Espiritismo &
Materialismo
Jorge Leite de Oliveira
Haveria, assim, dois elementos
gerais do Universo: a matéria e o espírito?
Sim, e acima de tudo Deus, o
Criador, o Pai de todas as coisas. Esses três elementos constituem o princípio
de tudo o que existe, a trindade universal. Mas ao elemento material é preciso
juntar o fluido universal, que desempenha o papel de intermediário entre o
espírito e a matéria propriamente dita, muito grosseira para que o espírito
possa exercer alguma ação sobre ela. Embora, sob certo ponto de vista, se possa
classificar o fluido universal como elemento material, ele se distingue deste
por propriedades especiais. Se fosse realmente matéria, não haveria razão para
que o espírito também não o fosse. Está colocado entre o espírito e a matéria;
é fluido, como a matéria é matéria, e suscetível, pelas suas inúmeras
combinações com esta e sob a ação do espírito, de produzir a infinita variedade
das coisas de que não conheceis senão uma ínfima parte. Esse fluido universal,
ou primitivo, ou elementar, sendo o agente de que o espírito se utiliza, é o
princípio sem o qual a matéria estaria em perpétuo estado de divisão e jamais
adquiriria as propriedades que a gravidade lhe dá (KARDEC, 2017, q. 27).
Pelo fato de somente
observarem, nos corpos, os fenômenos decorrentes das propriedades físicas,
diversos sábios criaram teorias que originaram o materialismo. Esse desconhecimento
das leis espirituais, presentes no Universo, tem levado muita gente às paixões exacerbadas,
ao vício das drogas, ao crime, ao desencanto pela vida, à falta de ética e ao
suicídio.
O estudo das obras
codificadas por Allan Kardec, iniciadas com O
livro dos espíritos, vem contribuindo com o esclarecimento de grande número
de pesquisadores sinceros, em busca da verdade. Ali, na questão 27, somos
informados de que, no Universo, acima de tudo, está Deus, mas a matéria e o
espírito também estão eternamente presentes. Portanto, Deus, espírito e matéria
formam a trindade universal. Acreditar que tudo provém da matéria e se extingue
com esta é ter uma visão restrita e incorreta sobre a verdadeira composição do
Universo criado e expandido, eternamente, por Deus.
As consequências sofridas
por quem, inconsequentemente, se deixa arrastar pelas teorias que negam a
existência e a sobrevivência do espírito após a morte do corpo físico são
desastrosas e próprias de espíritos imaturos. Quando se nega a existência de
Deus e do mundo espiritual e se acredita que tudo, em nossa existência, se
explica pelas leis da matéria, comete-se um deplorável erro de apreciação do
que é a vida. Essas são características próprias do viés filosófico
materialista de todos os tempos.
Eis alguns conceitos
materialistas contemporâneos: “Perspectiva que sustenta que o mundo é inteiramente
composto de matéria. [...] Opõe-se ao dualismo mente-corpo, mas não tem
qualquer relação com o desejo excessivo de bens ou de riqueza, o que constitui
um significado diferente do termo” (BLACKBURN, 1997, p. 239).
Aqui está o que esse
autor entende por “significado diferente do termo”: “materialismo de estados centrais – uma filosofia da mente que
identifica os acontecimentos mentais com acontecimentos físicos que ocorrem no
cérebro e no sistema nervoso central [...]” (op. cit., p. 240). Essa ideia nega
o livre-arbítrio da alma, espírito encarnado, e confunde o cérebro, órgão
físico da manifestação do espírito, com este.
Também define o autor
consultado o materialismo dialético
como:
Traço filosófico dominante do
marxismo, onde se combina o materialismo, concebido como uma filosofia da
natureza e uma ciência englobantes, com a noção hegeliana de dialética,
imaginada como uma força histórica que conduz os acontecimentos para uma resolução
progressiva das contradições que caracterizam cada época histórica. [...] Na
interpretação de Plekhanov e de Lenin, o materialismo dialético implica que a
natureza do mundo coincide com os ideais da revolução [...] (id., p. 240).
Informa-nos, então, a definição
de “materialismo histórico”, proposta
por Engels:
[...] na introdução da obra Do socialismo utópico ao socialismo
científico, como a procura “da causa última e da grande força que faz mover todos os acontecimentos históricos importantes
no desenvolvimento econômico da sociedade, nas mudanças do modo de produção e
de troca, na consequente divisão da sociedade em classes distintas e na luta
das classes que se opõem”. Marx e Engels descrevem o materialismo histórico
como uma hipótese científica e empírica, mas na verdade trata-se de um quadro
de referências para as explicações históricas [...] (id., ibid.).
Essas teorias vêm
trazendo consequências danosas para a Humanidade: negam as palavras de
Sócrates, registradas por Platão e outros filósofos espiritualistas;
contradizem a doutrina de amor e a crença na vida espiritual, pregadas pelo Cristo
e seus enviados; incentivam o culto à matéria e as lutas entre irmãos de
Humanidade. Eis o que dizia Karl Marx, em seu incentivo à luta de classes:
“Proletários de todos os países, uni-vos”.
É inútil destacar pontos favoráveis
do materialismo, por serem estes nulos, em vista dos malefícios citados acima. Ele
iguala-nos aos brutos, reforça em nós todos os instintos animalizados. Alimenta
o egocentrismo, o ódio, a ambição desenfreada e a sensualidade. Ao contrário
disso, todos os aspectos positivos para o espírito imortal são realçados nas
leis do merecimento, que o Espiritismo nos assegura, além de este ser, bem
compreendido e praticado, como diz Kardec, preservativo contra o suicídio, o
grande mal de nosso tempo.
Atualmente, diz
Blackburn, “Os filósofos [...] preferem o termo fisicalismo, visto que a física
mostrou que a própria matéria se decompõe em força e energia [...]” (BLACKBURN,
1977, p. 239). Ou seja, foi constatada a “energia” junto da “força”, como
elementos estruturadores da matéria. Entretanto, a conclusão disso sempre será
a de que “tudo é matéria”, em sua eterna composição e decomposição. Daí a
negação de um ser espiritual sobrevivente a essa elaboração mecanicista entre
energia e força.
É nisso que está o grande
mal provocado à Humanidade pelo materialismo. Ele não nos dá qualquer
perspectiva de existência de um ser externo, que sobreviva à desagregação
material dos corpos orgânicos. Daí vêm as consequências. A primeira delas é a
negação da individualidade do ser extramaterial, pois tudo se reduziria, em
nós, ao cérebro, aos nervos, ao código DNA, à matéria enfim. A segunda é a de
que, uma vez nascidos quando nosso corpo é formado, trazemos conosco a herança
genética, que nada mais seria do que propriedade da matéria. A terceira é a
ideia de que, na História, os mais fortes é que são vitoriosos. Daí, surgem
ideologias nefastas, como as da suposta superioridade racial, da qual decorreu
o antissemitismo e o holocausto dos judeus. Daí surgem as teorias
maquiavélicas, que nos ensinam a mentir e atropelar
todos aqueles que nos impeçam de alcançar nossos objetivos: o poder, os bens
materiais, a fama... Princípios milenares são desprezados, como o da
instituição familiar; o da meritocracia, na aferição dos valores; o do respeito
à ética e aos ensinamentos do Cristo, modelo de perfeição dado por Deus à Humanidade
(questão 625 de O livro dos espíritos).
A religião, para Karl Marx,
é o “ópio do povo”. Deus, para os adeptos do materialismo, e mesmo de seu
sucedâneo atual, o fisicalismo, é
pura invenção dos antigos profetas e filósofos... Ele teria sido criado para
subjugar, pelo temor, os simples da Terra. Enfim, para o materialismo, o Espírito
não existe, tudo é matéria que, como tal, vem do pó e para este retorna.
O Espiritismo, estudado
com profundidade, desmonta tudo isso, porque veio atender a uma promessa do
Cristo. Ele nos demonstra, como dissemos no início com base na revelação dos
Espíritos, que há dois elementos fundamentais no Universo: a matéria e o espírito.
Mas, acima de tudo, o Espírito Divino, Nosso Pai, segundo Jesus, que tudo cria,
tudo dirige, tudo move e tudo faz evoluir, do átomo ao anjo.
Um grande sábio espírita,
Léon Denis, concluiu, com base na revelação dos Espíritos superiores, o
seguinte: “Na planta, a inteligência dormita; no animal, sonha; só no homem
acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente; a partir daí, o progresso,
de alguma sorte fatal nas formas inferiores da Natureza, só se pode realizar
pelo acordo da vontade humana com as leis eternas” (DENIS, 1989, p. 123). Após
isso, o Espírito, individualizado, continua sua ascensão infinita em direção a
Deus, nosso Pai, até alcançar a condição daqueles que denominamos “anjos”, espíritos
puros e cocriadores divinos, como é o caso de Jesus Cristo.
Esse sábio francês deduz
então que
O homem é, pois, ao mesmo tempo,
espírito e matéria, alma e corpo, mas talvez que o espírito e a matéria não
sejam mais do que simples palavras, exprimindo de maneira imperfeita as duas
formas da vida eterna, a qual dormita na matéria bruta, acorda na matéria
orgânica, adquire atividade, se expande e se eleva no espírito.
[...] Todavia, o que caracteriza a
alma e absolutamente a diferencia da matéria é a sua unidade consciente. Sob a
ação da análise, a matéria dispersa-se e dissipa-se. O átomo físico divide-se
em subátomos, que, por sua vez, fragmentam-se indefinidamente. A matéria é
inteiramente desprovida de unidade, como o estabeleceram as recentes
descobertas de Becquerel, Curie, Le Bon.
No Universo, só o espírito
representa o elemento uno, simples, indivisível e, por conseguinte, logicamente
indestrutível, imperecível, imortal (DENIS, 2008, p. 82).
N’O livro dos espíritos, encontramos questões e análises sobre o
materialismo e suas nefastas consequências, derivadas de orientações dos Espíritos
superiores e do próprio Kardec. São as seguintes: questões 147, 148, 446 e
comentários do it. II da introdução, it. II da conclusão, que opõe o
Espiritismo ao materialismo, it. VII, negação do materialismo e it. VIII, morte
do materialismo que, como vimos acima, já está sendo substituído pelo termo fisicalismo pela Filosofia moderna, mas
no fundo é a mesma coisa.
Na revista mensal Reformador, de abril de 2017, publicamos
artigo intitulado A Matéria, o Espírito e
O Livro dos Espíritos, que trata dos equívocos
do materialismo e a grande missão do Espiritismo na restauração da realidade do
Espiritualismo e seu efeito benéfico para a Humanidade.
Essa revelação, repito,
não se baseia em teorias humanas fantasiosas, em devaneios anímicos, porém no
que dizem os próprios Espíritos, sob a direção de Cristo. Quando essa verdade
se tornar universal, todas as consequências nefastas do materialismo e suas
vertentes ideológicas tornar-se-ão anacrônicas. Então será inaugurada, para
sempre, a Era do Espírito na Terra. Era da tolerância, da humildade, do
devotamento ao próximo e da abnegação, qualidades que, ao desenvolvermos,
teremos eliminado do mundo o materialismo inconsequente e alçado voo às
amplidões celestiais. Teremos conquistado, enfim, o Reino dos céus, o qual
Jesus, em seu Sermão do Monte (Mateus, cap. 5 a 7) promete aos simples e puros
de coração. Então, poderemos dizer, como Paulo de Tarso: “Combati o bom combate,
terminei minha carreira, guardei a fé” (2
Timóteo, 4: 7- 8).
Nessa época, que não vai
longe, pois, para o Espírito imortal, os séculos são como se fossem dias, a
própria educação terá por base a sincronia entre o ensino moral e o
intelectual. O conhecimento pleno dos três elementos que compõem o Universo:
Deus, espírito e matéria, provindo da Espiritualidade Maior, sobrepor-se-á às
ideologias humanas. Então, cumprir-se-á sua promessa: “Bem-aventurados os
mansos, porque eles herdarão a Terra” (Mateus, 5:5).
Quando isso acontecer, o
mundo que habitamos estará ascendendo a um patamar superior e rumará para um
estado de matéria cada vez menos densa, como é próprio dos mundos superiores.
Por fim, num estágio que ainda levará milhões de anos, a Terra talvez seja
gasosa, como Júpiter, e seus habitantes estarão transformados em Espíritos
puros, sobre os quais a matéria nenhuma predominância terá.
Esse é o estado dos
mundos felizes, prometido pelo Cristo aos justos. Mas, por ora, encaminha-se, a
Terra e seus habitantes, para a condição de mundo de regeneração, ainda que demoradamente,
para nós, e brevemente para Deus. É o que prevê o Espírito Santo Agostinho n’O evangelho segundo o espiritismo,
quando afirma que nosso mundo “[...] chegou a um dos seus períodos de
transformação, em que, de mundo expiatório, tornar-se-á mundo regenerador. Os
homens, então, serão felizes na Terra, porque nela reinará a Lei de Deus”
(KARDEC, 2018, p. 60), que nos criou para a perfeição espiritual, quando
superarmos a influência da matéria pelo Espírito, que predomina sobre ela.
Referências
BLACKBURN,
Simon. Dicionário oxford de filosofia. Tradução:
Desidério Murho et al. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1977.
DENIS,
Léon. O problema do ser, do destino e da
dor. Rio de Janeiro: FEB, 1989.
______.
______. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2008.
KARDEC,
Allan. O livro dos espíritos. Tradução:
Evandro Noleto Bezerra. 4. ed., 4. imp. Brasília: FEB, 2017.
______.
O evangelho segundo o espiritismo.
Tradução: Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 7. imp. Brasília: FEB, 2018.
OLIVEIRA,
Jorge Leite de. A Matéria, o Espírito e O
livro dos Espíritos. In: Reformador,
abril 2017, Brasília: FEB, p. 46- 49.
Publicado em Reformador, janeiro de 2020, Brasília: Federação
Espírita Brasileira.
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