EM DIA COM O MACHADO 405:
Esmola
(Jó)
"Dai antes esmola do que
tiverdes." Jesus (Lucas, 11:41).
Na questão 888a d'O Livro dos Espíritos, após ter sido
questionado por Allan Kardec se reprovava a esmola, o Espírito Vicente de Paulo
respondeu-lhe que não condenava a esmola, e, sim, o modo como ela é feita, pois
aquele que, realmente, é considerado homem de bem socorre o infeliz sem esperar
que este lhe peça algo. A caridade não deve ser ostensiva, nem arrogante.
A esmola, acrescenta, distingue-se da beneficência, pois há
casos em que o necessitado não tem coragem de pedir, por receio de ser
humilhado.
No final de sua longa resposta, Vicente de Paulo recomenda:
[...] Sede, pois, caridosos, não somente dessa caridade que
vos faz tirar do bolso o óbolo que dais friamente a quem vos ousa pedi-lo, mas
da que vos leve ao encontro das misérias ocultas. Sede indulgentes com os
defeitos dos vossos semelhantes. Em vez de desprezardes os ignorantes e os
viciados, instruí-os e moralizai-os. Sede brandos e benevolentes para com
tudo o que vos seja inferior, mesmo para com os seres mais ínfimos da Criação,
e tereis obedecido à Lei de Deus (Op. cit.). Destaque meu.
Analisando o que o
canonizado Espírito Vicente de Paulo disse: 1) devemos, sim, dar esmolas,
embora o ideal seja fazê-lo com verdadeira caridade, ou seja, aquela que
demonstre interesse pelo "infeliz" e não o trate com arrogância, nem
o humilhe; 2) há uma diferença entre a esmola e a beneficência. Esta vai além
do "óbolo" dado ao necessitado, por vezes, friamente, e trata-o com
brandura e benevolência. Sem o desprezar, procura instruí-lo, moralizá-lo; a
esmola, quando dada sem esse zelo, humilha e pode levar o carente de ajuda à
revolta, ainda que o níquel recebido o auxilie a minimizar temporariamente sua
fome.
Mas ainda pior do que
isso é recusar o auxílio ao infeliz que não conhecemos, por prejulgar seu
pedido. Não é isso que Jesus deseja. Sua recomendação é para darmos
"esmola" do que tivermos.
O Espírito Emmanuel,
comentando o versículo de Lucas, diz o seguinte:
O Dono de todo o poder e de toda a riqueza no Universo é
Deus, nosso Criador e Pai, que empresta recursos aos homens, segundo os méritos
ou as necessidades de cada um.
Não olvidemos, assim, as doações de nossa esfera íntima e
perguntemos a nós mesmos: Que temos de nós próprios para dar? Que espécie de
emoção estamos comunicando aos outros? Que
reações provocamos no próximo? Que distribuímos com os nossos companheiros de
luta diária? Qual é o estoque de nossos sentimentos? Que tipo de vibrações
espalhamos?[1]
Para finalizar, diz Emmanuel:
O aviso do Instrutor Divino nas anotações de Lucas significa:
— dai esmola de vossa vida íntima, ajudai por vós mesmos, espalhai alegria e
bom ânimo, oportunidade de crescimento e elevação com os vossos semelhantes,
sede irmãos dedicados ao próximo, porque, em verdade, o amor que se irradia em
bênçãos de felicidade e trabalho, paz e confiança, é sempre a dádiva maior de
todas (id.).
Os
tempos são outros, em especial em nosso país, que acolhe milhares de imigrantes
de outras nações amigas, além do nosso povo, com imensa carência de
alimentação, vestuário, abrigo e nossa solidariedade fraterna. Nas grandes
cidades, esbarramos com pessoas carentes por toda a parte. Embaixo das
marquises de lojas, de madrugada; nas paradas dos semáforos; nos
estacionamentos; nos restaurantes; e, principalmente, nos self-services.
Seria
demagogia nossa dizer que prefere
atender a todos esses necessitados com incentivos a procurar a instituição a ou
b, levá-los para nossas casas, dar-lhes banho, fornecer-lhes roupas, abrigos
etc. A não ser que tivéssemos disponibilidade de tempo e recursos para passar
os dias nas ruas atendendo a multidão de pedintes que ali se encontra
Por
outro lado, não temos como comprovar se quem nos pede ajuda é realmente
miserável ou faz da mendicância profissão. Se não temos como saber o que o
pedinte fará com os níqueis que lhe damos, não nos cabe prejulgá-lo. Caso
contrário, Jesus teria dito: — Mas antes, verifique se quem lhe pede esmola
está mesmo precisando de sua ajuda.
O
Cristo nos pede amor, que não dispensa a misericórdia, e se traduz pela máxima
inspirada a Allan Kardec pelo Espírito de Verdade, representante da Vontade
Divina: "Fora da caridade não há salvação". E Kardec ainda comenta:
"Logo, tudo o que se faça contra o próximo é o mesmo que fazê-lo contra
Deus"[2].
Tudo!
Tudo aqui, em releitura, significa: o mínimo que fizermos em
benefício de um irmão faremos a favor de Deus. O que não é dar auxílio material
a quem, realmente, sabemos que não necessita dele, mas, sim, do amparo
espiritual, conforme lemos nos comentários de Emmanuel.
O que
o próximo, à nossa revelia, fará do
que lhe doarmos é assunto dele com Deus, que lhe deu livre-arbítrio, e não
nosso. Não sendo assim, não exercitaremos bem a abnegação e o devotamento
recomendados pelo Espírito de Verdade em sua quarta mensagem, item 8 do cap. 6 d'O
Evangelho Segundo o Espiritismo.
[1]
EMMANUEL (Espírito). Fonte Viva. Psicografado por Francisco Cândido
Xavier. Rio de Janeiro: FEB, 2005, cap. 60. Esmola.
[2]
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de Evandro
Noleto Bezerra. 2. ed. 5. imp. Brasília: FEB, 2017, p. 204.
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