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sexta-feira, 10 de abril de 2020



Com Cristo, não há sombra sombria
Jorge Leite de Oliveira
               
Quando criança, entre os seis e oito anos de idade, tive visões terríveis, que me atormentavam e produziam muito medo. Aprendi a orar com mamãe e, após profunda súplica de socorro a Deus, isso  nunca mais  ocorreu comigo. Na juventude, lembrando vagamente dessas visões, há cerca de quarenta anos, escrevi o seguinte poema:

A sombra

Pressinto estranho ser junto de mim.
Soturnamente, avança o espectro mau
com esgares terríveis de animal
sedento do meu sangue, do meu fim.

Os pelos eriçados de terror
falam do meu estado neste instante
em que o temor se instala, alucinante,
ante este inusitado dissabor.

Emite o espelho o espanto do meu rosto.
Nenhum reflexo de outro vulto, e um grito
se esboça no meu peito assaz aflito.

Quero livrar-me breve deste encosto
e, à tênue luz da Lua, vejo bem
a sombra de mim mesmo e mais ninguém.

Em Malaquias, Antigo Testamento (4:5-6), encontramos este “terrível” anúncio: “Eis que vos envio o profeta Elias, antes que venha o dia grande e terrível do Senhor; e converterá o coração dos pais aos filhos e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha e fira a terra com maldição”.
Um dos grandes desafios da Humanidade atual é o da educação. As pessoas estão confusas, perdendo o referencial semântico tradicional dos conceitos, que estão sendo transformados, tendenciosamente, em “pré-conceitos”. Tudo o que a cultura antiga considerava certo e sabido vem sendo questionado, desclassificado e demolido pela mentalidade da pós-modernidade.
A conduta humana, cada vez mais voltada para o ter, em detrimento do ser, cultua o materialismo. A descrença e a hipocrisia grassam em toda a parte. Muitos dos que se dizem espiritualistas fingem ser o que não são, com o único objetivo de se darem bem. O oportunismo inconsequente e egoísta, em todo o mundo, prevalece nas intenções ocultas de grande número de pessoas, graças a uma visão, cada vez mais hedonista, que não respeita nada, apenas visa desfrutar, das mais variadas formas, de tudo aquilo que lhes satisfaça aos interesses materiais e às paixões dos sentidos. É o culto ao prazer e à matéria, como bens supremos a serem conquistados, não importa como.
O leitor destas linhas poderia perguntar-nos qual seria a nossa visão desse ser “terrível”, com poderes de ferir a Terra com maldição, citado acima por Malaquias. Seria Jesus, o cordeiro manso de Deus? Impossível. A mensagem do Cristo, relatada por João, e que procuramos despir da letra do simbolismo para a realidade dos dias atuais, visa justamente dar-nos, em definitivo, segurança, certeza e coragem nas lutas cotidianas, por tornar conhecido o desconhecido. É o raio de luz de um novo dia no despertar das consciências sem rumo ou em dúvida sobre o caminho a seguir, entre tantos apregoados pelos falsos profetas dos dias atuais.
A mensagem de Jesus é a companhia segura nas horas de aparente solidão, pois quem caminha com o Cristo jamais se sentirá abandonado. Ainda que o mundo dele se afaste, o Mensageiro Divino estará a seu lado, orientando seus passos com segurança na caminhada evolutiva sem fim. E não somente no caminhar o Mestre nos antecederá, mas também na escalada do monte da elevação, que este é o destino de todos nós.
A mensagem de Jesus é o equilíbrio mental de quem se encontra no domínio pleno de seus pensamentos, pois terá sempre presente, nos atos da vida, a recomendação do Mestre da Galileia: “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca” (Marcos, 14:38).
A mensagem de Jesus é, portanto, a segurança mental dos que reconhecemos, com Ele, que a origem do mal está em nós mesmos. E, para que nos livremos dessa tendência, precisamos ter absoluto controle dos nossos pensamentos. Consequentemente, de nossas palavras e atos. Nisto está a sabedoria cristã: em reconhecer Deus como nosso Pai e adorá-lo em Espírito e Verdade; em reconhecer Jesus como caminho que nos conduzirá a Deus, verdade que nos livrará da ignorância, vida plena que nos encherá de paz, remédio para nossas mazelas morais, equilíbrio para nosso organismo psicossomático.
Com a saúde espiritual e física que nos proporciona o Verbo luminoso – Jesus –, perceberemos que tanto a Lua como o Sol nos proporcionam sombras amigas. Vultos que não vemos, mas sentimos estarem presentes conosco, em nossas mentes e corações: o Mestre dos mestres, que seu apóstolo João nos revela como o Verbo encarnado, que estava com Deus, cocriador, junto a nosso Pai Celestial, do mundo em que vivemos, e seus emissários de luz. Veremos, na mensagem mística de João, que o Cristo veio para nos tirar o véu da ignorância e permanecer conosco até o fim dos tempos.
Esta é a sombra que nos proporciona a presença de Jesus em nossas vidas: a sombra das boas companhias espirituais. E a Doutrina Espírita, Consolador enviado por Ele, surgiu no mundo para nos tirar do medo e da ignorância, afirmando-nos, sem ameaças, sobre a presença permanente da companhia espiritual. Com Jesus, representado ao nosso lado pelos Espíritos iluminados, ainda que estejamos em vale escuro, não temeremos mal algum, pois ao nosso lado estarão as boas companhias, inspirando-nos pensamentos amigos e paz indescritível.
Se atentarmos para o sublime objetivo de nossa existência, que é a prática permanente do bem, não teremos de temer a sombra do mal, pois, com Cristo não há sombra sombria.

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