sonhada promoção
Que constaria do poder
de elevar-se à próxima ascensão.
 
Na luminosa e ilustre confraria
Estavam sacerdotes de renome,
Filósofos, notáveis pensadores,
Nobres mulheres, santas heroínas,
Monges mostrando frontes peregrinas,
Jovens que haviam sido vencedores
De tentações terríveis...
Todos trocavam frases de altos níveis...
Somente alguém, ali, em meio a tudo,
Que era festa de brilho e de beleza,
Parecia um mendigo triste e mudo,
Era o irmão Jonaquim,
Desconhecido entre os demais...
Vestia-se com peles de animais,
Remarcadas de lama...
Na expressão rude e feia,
Exibia sinais de sangue, lodo e areia;
Jazia ele a um canto, humilde e pensativo,
Enquanto o grupo conversava em festa.
 
Chegando o instante, enfim,
Da nobre promoção;
Aquele dos presentes que tivesse
O menor peso espiritual
Seria alçado à frente
Do caminho esplendente
Para mansões mais altas e mais belas
Da Vida Universal.
 
Vieram ao recinto os dois encarregados,
Ambos chamados Anjos da Balança,
E os candidatos sem qualquer despeito,
deixaram-se pesar num instrumento perfeito
Que lhes patenteava
A evolução imensa...
E o peso de cada um
Era leve, tão leve,
Que não se via quase
Uma pequena base
Para que se notasse a diferença...
 
O recatado Jonaquim
Ficou de longe, muito ao longe,
E sendo o último no exame
foi chamado por fim.
Ele veio acanhado,
Pés descalços no apoio de um bordão,
E um dos dois mensageiros perguntou:
— Jonaquim, meu irmão,
Dizei: qual foi na Terra a vossa religião?
Precisamos aqui de vossos dados
Para serem por nós
Devidamente revisados.
 
No entanto, Jonaquim, humilde, respondeu:
— Anjo bom, sou sincero... Crede!...
Eu Não tive sobre a Terra a fé pregada,
Acreditei, como acredito agora
Na presença de Deus que nos guarda e aprimora,
Entretanto,
Por mais que eu desejasse procurar
Um templo ou algum lugar
Para aprender como se adora a Deus,
Nunca pude sair
Da choça em que morei, ao pé de antiga estrada,
Onde os que sofrem eram irmãos meus...
Era um deserto a terra em que vivi...
Despendi muito tempo
A transportar crianças e doentes
Que ansiavam por água em solos diferentes...
Minha estreita choupana
Era uma porta aberta à desventura humana...
Ouvi a confissão de míseros velhinhos
Que clamavam, em vão, pelos parentes,
Agonizando, desvalidos,
E aguardando, debalde, os próprios descendentes...
De quantos eu cerrei, na morte, os olhos baços
Não saberei o número por certo...
Só Deus sabe os que vi morrendo nos meus braços
E os que enterrei, a sós, na penúria sem nome,
E as crianças sem apoio que me buscavam,
Sentindo sede e fome...
Deus me perdoe se nunca fui às crenças
Para estudar a fé e entender diferenças...
Ouvi dizer, na Terra, que houve um homem
Que nunca descansou, fazendo o bem,
Que amou aos bons e aos maus sem ferir a ninguém!...
Ah! Como desejava tê-lo visto!...
Dizem que se chamava Jesus Cristo;
Nunca lhe ouvi, no mundo, os lúcidos ensinos
E ouvi também dizer que por serem divinos
Ele morreu na cruz...
 
A pequena assembleia
Escutava expectante e enternecida
Aquele que soubera amenizar a vida.
E os Anjos da Balança
Puseram Jonaquim, sob exame preciso,
Em nome de Jesus...
Depois anunciaram num sorriso
Que o velho Jonaquim tinha o peso da luz.
 
MARIA DOLORES (Espírito). Coração e Vida. Psicog. Chico Xavier. São Paulo, SP: IDEAL, 1978, cap. 8.

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