CERCAS Alma querida, escuta: Em tuas horas lentas De inquietação,
insegurança e luta, Amargura e cansaço, Ouvimos nós, noutros
campos do Espaço, As falas mudas que nos
apresentas. Muitas vezes,
interrogas na oração De espírito espantado e
sofredor: – “Se tudo o que
esperei foi sonho vão, Por que amarei assim,
sem ter amor? Por que me consagrar a
filhos que amo tanto, Se me ofertam por
triste recompensa A incompreensão imensa Que me encharca de
pranto? Por que me dedicar com
tanto empenho Ao lar que me magoa No qual ninguém anota
as lágrimas que eu tenho Nem considera a cruz
que me agrilhoa? Que motivo me leva a
entregar-me de todo A certo coração que me
espezinha Que me cobre de lodo Depois de ironizar a
esperança que eu tinha? Que razão me conserva a
consciência Presa a determinado
compromisso, Se aqueles que mais amo
na existência Não querem saber
disso”? Dói-nos ouvir, no Além,
a angústia com que indagas, Mostrando o coração
aberto em chagas... É um esposo distante, é
uma esposa esquecida Do trabalho de paz que
abraçou para a vida, É um filhinho doente, Gradeado num leito
merencório, É um parente infeliz em
sanatório, É uma pessoa amiga a
gritar-nos em rosto Acusações sem base em
vinagre e censura, A fazer-nos enfermos de
desgosto Ou cansados de dor, às
portas da loucura... Inda que tudo isso te
aconteça, Não fujas, alma boa, Tolera a quem te fira,
ama, perdoa, Sem que a força do amor
se te arrefeça. Não fossem as prisões
que nos guardam no mundo, Duros grilhões, sem
formas definidas, Voltaríamos nós aos
erros de outras vidas Em delírio profundo... A prova que te oprime
em ásperas refregas, O peso enorme dos
tormentos teus, E a dor da obrigação
nas cruzes que carregas São as cercas de Deus. DOLORES, Maria. A vida conta. Psicografia de F. C. Xavier.
1980.
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