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sábado, 31 de outubro de 2020

12.3.3 O duelo

 

Adolfo

Bispo de Argel, Marmande, 1861

 

Verdadeiramente grande é somente quem, considerando a vida como uma viagem que tem uma meta, não se importa com as asperezas do caminho e não se deixa desviar nem por um instante do rumo certo. De olhar fixo no seu fim, pouco se importa de que os obstáculos e os espinhos da senda o ameacem; estes apenas o roçam, sem o ferirem, e não o impedem de seguir seu caminho.

Arriscar seus dias para se vingar duma ofensa é recuar diante das provas da vida; é sempre um crime aos olhos de Deus. E se vocês não estivessem tão iludidos, como estão, por seus preconceitos, essa seria também uma ridícula e suprema loucura aos olhos dos homens.

Existe crime no homicídio por duelo, a  própria legislação humana o reconhece. Ninguém tem o direito, em caso algum, de atentar contra a vida de seu semelhante. Isso é um crime aos olhos de Deus, que lhes determinou a linha de conduta a seguir. Aqui, mais que em qualquer outra situação, vocês são juízes em causa própria. Lembrem-se de que lhes será perdoado segundo tiverem perdoado. Pelo perdão vocês se aproximam da Divindade, porque a clemência é irmã do poder.

Enquanto uma gota de sangue humano correr na Terra pelas mãos dos homens, o verdadeiro Reino de Deus ainda não terá chegado aí. Esse reino de pacificação e de amor deve banir para sempre do Mundo a animosidade, a discórdia e a guerra. Então, a palavra duelo não mais existirá na sua língua, senão como uma longínqua e vaga recordação do passado. Os homens não admitirão entre eles outro antagonismo, a não ser a nobre rivalidade do bem.


12.3.4 Agostinho

Paris, 1862

 

O duelo pode, sem dúvida, em certos casos, ser uma prova de coragem física, de menosprezo pela vida, mas é também indubitavelmente uma prova de covardia moral, como o suicídio. O suicida não tem coragem de enfrentar as vicissitudes da vida; o duelista não a tem para suportar as ofensas. Cristo não lhes disse que há mais honra e coragem em oferecer a face esquerda a quem feriu sua face direita, do que em se vingar de uma injúria? Ele não disse a Pedro, no Jardim das Oliveiras: "Embainhe sua espada, pois aquele que mata pela espada perecerá pela espada"? Por essas palavras, não condenou o duelo para sempre?

Com efeito, meus filhos, que coragem é essa, que brota de um temperamento violento, sanguíneo e furioso, bramindo à primeira ofensa? Onde está a grandeza de alma daquele que, à menor injúria, quer lavá-la com sangue? Mas que ele trema, porque sempre, do fundo da sua consciência, uma voz lhe gritará: "Caim! Caim! Que você fez de seu irmão?" Ele responderá: "Foi necessário  matá-lo para salvar minha honra!" Mas a voz responderá: "Você quis salvá-la perante os homens nos breves instantes que lhe restavam na Terra, e não pensou em salvá-la perante Deus!"  Pobre louco, quanto sangue não lhe pediria então o Cristo, por todos os ultrajes que recebeu!

Vocês não somente feriram o Cristo com os espinhos e a lança, não somente o pregaram num madeiro infamante, mas ainda, em meio de sua agonia, ele pôde ouvir as zombarias que lhes prodigalizaram. Que reparações lhes pediu ele, depois de tantos ultrajes? O último grito do cordeiro foi uma prece pelos seus algozes. Oh, como ele, perdoem e orem pelos que o ofendem!

Amigos, lembrem-se deste preceito: "Amem-se uns os outros", e então ao golpe dado pelo ódio responderão com um sorriso, e ao ultraje com o perdão. O mundo sem dúvida se erguerá furioso e os tratará de covardes; ergam a fronte bem alto e mostrem, então, que sua fronte também não recearia ser coroada de espinhos, a exemplo do Cristo, mas que sua mão não quer participar de um assassinato autorizado, podemos dizer, por uma falsa aparência de honra, que nada mais é senão orgulho e amor-próprio. Ao criá-los, Deus lhes deu o direito de vida e de morte, uns sobre os outros? Não, pois só deu esse direito à Natureza, para se reformar e se reconstruir. Mas a vocês, nem sequer permitiu dispor de si mesmos.

Como o suicida, o duelista ver-se-á marcado de sangue quando comparecer perante Deus, e a ambos o Soberano Juiz reserva rudes e longos castigos. Se Jesus ameaçou com a sua justiça aqueles que dizem racca a seus irmãos, quanto mais severa não será a pena reservada àquele que comparecer diante dele com as mãos sujas do sangue de seu irmão! 

Tradução livre: prof. dr. Jorge Leite de Oliveira

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