27.4 Preces inteligíveis Se
eu não entender o que significam as palavras, serei um bárbaro para aquele a
quem falo; e o que fala será para mim um bárbaro.
Se eu orar numa língua que não entendo, meu coração
ora, mas meu entendimento fica sem fruto. Se você somente louvar a Deus de
coração, como é que um homem do número dos que só entendem sua própria língua
responderá amém, ao fim de sua
ação de graça, visto não entender o que você diz? Não é que sua ação não seja
boa, mas os outros não se edificam com ela (Paulo, l Cor. 14:11, 14,
16-17). A oração só tem valor pelo pensamento associado a ela.
Ora, é impossível associar um pensamento àquilo que
não se compreende, pois o que não se compreende não pode tocar o coração. Para
a imensa maioria, as orações numa língua desconhecida são apenas palavras que
nada dizem à mente. Para que a prece toque o coração é necessário que cada
palavra revele uma ideia, e se não a compreendermos, ela não pode revelar ideia
nenhuma. Será repetida como simples fórmula, cuja virtude dependerá
do maior ou menor número de suas repetições. Muitos oram por dever, alguns,
mesmo, para seguir os costumes, pelo que se julgam quites depois de uma prece repetida por certo número de vezes e
segundo determinada ordem. Deus lê no fundo dos corações; ele vê o pensamento e
a sinceridade; e é rebaixá-lo acreditá-lo mais sensível à forma do que ao fundo
(cap. 28, it. 2). 27.5 Da prece pelos
mortos e pelos espíritos sofredores A prece é solicitada pelos espíritos sofredores, ela lhes
é útil, pois ao verem que são lembrados, sentem-se menos abandonados e menos
infelizes. Mas a prece tem sobre eles uma
ação mais direta: reergue-lhes a coragem, excita-lhes o desejo de se elevarem, pelo
arrependimento e pela reparação, e pode desviá-los do pensamento do mal. É
nesse sentido que ela pode não somente aliviar, mas abreviar-lhes os
sofrimentos (O céu e o inferno, 2.ª parte: exemplos). Algumas pessoas não admitem a prece pelos mortos, porque
acreditam que a alma só tem duas alternativas: ser salva ou condenada às penas
eternas. Num e noutro caso, portanto, a prece seria inútil. Sem discutir o
valor dessa crença, admitamos por um instante a realidade das penas eternas e irremissíveis,
e que as nossas preces sejam impotentes para interrompê-las. Perguntamos se nessa
hipótese é lógico, é caridoso, é cristão, recusar a prece pelos réprobos.
Essas preces, por mais impotentes que sejam para
libertá-los, não serão para eles uma prova de piedade, que poderá minorar-lhes
os sofrimentos? Na Terra, quando um homem é condenado à prisão perpétua, mesmo não
havendo nenhuma esperança de obter-se a graça para ele, é proibido a uma pessoa
caridosa auxiliá-lo a carregar seus grilhões para aliviá-lo desse peso? Quando
alguém está atacado de mal incurável, não havendo portanto nenhuma esperança de
cura, deve-se abandoná-lo sem nenhum alívio? Considere
que entre os réprobos pode estar uma pessoa que lhe seja cara: um amigo, talvez
um pai, a mãe ou um filho; pelo fato dessa criatura não ser perdoada, você poderia
recusar-lhe um copo d'água para mitigar-lhe a sede, um bálsamo para secar-lhe
as feridas? Não faria por ela o que faria por um prisioneiro? Não lhe daria uma
prova de amor, uma consolação? Não, isso não seria cristão. Uma crença que
endurece o coração não pode conciliar-se com aquela dum Deus que coloca, como o
primeiro de todos os deveres, o amor ao próximo! A não eternidade das penas não implica negação duma
penalidade temporária, porque, na sua justiça, Deus não pode confundir o bem
com o mal. Ora, nesse caso, negar a eficácia da prece seria negar a eficácia da
consolação, dos encorajamentos e dos bons conselhos; e isso equivaleria a negar
a força que haurimos de assistência moral dos que nos amam. Outros se fundam numa razão mais enganosa: a
imutabilidade dos desígnios divinos. Deus, dizem eles, não pode modificar suas
decisões a pedido das criaturas; sem isso, nada seria estável no mundo. O homem,
portanto, nada tem de pedir a Deus, cabendo-lhes apenas submeter-se a adorá-lo. Há nesta ideia uma falsa interpretação da imutabilidade
da lei divina, ou melhor, ignorância da lei, no que concerne à penalidade
futura. Essa lei é revelada pelos espíritos do Senhor, hoje que o homem já
amadureceu para compreender o que, na lei, é conforme ou contrário aos atributos
divinos. Segundo o dogma da eternidade absoluta das penas, não se
levam em conta os remorsos nem o arrependimento do culpado. Para ele, todo o desejo
de melhorar-se é inútil; ele está condenado a permanecer eternamente no mal. Se
foi condenado, entretanto, por um determinado tempo, a pena cessará no fim do
prazo. Mas quem pode afirmar que ele terá então melhorado seus sentimentos?
Quem dirá que, a exemplo de muitos condenados da Terra,
ao sair da prisão, ele não será tão mau quanto antes? No primeiro caso, seria
manter sob a dor do castigo um homem que retornou ao bem; no segundo, seria
agraciar aquele que continua culpado. A lei de Deus é mais previdente do que
isso; sempre justa, equitativa e misericordiosa, não fixa nenhuma duração para
a pena, qualquer que seja. Ela resume-se assim:
O homem sofre sempre a
consequência das suas faltas; não há uma só infração à lei de Deus, que não
tenha a sua punição.
A severidade do castigo é
proporcional à gravidade da falta.
A duração do castigo,
para qualquer falta, é indeterminada; ela está subordinada ao arrependimento do
culpado e ao seu retorno ao bem. A pena dura tanto
quanto a obstinação no mal; seria perpétua,
se a obstinação fosse perpétua: será de curta duração, se o arrependimento for
rápido.
Desde que o culpado clame
por misericórdia, Deus o atende e lhe concede esperança. Mas o simples remorso
do mal praticado não basta: é necessária a reparação da falta.
É por isso que o culpado é submetido a novas
provas, nas quais ele pode, sempre pela sua própria vontade, fazer o bem para reparação
do mal que haja feito.
O homem é assim constantemente o árbitro da sua própria
sorte. Ele pode abreviar o seu suplício ou prolongá-lo indefinidamente. Sua
felicidade ou sua desgraça dependem da sua vontade de fazer o bem.
Tal é a lei; lei imutável e conforme a bondade e a
justiça de Deus.
O Espírito culpado e infeliz, dessa maneira, pode sempre se
salvar; a lei de Deus lhe diz sob quais condições ele pode fazê-lo. O que
geralmente lhe falta é a vontade, a força e a coragem. Se, pelas nossas preces,
lhe inspiramos essa vontade, se o amparamos e encorajamos; se, pelos nossos
conselhos, lhe damos as luzes que lhe faltam, em vez de solicitar a Deus que
derrogue sua lei, tornamo-nos instrumentos da execução dessa lei de amor e
caridade, da qual ele nos permite assim participar, para darmos nós mesmos uma prova
de caridade (Ver O Céu e o Inferno, 1ª parte, caps. 4, 7 e 8).
A oração só tem valor pelo pensamento associado a ela.
Ora, é impossível associar um pensamento àquilo que
não se compreende, pois o que não se compreende não pode tocar o coração. Para
a imensa maioria, as orações numa língua desconhecida são apenas palavras que
nada dizem à mente. Para que a prece toque o coração é necessário que cada
palavra revele uma ideia, e se não a compreendermos, ela não pode revelar ideia
nenhuma.
A não eternidade das penas não implica negação duma
penalidade temporária, porque, na sua justiça, Deus não pode confundir o bem
com o mal. Ora, nesse caso, negar a eficácia da prece seria negar a eficácia da
consolação, dos encorajamentos e dos bons conselhos; e isso equivaleria a negar
a força que haurimos de assistência moral dos que nos amam.
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