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terça-feira, 4 de fevereiro de 2020





EM DIA COM O MACHADO 405:
Esmola (Jó)
                 
"Dai antes esmola do que tiverdes." Jesus (Lucas, 11:41).

Na questão 888a d'O Livro dos Espíritos, após ter sido questionado por Allan Kardec se reprovava a esmola, o Espírito Vicente de Paulo respondeu-lhe que não condenava a esmola, e, sim, o modo como ela é feita, pois aquele que, realmente, é considerado homem de bem socorre o infeliz sem esperar que este lhe peça algo. A caridade não deve ser ostensiva, nem arrogante.
A esmola, acrescenta, distingue-se da beneficência, pois há casos em que o necessitado não tem coragem de pedir, por receio de ser humilhado.
No final de sua longa resposta, Vicente de Paulo recomenda:

[...] Sede, pois, caridosos, não somente dessa caridade que vos faz tirar do bolso o óbolo que dais friamente a quem vos ousa pedi-lo, mas da que vos leve ao encontro das misérias ocultas. Sede indulgentes com os defeitos dos vossos semelhantes. Em vez de desprezardes os ignorantes e os viciados, instruí-os e moralizai-os. Sede brandos e benevolentes para com tudo o que vos seja inferior, mesmo para com os seres mais ínfimos da Criação, e tereis obedecido à Lei de Deus (Op. cit.). Destaque meu. 

Analisando o que o canonizado Espírito Vicente de Paulo disse: 1) devemos, sim, dar esmolas, embora o ideal seja fazê-lo com verdadeira caridade, ou seja, aquela que demonstre interesse pelo "infeliz" e não o trate com arrogância, nem o humilhe; 2) há uma diferença entre a esmola e a beneficência. Esta vai além do "óbolo" dado ao necessitado, por vezes, friamente, e trata-o com brandura e benevolência. Sem o desprezar, procura instruí-lo, moralizá-lo; a esmola, quando dada sem esse zelo, humilha e pode levar o carente de ajuda à revolta, ainda que o níquel recebido o auxilie a minimizar temporariamente sua fome.
Mas ainda pior do que isso é recusar o auxílio ao infeliz que não conhecemos, por prejulgar seu pedido. Não é isso que Jesus deseja. Sua recomendação é para darmos "esmola" do que tivermos.
O Espírito Emmanuel, comentando o versículo de Lucas, diz o seguinte:

O Dono de todo o poder e de toda a riqueza no Universo é Deus, nosso Criador e Pai, que empresta recursos aos homens, segundo os méritos ou as necessidades de cada um.
Não olvidemos, assim, as doações de nossa esfera íntima e perguntemos a nós mesmos: Que temos de nós próprios para dar? Que espécie de emoção estamos comunicando aos outros? Que reações provocamos no próximo? Que distribuímos com os nossos companheiros de luta diária? Qual é o estoque de nossos sentimentos? Que tipo de vibrações espalhamos?[1]

        Para finalizar, diz Emmanuel:

O aviso do Instrutor Divino nas anotações de Lucas significa: — dai esmola de vossa vida íntima, ajudai por vós mesmos, espalhai alegria e bom ânimo, oportunidade de crescimento e elevação com os vossos semelhantes, sede irmãos dedicados ao próximo, porque, em verdade, o amor que se irradia em bênçãos de felicidade e trabalho, paz e confiança, é sempre a dádiva maior de todas (id.).

        Os tempos são outros, em especial em nosso país, que acolhe milhares de imigrantes de outras nações amigas, além do nosso povo, com imensa carência de alimentação, vestuário, abrigo e nossa solidariedade fraterna. Nas grandes cidades, esbarramos com pessoas carentes por toda a parte. Embaixo das marquises de lojas, de madrugada; nas paradas dos semáforos; nos estacionamentos; nos restaurantes; e, principalmente, nos self-services.
        Seria demagogia nossa dizer que prefere atender a todos esses necessitados com incentivos a procurar a instituição a ou b, levá-los para nossas casas, dar-lhes banho, fornecer-lhes roupas, abrigos etc. A não ser que tivéssemos disponibilidade de tempo e recursos para passar os dias nas ruas atendendo a multidão de pedintes que ali se encontra
Por outro lado, não temos como comprovar se quem nos pede ajuda é realmente miserável ou faz da mendicância profissão. Se não temos como saber o que o pedinte fará com os níqueis que lhe damos, não nos cabe prejulgá-lo. Caso contrário, Jesus teria dito: — Mas antes, verifique se quem lhe pede esmola está mesmo precisando de sua ajuda.
O Cristo nos pede amor, que não dispensa a misericórdia, e se traduz pela máxima inspirada a Allan Kardec pelo Espírito de Verdade, representante da Vontade Divina: "Fora da caridade não há salvação". E Kardec ainda comenta: "Logo, tudo o que se faça contra o próximo é o mesmo que fazê-lo contra Deus"[2]. Tudo!
Tudo aqui, em releitura, significa: o mínimo que fizermos em benefício de um irmão faremos a favor de Deus. O que não é dar auxílio material a quem, realmente, sabemos que não necessita dele, mas, sim, do amparo espiritual, conforme lemos nos comentários de Emmanuel.
O que o próximo, à nossa revelia, fará do que lhe doarmos é assunto dele com Deus, que lhe deu livre-arbítrio, e não nosso. Não sendo assim, não exercitaremos bem a abnegação e o devotamento recomendados pelo Espírito de Verdade em sua quarta mensagem, item 8 do cap. 6 d'O Evangelho Segundo o Espiritismo.




[1] EMMANUEL (Espírito). Fonte Viva. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Rio de Janeiro: FEB, 2005, cap. 60. Esmola.

[2] KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 5. imp. Brasília: FEB, 2017, p. 204.

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